Movimentos sociais e a Embrapa

Nesta semana vários movimentos sociais do campo realizaram ações em diferentes centros de pesquisa da Embrapa – Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária. Na segunda-feira pela manhã, cerca de 700 trabalhadores e trabalhadoras do MST, MPA, MAB, CPT e Articulação das Mulheres Trabalhadoras Rurais ocuparam pacificamente a entrada do Centro Nacional de Recursos Genéticos e Biotecnologia – Cenargen – em Brasília. Outras ações ocorreram em instalações da Embrapa em Passo Fundo, Pelotas, Sete Lagoas e Juiz de Fora. Estas ações tinham como objetivo justamente a defesa da Embrapa como instituição fundamental para a pesquisa pública e desenvolvimento tecnológico nacional.

Estas mobilizações ocorrem em um momento realmente grave para a pesquisa pública. A Embrapa, os institutos estaduais de pesquisa em agropecuária e as universidades públicas vêm enfrentando uma crise, devido ao modelo neoliberal de redução do Estado. Na última década assistimos à redução das verbas públicas para a pesquisa agropecuária e a inexistência de aumento salarial para os pesquisadores e professores. As conseqüências desse processo de sucateamento são evidentes: perda de profissionais altamente qualificados, redução de pesquisas e busca de novos recursos (tecnológicos ou financeiros) pela cooperação com o setor privado.

É justamente aí que mora o perigo! A cooperação com o setor privado poderá significar que os interesses de lucros dessas empresas, geralmente multinacionais, poderão se impor ao interesse público através de contratos. Ao nosso ver é o caso do contrato entre Embrapa e Monsanto, onde esta última permite a introdução em variedades da Embrapa do processo patenteado de transgênese para a tolerância ao herbicida glifosate. Naturalmente, os direitos de patente sobre esse processo pertencem à multinacional, cabendo à Embrapa os direitos de proteção de suas cultivares.

Com isso vemos o esforço de vários pesquisadores e recursos públicos da pesquisa serem direcionados para a introdução de uma tecnologia, patenteada, que trará vantagens fundamentalmente para a multinacional, que tem explícitos interesses em ampliar suas vendas de glifosate. Mais do que isso, nossa empresa pública fará esforços para que fiquem disponíveis no mercado variedades protegidas pela Embrapa com um processo biotecnológico patenteado pela multinacional. Assim, o agricultor não apenas terá que pagar uma taxa tecnológica para usar a variedade como será impedido de usar parte da colheita para o replantio, pois dessa forma estaria violando os direitos de propriedade intelectual da multinacional e da Embrapa. Mesmo o chamado “privilégio dos agricultores” (mecanismo da lei de cultivares, que permitiria o replantio por pequenos produtores de variedades protegidas) deixa de existir, uma vez que a patente da multinacional sobre um processo biotecnológico lhe garante direitos de monopólio sobre o produto desse processo.

Embora alguns possam argumentar a legalidade desse tipo de contrato, sua ilegitimidade é óbvia. A empresa pública deveria estar dirigindo seus esforços fundamentalmente para tecnologias sustentáveis e adequadas à agricultura familiar. A luta em defesa da Embrapa tem justamente esse sentido: não permitir que nossa empresa pública seja colocada a serviço da estratégia das multinacionais e exigir recursos públicos para uma pesquisa pública autônoma que tenha como missão o desenvolvimento com os agricultor@s de um novo modelo tecnológico sustentável para agropecuária nacional.

As ações ocorridas em 8 e 9 de outubro são um marco histórico. @s trabalhador@s demonstraram que não assistirão passivos ao desmonte da pesquisa agropecuária pública e não permitirão que as multinacionais venham a impor seus interesses à pesquisa pública. Essas manifestações foram um símbolo de esperança pois sabemos que o principal caminho para garantir o interesse público é o povo organizado e mobilizado! Finalmente, as mobilizações foram um exercício de cidadania: o povo organizado foi demonstrar sua insatisfação com a maneira como a Embrapa vem sendo conduzida pelo governo, seja pela sua ênfase em transgênicos seja pelo tipo de contrato com as multinacionais.

Breves

Tribunal popular condena Governo Federal

O tribunal popular da Reforma Agrária, que aconteceu em 9 de outubro, condenou o Governo Federal por todas as acusações que lhe foram dirigidas. A sentença diz que as denúncias, com base em documentos de diversas entidades religiosas, profissionais e de organismos oficiais do próprio governo, são em face das inadequação das políticas públicas orientadas para o campo e para os trabalhador@s rurais, as quais ferem a Constituição Federal, agravam a situação dos trabalhador@s, frustram uma autêntica Reforma Agrária e se prestam a uma publicidade mentirosa e onerosa aos cofres públicos. O Tribunal, presidido pelo Dr. Marcelo Laveniere, aconteceu no auditório Petrônio Portela, no Senado Federal.

MST recebe premio Alfonso Comín

O MST ganhou em 5 de outubro o Prêmio Internacional Alfonso Comín, em Barcelona – Espanha. O Prêmio é concedido a pessoas ou coletivos que tenham se destacado por sua luta em favor da justiça, liberdade, paz e Direitos Humanos pela Fundação Alfonso Comín e está em sua 18ª edição. Alfonso Comín (1933-1980) foi um intelectual político católico e marxista. Dedicou sua vida em defesa da igualdade, liberdade, justiça e paz, comprometido com a libertação da classe trabalhadora e de todas as causas emancipadoras da humanidade. O ato de entrega do Prêmio será na Prefeitura de Barcelona, que está patrocinando o prêmio de um milhão de pesetas (cerca 6,5 mil dólares). A cerimônia de entrega do Prêmio acontecerá entre a segunda quinzena de novembro e a primeira de dezembro.

Jornada Nacional Sem Terrinha

De 9 a 12 de outubro aconteceu a Jornada de Luta dos Sem Terrinha. Na programação, diversas atividades recreativas, educacionais, artísticas além de muita luta e solidariedade. Em Lagarto (SE), por exemplo, eles tiveram uma audiência com o prefeito da cidade. Na pauta de reivindicações, a construção de escolas, a implantação de programa de prevenção à saúde bucal para os sem terrinha e assentamento de todas as famílias acampadas. Em 12 de outubro, os sem terrinha do Rio Grande do Sul distribuíram brinquedos às crianças que vivem na Lomba do Pinheiro, uma vila carente de Porto Alegre.