2001: Balanço de uma Reforma Agrária que não existiu

Por João Pedro Stedile*

Todo início de ano é a mesma história. O governo FHC reúne a imprensa e apresenta números milagrosos, que mais e mais famílias foram assentadas. Contrata empresas de publicidade e mais propaganda na televisão, na qual tudo parece bonito.

Infelizmente a realidade é bem diferente. Os acampamentos aumentam a cada dia ao longo das estradas. A pobreza e o desespero aumentam entre milhares de famílias de pobres do campo, que não têm mais alternativas. Não há trabalho na cidade. Não há renda no campo e a Reforma Agrária está parada.

Felizmente estas mentiras começam a ser desmascaradas também nos estudos e estatísticas. Vejamos.

Famílias assentadas – Um recente estudo da ABRA (Associação Brasileira de Reforma Agrária), baseado em dados da Coordenação Geral de Monitoramento do Incra, revelou que nos sete anos do governo FHC, em vez das 482.206 famílias anunciadas, foram assentadas, no máximo, 234.062. Em 2001, foram anunciadas 100 mil, que virou meta de 60 mil, mas o governo acabou desapropriando terras somente para 28 mil famílias.

A fronteira agrícola – O mesmo estudo revelou que o governo se utiliza dos estados da fronteira agrícola, como Pará, Maranhão e Mato Grosso para ‘ajeitar’ os dados. E entre as 234 mil famílias assentadas, 60% se referem a esses três estados (Pará 72.491 famílias, Maranhão 56.552 e 53.508 no Mato Grosso).

O Crédito para produzir – O governo acabou com o Procera (Programa Especial de Crédito para a Reforma Agrária) e o transformou em Pronaf (Programa de Fortalecimento da Agricultura Familiar). Ao mesmo tempo, acabou com o programa de assistência técnica aos assentados, o LUMIAR. Com isso, durante o ano de 2001, sobrou, nos bancos, mais de 50% dos poucos recursos disponíveis porque não havia agrônomos que fizessem os projetos.

A propaganda dos correios – O governo prometia terra em 90 dias para as famílias se inscreverem nos correios. Os sem terra se organizaram e foram aos correios. Em alguns meses 575mil famílias se inscreveram. Resultado: até hoje ninguém recebeu terras via correio.

Orçamento – Em 1997, pressionado pela opinião pública, o governo colocou 2,6 bilhões de reais no Incra. Em 2001, foram apenas 1,3 bilhões e mesmo assim o Ministro gastou somente 975 milhões.

Propaganda – Analisando o orçamento do Incra/MDA, o único item que nunca faltou dinheiro é a propaganda. O Ministro (Raul Jungmann) acaba de contratar a empresa ArtPlan por oito milhões de reais para fazer campanha do Incra. Por coincidência a empresa é do filho de um deputado do PFL. A Reforma Agrária do governo só existe na televisão. Os trabalhadores amargam cada vez mais dias de espera nos acampamentos, nas fazendas, trabalhando sem futuro. E o Ministro preocupado com o futuro de sua campanha eleitoral.

2002 – Felizmente estamos entrando no último ano do governo FHC, que aplicou um modelo econômico e agrícola que beneficiou apenas a grande propriedade, inviabilizou a pequena agricultura e os assentamentos. E garantiu amplo controle das empresas multinacionais sobre o comércio agrícola, as agroindústrias e as sementes.

Agora, mais do que criticá-lo, precisamos unir forças para conseguir derrotar esse governo e construir um novo projeto para o Brasil, que reorganize a agricultura para o mercado interno, garanta futuro para o agricultor, distribua renda e que, de fato, democratize a propriedade da terra, desapropriando os grandes latifúndios. E que se livre da dependência externa e do monopólio dos bancos.

Um 2002, cheio de lutas, esperanças, e conquistas!

Breves

Entidades entregam documento a presidente argentino

Representantes do MST, CMP, CUT, Sindicato dos Advogados, Pastoral dos Migrantes, PT, PC do B e parlamentares, como o Senador Eduardo Suplicy e o Deputado Federal Luiz Eduardo Greenhalg entregaram, em 9 de janeiro, um documento expressando preocupação com crise e solidarizando-se com o povo artentino. O documento foi entregue em uma audiência com a consulesa do país vizinho, Mirian Chavez e foi direcionado ao presidente argentino, Eduardo Duhalde.

Na carta, as entidades pediam para que o povo não fosse mais sacrificado, o fim da repressão e a punição dos responsáveis pelo assassinato de 30 argentinos, além de pedir o rompimento da Argentina com o FMI e a não submissão à ALCA, sugerindo também um plebiscito para que o povo se posicione em relação à Área de Livre Comércio das Américas, como será feito no Brasil na primeira semana de setembro deste ano.

MST lança agenda para 2002

Em 2002, a agenda do MST homenageia os artistas que tiveram coragem de romper com a arte burguesa em 1922. Em cada mês estão poesias e ilustrações de artistas modernistas, como Mário de Andrade, Manuel Bandeira, Tarsila do Amaral entre outros. A agenda traz também fotos das principais atividades do MST e de outros movimentos populares em 2001. É a única publicação que reúne dados, mapas e tabelas sobre a questão agrária e agrícola brasileira. Você também encontra depoismentos de personalidades em favor do MST e da luta pela terra, datas históricas e frases de lideranças populares do Brasil e do mundo.

Ocupação de terra no Maranhão

Cerca de 300 famílias trabalhadoras rurais sem terra ocuparam em 6 de janeiro a fazenda Cantanhede, no município de Matões (MA). Elas estavam acampadas há nove meses na BR 135, no município de Miranda do Norte. A decisão de ocupar aconteceu porque o Incra e o governo do Estado do Maranhão não honraram os compromissos assumidos, quando, após despejo da fazenda Tiracanga em maio passado, se comprometeram em assentar todas as famílias no prazo de 40 dias.

A polícia está no local, fazendo pressão e ameaçando entrar no acampamento. Helicópteros estão sobrevoando a área. Até o momento não existe nenhum mandado judicial, sendo a responsabilidade dessa ação da Polícia Militar do governo do Estado. A fazenda Cantanhede abrange duas áreas: uma de 2 mil hectares, onde se encontra a estrutura da fazenda e que foi ocupada, e a outra de 6 mil hectares. São consideradas improdutivas pelo Incra.