A conjuntura da Reforma Agrária
Muitos amigos e amigas do MST têm nos escrito pedindo a opinião do MST sobre os diversos temas que fazem parte da atual conjuntura agrária do Brasil. De maneira muito sintética e resumida pedimos à Direção Nacional para esclarecer alguns dos temas que estão colocados nesse momento.
1. A situação dos assentados
Nesses primeiros dez meses de governo Lula, houveram poucas alterações na política com os assentados. A principal mudança que se conseguiu foi uma Medida Provisória que renegociou dívidas passadas. No entanto, ao regular a MP para as agências bancárias, os gerentes interpretaram de diversas formas. Como resultado, a burocracia impediu que milhares de assentados pudessem ter acesso ao crédito nesse ano.
Por essa razão, em dezenas de cidades, os assentados se mobilizaram e fizeram vigília nas agências bancárias e nas Prefeituras, exigindo que o governo federal envie novas orientações que ajudem a desburocratizar o crédito e facilite o acesso aos recursos pelos assentados. Como o ciclo agrícola vai apenas até novembro, muitos temem não ter recursos para fazer o plantio. Na região Nordeste, praticamente nenhuma família assentada conseguiu acesso ao crédito nessa safra.
2. A situação dos acampados
A política do MST tem sido a de estimular que os sem terra se organizem e aumentem o número de acampamentos na beira das estradas como forma pacífica de fazer pressão pela Reforma Agrária. Em dezembro de 2002, havia cerca de 50 mil famílias acampadas. Hoje, o número estimado varia, segundo os cálculos, entre 160 e 200 mil famílias acampadas.
O Governo tem procurado cadastrar essas famílias e tem fornecido cestas básicas pelo programa Fome Zero. No entanto, a política de assentamento está muito lenta. Foram assentadas menos de 5 mil famílias em novas áreas em todo esse ano. Havia uma promessa do governo de assentar pelo menos 60 mil famílias. O MST está pressionando para que o Incra pelo menos acelere as vistorias e a preparação dos processos de desapropriação, para que as famílias vejam que há iniciativas concretas de tentar resolver o problema.
3. A situação dos transgênicos
O MST, juntamente com a Via Campesina, Contag, Fetraf e dezenas de entidades ambientalistas e de consumidores, junto com as pastorais sociais das igrejas, estamos numa longa batalha contra os transgênicos. O espaço aqui não é suficiente para explicarmos porque somos contra as sementes transgênicas, mas poderíamos resumir que se trata de uma luta, pela soberania alimentar, pelo direito a precaução, pela defesa da saúde pública, do meio ambiente, do direito dos agricultores reproduzirem suas sementes e contra o poder econômico das multinacionais, que são as únicas beneficiadas e querem o monopólio da produção.
O Governo Federal cedeu às pressões do PMDB gaúcho, do governador Rigoto e de meia dúzia de fazendeiros oportunistas do RS, e editou uma Medida provisória liberando plantio até 31 de dezembro de 2004. Mas as entidades e a sociedade reagiram e o governo teve um grande desgaste. Hoje há três recursos no STF pedindo cancelamento da Medida Provisória. E há uma pressão de muitos parlamentares que são contra a MP e exigem que o governo discuta uma lei definitiva para a biosegurança.
Por outro lado, a comissão de agrotóxico proibiu o uso do veneno Glifosato, que é o agrotóxico utilizado de forma casada com a soja transgênica da Monsanto. Se o Ministério da Agricultura fiscalizasse, inviabilizaria esse tipo de plantio.
Nossa luta é orientar os agricultores para que não plantem. Para que cuidem e preservem nossas sementes. Nossa luta será com a opinião pública, nas igrejas, nos sindicatos, fazendo com que os supermercados cumpram a lei e coloquem o rótulo nos produtos transgênicos e orientando as pessoas a não comprarem e exigirem o rótulo.
4. Plano Nacional de Reforma Agrária
A equipe técnica do Prof. Plinio de Arruda Sampaio elaborou um Plano Nacional de Reforma Agrária para os próximos anos, que prevê o assentamento de um milhão de famílias e diversas medidas administrativas para acelerar a Reforma Agrária. Esse documento foi entregue ao governo federal em 15 de outubro. Esperamos agora que o Palácio do Planalto assuma esse plano e que no próximo mês, se realizem diversos debates para conhecimento público. E que, sobretudo, o governo ajuste então o Plano plurianual e o orçamento para viabilizar o plano de Reforma Agrária. É necessário também preparar medidas administrativas de fortalecimento do Incra e outras portarias, que então transformariam a Reforma Agrária num programa prioritário e massivo, de maneira a ser um importante instrumento para o combate da pobreza, da fome e do desemprego.
5. Presos políticos do MST
Infelizmente continuamos com 17 companheiros presos em diversos estados do Brasil, como São Paulo,Mato Grosso do Sul, Goiás, Paraíba, Paraná, e prisões preventivas para outros 26 companheiros. Nós estamos tomando todas as medidas jurídicas cabíveis e desencadeamos uma campanha nacional com cartaz, abaixo-assinado e manifestações para sensibilizar as autoridades a tomarem as providências para que nossos companheiros recuperem a liberdade.
Em todos os casos de prisão, os juízes sentenciaram de forma política; classificaram o movimento como uma “quadrilha” e, por essa razão, deram voz de prisão aos seus dirigentes.
Solicitamos a todos que enviem mensagens ao STJ pedindo a liberdade dos trabalhadores.
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA – STJ
Presidente Ministro Nilson Naves
SAFS – Quadra 06 – Lote 01 – Trecho III
CEP 70095-900 – Brasília – DF – Brasil
Fax 51 61 319 8193 – [email protected]
Breves
Deputados paranaenses proíbem o plantio de transgênicos
Deputados estaduais do Paraná aprovaram em 14 de outubro, um projeto de lei estadual que proíbe o plantio e comercialização de organismos transgênicos no Estado até 31 de dezembro de 2006. O cultivo e a venda de transgênicos poderiam ser liberados antes disso apenas por meio de uma nova regulamentação que tivesse como base comprovação científica de que o produto não causa danos ao meio ambiente e à saúde. Elaborado pela bancada do PT, o projeto de lei se contrapõe à MP 131, publicada no fim de setembro, que libera, com algumas restrições, o plantio e comercialização de soja transgênica no país durante a safra 2003/04.
Lançada a edição 21 da Revista sem Terra
Movimentos sociais, conjuntura política e econômica e cultura são alguns dos temas que podem ser lidos na edição 21 da Revista Sem Terra. Neste mês, a revista fala, entre outros assuntos, sobre o crescimento econômico proporcionado pela agricultura familiar e também a necessária redefinição dos termos esquerda e direita. Informações sobre pontos de vendas ou assinaturas podem ser obtidas pelo telefone (11)3361-3866 ou através do endereço eletrônico [email protected]
Governo Rigotto “põe a venda” assentamento
As famílias de trabalhadores rurais assentadas no 19 de Setembro, em Guaíba, região metropolitana de Porto Alegre, foram surpreendidas com o anúncio da venda da área onde estão assentadas há 13 anos pelo Governo do Estado. A área pertence ao Instituto de Previdência do Estado (IPE), que está obrigado a vender parte de seu patrimônio para quitar dívidas. A ação era desconhecida até mesmo pelo Gabinete de Reforma Agrária e Cooperativismo do Governo do Estado(GRAC). Até o fechamento deste Boletim, as negociações entre o Governo do Estado e o MST não haviam avançado para uma solução do caso.
Cartas
Vence a Monsanto, perde o Brasil uma oportunidade única de conquistar a posição de fornecedor de soja orgânica para o mundo. A aceitação dessa soja vem destruir a imagem do país como produtor de alimento “limpo”. [email protected]
Magnífico o artigo do frei Marcelo Barros. Sem agressões, ele colocou os alimentos transgênicos na sua verdadeira dimensão. Só faltou dizer como o nosso saudoso Lutzemberger, “Estão brincando de Deus”. Francisco Anselmo Barros [email protected]
Raramente se lê algo tão magistralmente exposto, com clareza cristalina, com fundamentos elevados de fé e prática, como o maravilhoso texto do monge Marcelo Barros sobre transgênicos. Muito obrigado por produzirem um periódico de grande valor sobre um problema que se avoluma e que martiriza a maioria em benefício de uns poucos… [email protected]