Vinte anos em Movimento

Marcelo Medeiros e Fausto Rêgo
Fonte Rits

“A terra para quem nela trabalha e vive”. Ao assinar abaixo dessa frase, a última de um documento escrito em janeiro de 1984, 92 pessoas criavam o que é hoje o maior movimento social do Brasil, quiçá da América Latina. O Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) nasceu naquele ano, em seu primeiro encontro nacional, realizado em Cascavel (PR). Ao longo desses 20 anos, o MST enfrentou desafios, inclusive internos, para se formar, consolidar e nacionalizar. Destacou-se por sua capacidade de mobilização, ação política e por chamar a atenção para um dos grandes problemas do país: a má distribuição das propriedades rurais, até hoje não resolvido.

Apesar de surgir de forma organizada como movimento nacional em 1984, o MST já vinha sendo planejado bem antes. Depois de muitas promessas – não cumpridas – de ajuda do governo estadual, em 7 de setembro de 1979, 110 famílias ocuparam a fazenda Macali, no município de Ronda Alta, no interior do Rio Grande do Sul. As terras da Macali já haviam sido palco de lutas na década de 60, quando o Movimento dos Agricultores Sem Terra do Rio Grande do Sul (Master) organizara acampamentos na região. Padres da Comissão Pastoral da Terra (CPT), criada quatro anos antes pela Igreja Católica, tiveram papel fundamental no sucesso da empreitada, cuja ação serviu de modelo para outras.

No dia seguinte à ocupação, a Brigada Militar chegou ao local com ordens de despejar os ocupantes. A reação dos agricultores foi imediata. Mulheres pegaram seus filhos e formaram uma barreira em torno do acampamento. Os policiais recuaram e o governo acabou autorizando a permanência das famílias no local. A partir desse exemplo, diversas ocupações aconteceram nos primeiros anos da década de 80, principalmente nos estados da região sul, em São Paulo e no Mato Grosso do Sul.

Com apoio da CPT, diversos agricultores se encontravam em assembléias estaduais e regionais para trocar experiências de suas ações e discutir políticas estaduais de reforma agrária e apoio à pequena agricultura. Em 1982, por exemplo, 100 agricultores de Santa Catarina, Rio Grande do Sul, Paraná, São Paulo e Mato Grosso do Sul se reuniram em Medianeira (PR), no que foi o primeiro encontro regional dos sem-terra. No ano seguinte, em Goiânia (GO), 52 pessoas, algumas vindas de estados do norte e do nordeste, estiveram presentes em outro evento, cujas resoluções estabeleciam a formação de uma coordenação nacional provisória, encarregada de preparar um segundo encontro com representantes de vários estados.

O segundo encontro acabou se tornando o primeiro oficial do movimento, que já se declarava brasileiro e não apenas regional. Em Cascavel estiveram presentes sindicalistas, agricultores sem terra, agentes da Pastoral e assessores, vindos dos três estados do sul, de São Paulo, Espírito Santo, Pará, Bahia, Goiás, Mato Grosso do Sul, Rondônia, Acre e do então território nacional de Roraima. Nesse encontro, o movimento ganhou nome, caráter político e forma de ação, resumida no lema “ocupar e resistir”. Não haveria um presidente, pois as decisões caberiam a uma direção coletiva. Foi decidido também que o movimento não seria restrito a agricultores. A eles poderia se juntar qualquer um que quisesse lutar pela reforma agrária.

Para o geógrafo Bernardo Mançano, professor da Universidade Estadual de São Paulo (Unesp) e autor do livro “A formação do MST no Brasil”, naquela época já era possível imaginar a força que o movimento teria. “Quando ele nasceu, não existia outro movimento de sem-terra. Hoje há dezenas. Por isso existia espaço para o MST se territorializar – e ainda há”.

“Nós recuperamos a história da luta pela terra, fazendo uma análise crítica de erros e acertos cometidos por organizações camponesas que vieram antes de nós”, analisa Gilmar Mauro, membro da Coordenação Nacional do movimento. “Conseguimos evitar a repetição desses erros e tivemos sucesso ao colocar no Brasil o debate sobre a reforma agrária”. Ele, que participou de 19 desses 20 anos de história, faz um apanhado dos conceitos que originalmente nortearam o MST: estabelecer rumos claros; entender que é preciso fazer lutas, inclusive a luta política (“Não porque a gente acha bonito, mas porque faz com que as pessoas sejam sujeitos da própria história”); criar consciência política e de organização (“Nos momentos de luta, não se consegue nada se não tivermos o povo organizado para intervir”); manter a unidade, mesmo na divergência; manter a autonomia e buscar ser um movimento nacional.

Tudo isso, segundo o líder camponês, baliza a atuação do MST. “Nós construímos muito no campo da produção, da agricultura ecológica, mas o fundamental mesmo foi o resgate da dignidade humana, da auto-estima das pessoas. Do ponto de vista político, fugimos ao histórico dos movimentos sociais como braços de partidos políticos. O MST construiu sua autonomia, por isso a gente consegue juntar todo mundo, independentemente de religião ou partido: basta ser sem-terra. E isso permite que a gente construa alianças diversas”.

O resultado da organização foi imediato e trouxe reações. Em maio de 1985, as ações de ocupação de terra no oeste de Santa Catarina se intensificaram e serviram para marcar posição contra o recém-elaborado Plano Nacional de Reforma Agrária, favorável à negociação, assim como a Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura (Contag). No mesmo ano, era realizado, em Curitiba, o primeiro congresso do movimento. “Essas ações serviram para acirrar os ânimos no campo”, diz Leonilde Medeiros, professora do Curso de Pós-Graduação em Desenvolvimento, Agricultura e Sociedade da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (CPDA/UFRRJ) e pesquisadora de movimentos sociais rurais.

Em junho de 1985 foi criada a União Democrática Ruralista (UDR), entidade que reúne grandes fazendeiros de todo o país e se opõe à ocupação de terras. Segundo Medeiros, a oposição fez a violência no campo crescer naquele ano, bem como o número de desapropriações. Dados da Secretaria de Comunicação Social do Governo Federal mostram que no período de 1985 a 1989 foram assentadas 83 mil famílias, seis mil a mais do que entre 1964 e 1985. Neste período, contudo, mais terra foi concedida: 13,8 milhões de hectares contra 4,5 milhões de hectares, por causa da política de colonização de áreas pouco habitadas no governo militar. De acordo com dados da Comissão Pastoral da Terra e do MST, em 1983 foram assassinadas no campo 81 pessoas. Em 1984, 124; no ano seguinte, 171. Ou seja, um crescimento de 37% do primeiro para o segundo ano de movimento; mais de 100% de diferença entre 1983, ano anterior à fundação da iniciativa, e 1985.

Apesar da violência, o MST insistiu na estratégia de ocupar terras para pressionar o governo a acelerar o processo de reforma agrária. Medeiros aponta a Constituinte como vitória e derrota do movimento. A Constituição passa a prever a desapropriação de terras que não cumpram sua “função social” para fins de reforma agrária. “A definição de função social foi um avanço por incluir o respeito à legislação trabalhista, respeito ao meio ambiente e índices de produtividade”, diz. O problema, segundo a professora, é que até hoje não ficou claro o que é terra produtiva, e isso abre espaço para muitos recursos.

Reflexões

Nessa época o movimento percebe a necessidade de ir além da reivindicação de terras. Era preciso também viabilizar a produção. Surgem as Cooperativas de Produção Agrícola e diminui o número de ocupações. Ao lema “ocupar e resistir” é adicionada a palavra “produzir”. “Foi um momento de reflexão”, afirma Medeiros.

A partir daí, foi preparado terreno para a nacionalização do movimento. Mas os rumos tomados desde 1984 não são unanimidade. Zander Navarro, professor do Programa de Pós-Graduação em Desenvolvimento Rural da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (PGDR/UFGRS) e ex-assessor dos sem-terra, critica a forma de organização e a postura política tomada. Atualmente ele leciona na Universidade de Sussex, na Inglaterra.

“A hierarquização da tomada de decisões pela direção nacional é o maior erro da história do Movimento. Ela foi decidida no segundo semestre de 1985 [quando acontece o I Congresso dos Sem-Terra] e lançou as raízes de uma organização não democrática, onde os processos de decisão interna são comandados por lideranças que não têm nenhuma legitimação, por mais competentes que sejam. Não há a menor transparência dos momentos de deliberação e, desta forma, o MST acaba sendo uma organização que, embora eficaz em termos de resultados, torna-se estranha ao corpo político brasileiro. Enquanto o Brasil se democratizou rapidamente, o MST mantém, por causa da cabeça de alguns líderes, uma visão de país dos anos 70. Se se tornasse mais aberto e, especialmente, se valorizasse a democracia, o movimento seria infinitamente mais forte e seu papel político ainda mais relevante”.

Gilmar Mauro rebate de forma veemente: “Ele atua numa universidade, e eu pergunto: qual é a democracia que existe nas universidades? E onde ele vive, qual é a organização democrática que ajudou a construir? O Zander perdeu o bonde da história e poderia ser um belo assessor da UDR”. Para provar que o MST é uma organização democrática, ele usa sua própria história como exemplo: “Cheguei em 1985, participando de uma ocupação. Interessei-me, participei das discussões, tive oportunidade de estudar como outros milhares de jovens e hoje estou na Coordenação Nacional”. Gilmar destaca ainda o processo de debate interno do movimento, o qual classifica como um dos mais eficientes.

A eficiência e a força política citadas por Navarro puderam ser percebidas nos anos 90, quando o MST ganhou proporções nacionais e muita visibilidade. Apesar de o número de ocupações ter se mantido estável nos primeiros anos daquela década, ele aumentou muito a partir de 1995, primeiro ano do mandato de Fernando Henrique Cardoso, recordista em registro de ocupações. De acordo com dados da CPT e do próprio MST, houve 502 ocupações, que mobilizaram 30 mil famílias, 50% a mais do que no ano anterior. “O governo FHC deixou a reforma agrária fora da agenda, o que levou o movimento a reagir”, explica Leonilde Medeiros. Esse número, apesar da diminuição, manteve-se alto durante toda a década. Em 1996, houve 397 ocupações; em 1998, 446; no ano de 1999; 455; em 2000, 226.

Uma dessas centenas de ocupações teve a participação da agricultora Eliana de Souza, de 24 anos. Há pouco mais de seis anos, ela morava na área rural de Paracambi, município da região metropolitana do Rio de Janeiro. Lá conheceu alguns militantes do MST, que a convidaram a participar de reuniões de base. Aceitou o convite e começou a se envolver com a organização do movimento na região. “Decidi entrar no MST por necessidade. Não tinha emprego e meu companheiro vivia de bicos”, diz.

De lá, com a promessa de que ganharia um pedaço de terra, foi para Barra Mansa, cidade do noroeste fluminense, onde ocuparam a fazenda Primavera. Rapidamente foram despejados pela polícia, mas sem confronto. Ficou um ano acampada na beira da estrada junto a outras famílias, até decidirem entrar na fazenda da Ponte, habitada por apenas um arrendatário, que criava vacas. A área foi indicada pelo Sindicato de Trabalhadores Rurais de Barra Mansa por já ter sido alvo de denúncias de trabalho escravo, ser improdutiva e possuir dívidas com o governo federal.

Eliana conta que a tensão esteve presente durante todo o período em que esteve acampada. “O arrendatário tomou as dores do dono e andava sempre armado. Chamou a polícia, que felizmente não agiu com violência. Foi uma pressão psicológica muito grande”, conta. “Algumas famílias não agüentaram e desistiram, mas fiquei com meu companheiro”, lembra com orgulho.

A ocupação mobilizou 120 famílias, algumas vindas de outros acampamentos para ajudar. No fim, restaram 35 famílias, entre elas a de Eliana, para ocupar aproximadamente 400 hectares à beira do rio Paraíba do Sul. Em 6 de março deste ano, a fazenda, rebatizada de Terra Livre, completa cinco anos. Lá, Eliana e os familiares produzem principalmente mandioca e abóbora, além de criarem gado, que dá leite para seus dois filhos. A venda do excedente da produção consegue garantir 70% do dinheiro necessário para viver. O resto o companheiro consegue com bicos na cidade. “Apesar de todo o medo e situações ruins, acho que valeu a pena. Não é só pela renda, mas também pela auto-estima. Aqui é meu porto seguro”, afirma. Ela espera que seus filhos mantenham a terra que conquistou para “fazer jus a toda luta”.

Formação de militantes

Histórias como a de Eliana são comuns no movimento e demonstram dois aspectos importantes da sua organização: a formação de militantes e a ocupação como forma de luta. Dom Tomás Balduíno, presidente da CPT, acha ambos os aspectos inovadores. “O MST inova ao tornar a posse organizada, maciça e visível, como uma forma de denunciar a iniqüidade do latifúndio, de cobrar a reforma agrária já. Foi a alavanca do que existe de realizado até agora em termos de reforma agrária. E é muito importante também que eles tenham, desde cedo, captado a força do processo educacional. A lição do MST, que serve para toda a sociedade, é de educação, da juventude empolgante e empolgada nos processos educacionais, dentro do método de Paulo Freire. Uma grande massa jovem e todos aprofundando essa metodologia para levar a revolução para o campo”.

Para a educadora Roseli Caldart, que dá aula no Instituto Técnico de Educação e Pesquisa da Reforma Agrária (Iterra), órgão de formação técnica do MST, a educação proporcionada pelo Movimento dos Sem Terra já é uma contribuição para o país. “Temos o mérito de tentar oxigenar a escola tradicional”. Em toda área em que não há escolas públicas, o movimento instala uma. E já conseguiu universalizar o acesso ao ensino da primeira à quarta série, apesar de não conseguir dar educação a todos os jovens. “Refletimos o funil nacional. O gargalo no campo é ainda mais estreito”, afirma Caldart, que lembra a importância das ações de alfabetização de adultos.

Ela explica que não há um modelo de educação próprio do movimento, que adapta algumas linhas gerais à realidade de cada acampamento ou assentamento. Dessas aulas surgem as novas lideranças. Para Zander Navarro, contudo, a educação oferecida não passa de doutrinamento político. “O MST forma militantes que reproduzem o mesmo discurso ‘total’ em qualquer parte do Brasil, incapazes, em sua maioria, de responder a qualquer pergunta que escape ao discurso totalizante com o qual são ensinados a, digamos, entender o mundo”.

Caldart defende a idéia de que as escolas do movimento ajudam a refletir sobre a realidade. “Não vejo as novas lideranças como panfletárias. Elas têm uma visão de que as coisas possuem ligação entre si. A formação ajuda a ver isso, mas a realidade já mostra. Se são radicais no sentido de ir à raiz dos problemas, é positivo”, diz. O projeto educacional dos sem-terra é ambicioso. Até o final deste ano estará funcionando em Guararema (SP) a Escola Nacional Florestan Fernandes, que formará lideranças e profissionais como técnicos agrícolas e educadores para atuarem nos assentamentos. “Nós pretendemos que ela nos ajude na formação de militantes de base, na formação secundária e até na realização de cursos de especialização. Mas, essencialmente, queremos contribuir para a formação política e ideológica dos nossos militantes”, esclarece Gilmar. No entanto, a despeito da grandeza do projeto, ele observa que a concepção do MST sobre escolas ultrapassa os limites físicos. “A educação é um processo permanente. Até mesmo o espaço embaixo de uma árvore pode ser uma boa escola”.

No fim dos 90…

O setor de educação do MST, criado em 1988, é um dos pontos que mais chamam a atenção no movimento. Entretanto os sem-terra ganharam projeção internacional em 1996, com o caso de Eldorado dos Carajás, no Pará. Naquela ocasião, 19 agricultores que participavam da Caminhada pela Reforma Agrária foram mortos por policiais em uma rodovia. Eles são alguns dos mais de 1.500 trabalhadores que, segundo a CPT, já morreram em conflitos relacionados à disputa de terras desde 1980.

A comoção com o episódio foi grande e a reação do governo, rápida. O Ministério Extraordinário de Política Fundiária à época aumentou a quantidade de assentamentos. Os números do Incra mostram que em 1996, no ano em que aconteceu o massacre de Eldorado, foram assentadas 62 mil famílias. Em 1997, 82 mil e, no ano seguinte, 101 mil – um crescimento de 23% de um ano para o outro e de 63% em dois anos. “Carajás foi um fato marcante, que acabou colocando a reforma agrária em debate nacional”, comenta Gilmar. “A partir daí o tema começa a ganhar uma nova dimensão política”.

Em 1997, o movimento marcha rumo a Brasília para pedir reforma agrária. A manifestação é considerada por especialistas como o auge dessa luta. Nessa época o MST aumentou a pressão sobre o governo de outra forma: passou a invadir prédios públicos para pedir reforma agrária e liberação de créditos, entre outras reivindicações. Contudo, em 2001, mesmo ano em que agricultores invadiram a fazenda do então presidente Fernando Henrique Cardoso, em Buritis (MG), o governo reagiu editando a Medida Provisória 2183-56/2001, que proíbe a vistoria de fazendas ocupadas, impossibilitando, assim, sua desapropriação.

A quantidade de ocupações diminui devido à MP, mas o MST continuou ativo. Lentamente ele foi se engajando em outras causas, como o combate aos transgênicos e à Alca – Área de Livre Comércio das Américas. Para Bernando Mançano, a decisão é coerente. “A luta pela terra e pelo desenvolvimento da agricultura familiar não é somente por políticas agrícolas. A luta pela terra é uma luta territorial, que contém todas as dimensões da vida”. Mais uma vez, Zander Navarro aparece como voz dissonante. Para ele, essas questões precisam ser discutidas, mas estão distantes dos interesses dos assentados e acampados. “Isto representa outro erro estratégico infantil das lideranças, que não souberam avaliar a conjuntura e as possibilidades futuras depois da marcha a Brasília. A introdução desses temas mais enfraquece do que fortalece as lutas sociais pela terra. Para a massa de pobres do campo, esses são temas quase metafísicos”.

A réplica do MST vem na ironia de Gilmar Mauro: “O ‘nosso intelectual’ está completamente impregnado pelos preconceitos da autocracia burguesa que conduziu este país. É um preconceito característico da elite brasileira achar que pobre não pode discutir política”, rebate. “Nós estamos formando cidadãos, e estimular o debate de assuntos que não sejam apenas os relacionados à terra é fundamental. É lamentável que um sociólogo de esquerda tenha esse tipo de opinião”.

Rumos

Passados 20 anos do primeiro encontro nacional, o MST ainda parece ser o maior movimento social do país. Segundo seus dados, organiza aproximadamente 500 mil famílias em todo o país – 350 mil assentadas e 150 mil acampadas. Possui diversas cooperativas, algumas com clientes no exterior. Por outro lado, os assentados ainda carecem de melhores condições de produção, como crédito agrícola e assistência técnica.

Sua força política é inegável, mas agora está diante de um grande desafio. O MST sempre foi aliado do Partido dos Trabalhadores, porém o partido chegou ao poder e não tem imposto o ritmo de desapropriações que o movimento gostaria. A promessa no período eleitoral era assentar 60 mil famílias em 2003, mas apenas 26 mil ganharam terras. Outras quatro mil tiveram suas propriedades regularizadas. Os sem-terra afirmam haver uma demanda de cinco milhões de famílias.

Por isso os entrevistados concordam em afirmar que nada está definido. Para Mançano, “a perspectiva é viver entre a esperança e o medo, pois até o momento não temos indicadores de que o governo vai realizar uma política de reforma agrária. O MST não pode parar de ocupar”. Já Navarro acredita que o problema está nas mãos de Lula. “Não há um projeto de governo, mas sim de poder. Como se comportará o MST? Fazendo oposição ferrenha ao próprio campo político?”.

Segundo Gilmar Mauro, a resposta ao desafio é simples e o MST não pretende perder sua autonomia: “Vamos continuar fazendo luta, fazendo ocupações e negociando. Queremos que o governo cumpra o que prometeu”.