Por que os Sem Terra se mobilizam
Há oito anos José Ribamar Alves de Souza foi assassinado com dois tiros, um deles, na cabeça, à queima-roupa. Ele foi uma das 69 vítimas Sem Terra do massacre de Eldorado dos Carajás, PA.
Em 17 de Abril de 1996, integrantes do MST bloquearam a rodovia PA-150 reivindicando alimentos e a desapropriação da fazenda Macaxeira onde mais de 3 mil famílias estavam acampadas. Tropas policiais deslocadas com a única função de desobstruir a estrada, chacinaram 21 Sem Terra integrantes da “Caminhada pela Reforma Agrária”, destruíram o acampamento da beira da estrada e recuperaram alimentos apreendidos pelos trabalhadores na véspera.
O processo de julgamento ainda não foi concluído. No total, 142 policiais militares foram julgados pela chacina, mas apenas 2 foram condenados, em 2002. O Coronel Mário Pantoja e o Major Oliveira aguardam o julgamento da apelação em liberdade. Os outros 140 PMs que participaram da ação foram inocentados.
Foi o exemplo, o retrato de uma realidade que se estende até hoje.
Os trabalhadores do MST são relatados como os “violentos que romperam uma trégua dada a governo”. Mas, apenas existe trégua em guerras e não há guerra. Este é um discurso que a mídia tenta impor.
O que há são milhões de pessoas miseráveis com esperança de uma vida digna. A violência real pode ser vista nos dados da Comissão Pastoral da Terra, que apontam 1.280 trabalhadores rurais, técnicos, advogados e religiosos, ligados à luta pela terra, assassinados, de 1985 até 2002, em todo o Brasil.
Há muitas razões que poderiam ser usadas para demonstrar o direito de mobilização dos pobres do campo. A descrição da realidade de pobreza e exclusão social exposta aos nossos olhos seria suficiente. Mas queremos colocar, aqui, alguns dados estatísticos:
1. Cerca de 26 mil grandes proprietários de terra, que representam menos de 1% do universo de 5 milhões de proprietários, são donos de 46% de todas as terras do Brasil. Por isso, o Brasil é a região de nosso planeta de maior concentração da propriedade da terra.
2. A Constituição brasileira determina que TODAS as grandes propriedades que não cumprem sua função social, relativa a produtividade, respeito ao meio-ambiente e respeito aos direitos trabalhistas, devem ser desapropriadas pelo governo e distribuídas aos trabalhadores. Segundo o Plano Nacional de Reforma Agrária elaborada pelo Ministério do Desenvolvimento Agrário, há 55 mil imóveis rurais classificados como grandes propriedades improdutivas, que detêm 120 milhões de hectares, que deveriam, pela lei, ser desapropriados.
3. Há no Brasil em torno de 4,6 milhões de famílias de trabalhadores que vivem como sem-terras. Um estudo recente da Fundação Getúlio Vargas aponta que o Brasil tem 33% da sua população vivendo como miseráveis, o que representa cerca de 56 milhões de brasileiros.
4. Durante o governo de Fernando Henrique Cardoso (1994-2002), fazia-se propaganda na televisão de que haviam sido assentadas 620 mil famílias, nos oito anos. Censo dos assentados realizado pela Universidade de São Paulo em convênio com o Ministério do Desenvolvimento Agrário, provou que foram assentadas apenas 358 mil famílias nos oito anos.
5. Durante o governo FHC, realizou-se uma ampla campanha televisiva para que os sem-terra se cadastrassem nos correios, para que, assim, não precisassem se organizar no MST e ocupar terras. Cadastraram 880 mil famílias. Até hoje, NENHUMA delas foi assentada.
6. O chamado agronegócio é mostrado como solução. Mas as propriedades acima de mil hectares empregam apenas 600 mil assalariados, e possuem apenas 5% da frota nacional de tratores. As pequenas propriedades empregam 13 milhões de trabalhadores familiares e mais de 1 milhão de assalariados, e detêm 52% de toda frota de tratores do Brasil.
7. Durante o primeiro ano do governo de Luís Inácio Lula da Silva, o MST contribuiu para que se elaborasse um plano nacional de Reforma Agrária. A equipe do professor Plínio de Arruda Sampaio provou que seria possível assentar 1 milhão de famílias em um mandato. Nós aceitamos que a meta fosse de 400 mil famílias para o período de três anos de 2004 a 2006. Isso significaria em media 115 mil famílias por ano. No ano de 2003, foram assentadas 14 mil famílias, e neste ano apenas 7mil famílias.
8. Existem atualmente em torno de 200 mil famílias acampadas em beiras de estradas ao longo do país. Parte delas está organizada pelo MST e outra parte pelos sindicatos de trabalhadores rurais, e outros movimentos sociais que se multiplicam, se organizando na luta pela Reforma Agrária.
9. Há 500 mil famílias assentadas nos últimos 20 anos. Em 2003, apenas 64 mil famílias tiveram acesso ao crédito. As normas de assistência técnica determinam que o ideal é ter um técnico para cada 100 famílias. Isso demandaria a necessidade de 5.000 técnicos. Foram liberados recursos para contratar 300. O Incra tinha 12 mil servidores públicos na década de 70. Passaram-se mais de 20 anos, agora há 5 mil funcionários.
10. Ao longo dos 20 anos de redemocratização foram assassinados 1.671 trabalhadores rurais em conflitos de terra. Em menos de dez casos houve condenação e prisão dos assassinos.
11. O MST considera que a reforma agrária deve vir casada com agroindústria, educação e uma nova tecnologia agrícola que respeite o meio ambiente. Essa é a forma mais rápida e mais barata do governo criar 3 milhões de empregos, entre os pobres do campo.
O que vocês acham que o MST deve fazer para que a Reforma Agrária saia do papel, e que os latifúndios sejam realmente desapropriados, como determina a Constituição?
Secretaria Nacional do MST
Breves
MST se mobiliza em todo o país pelo cumprimento do Plano Nacional da Reforma Agrária
O MST está realizando uma série de ocupações e mobilizações como forma de pressionar o governo para que avance no cumprimento das metas do Plano Nacional de Reforma Agrária (PNRA). Até o momento, foram 77 ocupações, mobilizando 22.116 famílias, em 14 estados do Brasil. A massificação das ocupações parte do conhecimento do Movimento de que só a mobilização do povo trará as mudanças necessárias.
Câmaras Federal e Legislativa do DF homenageam MST pelos 20 anos e pelo Dia Internacional da Luta Camponesa
A Assembléia Legislativa do Distrito Federal realiza na sexta-feira (16/4), às 10h da manhã, sessão solene em homenagem ao Dia Internacional da Luta Camponesa e aos 20 anos do MST. Já na Câmara Federal, às 14h, haverá outra homenagem, no Plenário Ulysses Guimarães, em homenagem aos mártires de Eldorado dos Carajás e ao Dia Nacional de Luta Pela Reforma Agrária. Essa é a segunda vez que a Câmara Federal realiza Sessão Solene para homenagear o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra. A primeira foi em homenagem aos 20 anos do MST e aconteceu no dia 19/2 deste ano.
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Cartas
Se a luta pela divisão igualitária da terra não for correta, desconheço qualquer noção de certo ou errado. Alécio Gama dos Reis
[email protected]
Enquanto existir em nosso país um movimento social coerente e determinado como o MST, posso sonhar com um país com oportunidade para todos. Roberto Barreto Garcez Vieira Filho [email protected]
Somente a pressão popular pode causar mudanças. O aumento das ocupações em todo o Brasil reflete, antes de mais nada, a nossa realidade de exclusão que nem mesmo os mais otimistas conseguem ignorar. Sou professor de história e tenho uma grande admiração e respeito pelo MST. Antonio Sérgio Ferreira [email protected]