Fidel e Chávez firmam acordo de integração

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Fidel e Chávez firmam acordo de integração

16/12/2004

Por Verena Glass
Fonte Agência Carta Maior

A visita do presidente venezuelano Hugo Chávez a Cuba esta semana deu um novo impulso ao projeto de cooperação entre os dois países, firmado inicialmente em outubro de 2000. Além dos aspectos econômicos, no entanto, Chávez e Fidel Castro também selaram uma união política de oposição aberta ao projeto da Área de Livre Comércio das Américas (ALCA), adotando os princípios da chamada Alternativa Bolivariana para as Américas (ALBA), projeto de integração hemisférica idealizado pelo presidente venezuelano.

No campo econômico, houve uma ampliação efetiva do já existente Convenio Integral de Cooperação Bilateral. Segundo os novos termos, a Venezuela deve entrar com transferência de tecnologia e investimento nos setores industrial e de infra-estrutura cubanos, como energia, telecomunicações (satélites compartilhados), transportes, estradas, portos e agro-industrias, além da abolir taxas e tarifas sobre investimentos governamentais e de companhias cubanas na Venezuela; isenção, aliás, que também será adotada por Cuba em relação ao parceiro.

Por sua vez, o governo cubano oferece à marinha mercante Venezuela o mesmo tratamento dispensado aos navios domésticos, permitindo que os venezuelanos naveguem em suas costas e utilizem os portos livremente. Cuba também se compromete a pagar um preço mínimo de US$ 27/barril pelo petróleo venezuelano, e ampliará os programas sociais desenvolvidos na Venezuela por profissionais cubanos nas áreas de saúde e educação. A partir do novo acordo, serão cerca de 15 mil os médicos cubanos no programa Barrio Adentro (atendimento domiciliar de comunidades carentes), que também formarão profissionais venezuelanos na Universidade Bolivariana. Cuba também oferecerá anualmente 2 mil bolsas de estudo a jovens venezuelanos para cursos superiores no país.

União contra “colonialismo americano”

Politicamente, o ponto alto da visita de Chávez a Cuba – que termina nesta quinta, quando o presidente venezuelano chega ao Brasil para a cúpula dos chefes de estado do Mercosul – aconteceu na última terça-feira (14), com a assinatura de uma declaração conjunta de oposição à ALCA e de adoção da ALBA.

Segundo o documento, “ambos Chefes de Estado acordaram subscrever o seguinte ponto de vista: (…) a Área de Livre Comercio para das Américas (ALCA) é a expressão mais acabada dos apetites de dominação sobre a região e, ao entrar em vigor, constituiria um aprofundamento do neoliberalismo e criaria níveis de dependência e subordinação sem precedentes”.

A declaração rechaça abertamente tanto a idéia quanto o conteúdo discutido até agora nas negociações da ALCA, principalmente seu aspecto meramente economicista que desconsidera uma integração mais ampla entre os países da região. Neste sentido, a adoção da ALBA seria o início de um projeto latino-americano de integração, proposto por Chávez na III Cúpula de Chefes de Estado e Governos da Associação de Estados do Caribe em 2001.

“Apenas uma ampla visão latinoamericanista, que reconheça a impossibilidade de desenvolvimento pleno de nossos países se continuarem ilhados, será capaz de lograr o que Bolívar chamou de ‘formar na América a maior nação do mundo, menos por sua extensão e riqueza que por sua liberdade e glória‘, e que [Jose] Martí concebeu como ‘América Nossa’, para diferenciar-la da outra América, expansionista e de apetites imperiais”, diz a declaração.

Afirmando que a ALBA permitiria uma transformação da sociedade latino-americana, “tornando-a mais justa, culta, participativa e solidária”, o documento lista 12 critérios a serem adotados no processo de implantação:

“1- O comércio e a pesquisa não devem ser um fim em si mesmo, senão instrumentos para alcançar um desenvolvimento justo e sustentável, pois a verdadeira integração latino-americana e caribenha não poder ser uma simples estratégia para ampliar os mercados externos ou estimular o comércio. Para alcançá-la, se requer uma efetiva participação do Estado como regulador e coordenador da atividade econômica.

2- Trato especial e diferenciado, que leve em conta o nível de desenvolvimento dos diversos países e a dimensão de suas economias, e que garanta o acesso de todas as nações participantes aos benefícios que derivem do processo de integração.

3– A Complementaridade econômica e a cooperação entre os países participantes e não a competição entre países e produções, de tal forma que se promova uma especialização produtiva eficiente e competitiva que seja compatível com o desenvolvimento equilibrado em cada país, com as estratégias de luta contra a pobreza e com a preservação da identidade cultural dos povos.

4– Cooperação e solidariedade que se expressem em planos especiais para os países menos desenvolvidos na região que inclua um Plano Continental contra o Analfabetismo, utilizando modernas tecnologias aprovadas na Venezuela; um plano latino-americano de tratamento gratuito de saúde a cidadãos que carecem destes serviços e um plano de bolsas de caráter regional nas áreas de maior interesse econômico e social

5– Criação de um Fundo de Emergência Social, proposto pelo presidente Hugo Chávez na Cúpula dos Países Sul-americanos, celebrada recentemente em Ayacucho (Peru)

6– Desenvolvimento integrado das comunicações e do transporte entre os países latino-americanos e caribenhos, que inclua planos conjuntos de estradas, ferrovias, linhas marítimas e aéreas, telecomunicações e outros.

7– Ações para propiciar a sustentabilidade do desenvolvimento mediante normas que protejam o meio ambiente, estimulem o uso racional dos recursos e impeçam a proliferação de padrões de consumo alheios à realidade de nossos povos.

8– Integração energética entre os países da região, que assegure a distribuição estável de produtos energéticos em benefício das sociedades latino-americanas e caribenhas, como promove a República Bolivariana de Venezuela com a criação da Petroamérica.

9– Fomento dos investimentos de capitais latino-americanos na própria América Latina e no Caribe, com o objetivo de reduzir a dependência dos países dos grandes investidores faraônicos. Para isto se criarão, entre outros, um Fundo Latino-americano de Investimento, um Banco de Desenvolvimento do Sul, e a Sociedade de Garantias Recíprocas Latino-americanas.

10– Defesa da cultura latino-americana e caribenha e da da identidade dos povos da região, com particular respeito e fomento às culturas autóctones e indígenas. Criação da Televisão do Sul (Telesul) como instrumento alternativo a serviço das nossas realidades.

11- Medidas para que as normas de propriedade intelectual, ao mesmo tempo em que protegem o patrimônio dos países latino-americanos e caribenhos frente à voracidade das empresas transnacionais, não se convertam em um freio à necessidade de cooperação em todos os terrenos de nossos países.

12- Entendimento de posições na esfera multilateral e nos processos de negociação de todo tipo com países e blocos de outras regiões, incluída a luta por democratização e transparência nos organismos internacionais, particularmente as Nações Unidas e seus órgãos.

Assinada em Havana, aos catorze dias do mês de dezembro de dois mil e quatro.

Fidel Castro Ruz, Presidente do Conselho de Estado da República de Cuba

Hugo Chávez Frias, Presidente da República Bolivariana de Venezuela”.