Desapropriações não atendem as metas para assentamento
Estimados amigos e amigas da luta pela Reforma Agrária, do MST e da Via Campesina,
Estamos iniciando mais um ano de atividades. Esperamos que seja cheio de realizações pessoais, e sobretudo de conquistas sociais, de melhorias das condições de vida de nosso sofrido povo brasileiro. E assim também vamos retomando nossa carta coletiva, nesse espaço do MST Informa.
Para iniciar o ano de 2005, estamos compartilhando com todos vocês um balanço do que foi a Reforma Agrária em 2004, do ponto de vista das políticas públicas e das metas de assentamento. Optamos por distribuir artigo do jornalista Eduardo Scolese, da Folha de S.Paulo, que traz uma avaliação condizente com a realidade. É um artigo conciso, com as informações básicas para que vocês possam tirar suas conclusões.
Durante o ano, esperamos seguir nos encontrando a cada 15 dias, para compartilhar com vocês nossas reflexões, preocupações e conquistas.
Recebam um forte abraço, em nome de toda equipe do setor de comunicação e da secretaria nacional do MST.
Desapropriações não atendem as metas para assentamento
Folha de S.Paulo, 04 de janeiro 2005
Eduardo Scolese
O governo federal desapropriou entre janeiro e dezembro de 2004 áreas suficientes para assentar cerca de 25 mil famílias de trabalhadores rurais. A meta era assentar 115 mil, sendo 75 mil delas em terrenos desapropriados para fins de reforma agrária.
Apesar de não ter fechado seu balanço, o Ministério do Desenvolvimento Agrário admite que, assim como ocorrera em 2003, não cumpriu sua meta em 2004. Até 20 de dezembro, 68,3 mil famílias tinham sido assentadas.
Em 2004, o governo desapropriou 389 áreas, num total de 875,7 mil hectares, de acordo com decretos da Presidência da República publicados no “Diário Oficial” da União. Em média, segundo o Incra (Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária), cada família assentada fica com um lote de 35 hectares.
O processo de desapropriação de uma área leva, em média, de cinco meses a um ano, dependendo do ritmo de cada uma das etapas, como criar o projeto, dividir os lotes e selecionar as famílias.
O processo pode atrasar ainda mais, caso o proprietário conteste a desapropriação na Justiça. A terra é paga em TDAs (Títulos da Dívida Agrária), e as benfeitorias, em dinheiro à vista.
É provável, portanto, que uma área desapropriada a partir de agosto ou setembro somente se transforme num assentamento no ano seguinte – que é o chamado “estoque” de terra.
Entre 1º de agosto e 31 de dezembro de 2004, o governo desapropriou 450 mil hectares (ou seja, 51% do total), contra 143,8 mil no mesmo período de 2003.
Em 2004, 49% dos hectares desapropriados estavam na Amazônia Legal (Estados do Norte, além de Maranhão e Mato Grosso), prática condenada pelo PT na condição de oposição devido à falta de infra-estrutura básica (água, luz e esgoto). Nesses nove Estados, a demanda por terra tem sido discreta. Das 316 invasões entre janeiro e novembro de 2004, 17 (5%) ocorreram na região.
Acesso à terra
Além das desapropriações, o governo considera assentadas as famílias colocadas em terras públicas, em projetos estaduais ou em lotes vagos de assentamentos antigos. Há ainda as operações de compra e venda de terras, incluídas, segundo o ministério, na meta de 75 mil famílias.
A desapropriação, porém, é apontada como a principal forma de obtenção de terra, segundo o PNRA (Plano Nacional de Reforma Agrária) de novembro de 2003. O MST (Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra) defende a mesma tese.
“A essência da reforma agrária é a capacidade do governo de democratizar o acesso à terra. E, para democratizá-la, só existe um caminho: a desapropriação”, afirmou João Pedro Stedile, da coordenação nacional do MST. “Se o governo não priorizar esse instrumento, vai acontecer como na gestão FHC [1995-2002], com o governo realizando desapropriações pontuais sem se preocupar com uma política geral de reforma agrária”, completou .Agora, segundo Stedile, o governo Luiz Inácio Lula da Silva “precisa recuperar as diretrizes da proposta do PNRA”, com a seleção de regiões prioritárias, como a zona canavieira do Nordeste e da pecuária do Centro-Oeste.
Sobre o total desapropriado em 2004, Stedile disse: “O dado demonstra o que estamos avisando o governo há muito tempo. A reforma agrária está a passos de tartaruga, no tamanho e na qualidade. O governo está em dívida conosco no seu acordo firmado em novembro de 2003, que assentaria 400 mil novas famílias [até 2006], priorizando aquelas que sofrem debaixo de lonas pretas”.
Em 2004, para cumprir a meta, Lula prometeu uma suplementação de R$ 1,7 bilhão ao Desenvolvimento Agrário, mas apenas R$ 700 milhões foram liberados.
Breves
Três trabalhadores rurais Sem Terra são assassinados em Pernambuco
O MST sofreu mais uma violência do latifúndio: o assassinato de três trabalhadores rurais Sem Terra em Pernambuco no mês de dezembro. Josuel Fernandes da Silva morreu no município de São José da Coroa Grande após denunciar à polícia ameaças de morte que vinha sofrendo. Francisco Manoel de Lima e Edilson Rufino da Rocha foram mortos em Passira na frente de seus familiares. Em 2004, 32 trabalhadores Sem Terra foram assassinados, vítimas da violência do latifúndio.
Exército e MST constroem juntos a cidade do Fórum Social Mundial
Soldados do Exército e nove trabalhadores rurais do MST começaram em dezembro a trabalhar juntos na construção de estruturas para abrigar atividades do Fórum Social Mundial, que se realiza em Porto Alegre (RS) entre os dias 26 e 31 de janeiro.Tanto o Exército quanto o MST atuam no projeto para aprender e depois utilizar a técnica das bioconstruções – estruturas de eucalipto, paredes de palha (de arroz, trigo ou cevada) e telhado de grama.
Incra recebe permissão para desapropriar Fazenda da Barra
Após um longo processo, que teve início em 2000, o Incra (Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária) recebeu permissão do governo federal para desapropriar a Fazenda da Barra, em Ribeirão Preto (SP). A fazenda, do grupo empresarial Robeca, foi considerada improdutiva em setembro do ano passado.
Cartas
Amigos e amigas do MST, que bom que vocês existem! Vocês representam a esperança que a gente não pode perder de que o mundo pode ser diferente.Que 2005 seja de muita luta e nenhuma morte! Um grande abraço a todos, Irmã Pompéa, Cônegas de Sto Agostinho.
Estimados companheiros: minha saudação e minha solidariedade. Que o tempo que vem nos encontre no mesmo caminmho e no mesmo trabalho. Anibal Quijano.
“A propriedade não tem somente direitos, tem também deveres (…) Não separarei mais as duas questões, a da emancipação dos escravos e a emancipação do solo. Uma é o complemento da outra. Acabar com a escravidão não nos basta. É preciso destruir a obra da escravidão”. Joaquim Nabuco, líder abolicionista. Um 2005 com Reforma Agrária. Votos de Fernando Lyra.