Floresta Amazônica continua sendo destruída
Informativos – Últimas do MST
Floresta Amazônica continua sendo destruída
06/01/2005
Por Ana Maria Fiori
Fonte Jornal Brasil de Fato
Recentemente, uma estimativa divulgada pelo Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE) informou que 23.750 quilômetros quadrados da Floresta Amazônica foram desmatados de agosto de 2002 a agosto de 2003, nas áreas em que o processo de destruição da mata acontece com mais intensidade.
Especialista na região, o geógrafo Aziz Nacib Ab’Saber, professor honorário do Instituto de Estudos Avançados da Universidade de São Paulo, alerta para as conseqüências ambientais e sociais das rotas de desmatamento.
Intelectual com profunda visão humanista e democrática, ele defende o desenvolvimento por meio de projetos sociais de auto-sustentabilidade dos povos da floresta, no lugar da ganância capitalista Ab’Saber, que acaba de ter reeditado seu livro Amazônia, do Discurso à Praxis, de 1996, pela Editora da Universidade de São Paulo, destaca a estrada Belém- Brasília como elemento importante da invasão capitalista na Amazônia. “Essa estrada demorou para ser construída e não houve nenhuma previsão de impactos. À medida em que foi sendo rasgada no coração da selva, as pessoas já começaram a ocupar terras devolutas laterais. E, mais perto de Belém, a comprar por preços aviltados terras de proprietários que não tinham nenhuma possibilidade para produzir nada,” afirma o geógrafo.
Problema grave
Para Reinaldo Corrêa Costa, geógrafo do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (INPA), “esse espaço herdado da natureza com imensa biodiversidade e habitado por diferentes grupos sociais e culturais – que detêm os chamados etnoconhecimentos, transmitidos de geração em geração – é encarado por alguns como mato sem gente, a ser queimado para a formação de pastagens, que nada mais são do que terra como reserva de valor”.
Ele afirma que isso é um problema grave no governo, pois o Ministério da Agricultura apóia a formação de fazendas de gado e o avanço da soja, que desmatam, geram pouco emprego e são concentradores de renda. Enquanto isso, o Ministério do Meio Ambiente procura preservar e fazer uso social da terra, sem desmatar.
“No final, gado e soja, que geram muito dinheiro, levam a melhor. Com isso o país, que quer assento no Conselho de Segurança da Organização das Nações Unidas (ONU), perde. Se não consegue criar segurança alimentar para sua própria sociedade, como quer ter respaldo político no exterior?”, questiona Costa.
Alternativas
Crítica mais forte vem de Ab’Saber, que não esconde sua longa amizade com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva e o apreço que tem pela ministra do Meio Ambiente, Marina Silva. O professor sempre colaborou com o Partido dos Trabalhadores e, muito antes de o PT ser governo, já fazia detalhadas análises, de profundo conteúdo técnico, mas apresentadas em linguagem simples, para subsidiar o planejamento de ações nos espaços herdados da natureza, tão caros a ele como a cultura indígena e sertaneja.
Inconformado com ações do Ministério do Meio Ambiente, afirma que é necessário encontrar alguns tipos de atividade que sejam social e economicamente auto-sustentáveis.
Diz mais: “Eu não uso a palavra sustentável nunca, a não ser para economias ecologicamente autosustentáveis. E é o que eu defendo agora, para o entorno das Florestas Nacionais, as Flonas. Ataco os asseclas do Ministério do Meio Ambiente que querem conceder Flonas para organizações não-governamentais (ONGs) estrangeiras, ou então alugar Flonas para obter dinheiro, o que não é tarefa do Ministério do Meio Ambiente”.
Soberania
Costa lembra que, no caso de haver qualquer divergência entre o governo brasileiro e os grupos que poderão explorar as Flonas, um tribunal internacional poderá ser escolhido para discutir a questão. “Isso implica em ameaça à soberania nacional”, adverte o pesquisador. Ab’Saber sugere que se faça o uso do bordo dessas florestas, que estão mais ou menos bem preservadas, para atividades agrárias auto-sustentáveis.
Como exemplo dessas atividades, cita o projeto RECA – Refl orestamento Econômico Consorciado e Adensado, que surgiu em 1987. Aziz conta que, em Rondônia, na fronteira com o Acre, um ex-padre francês associou-se a pessoas da zona rural da cidadezinha de Nova Califórnia, a única com um certo mosaico de plantações economicamente válidas, mais muito pequenas.
Por meio do contato com os parceiros amazônidas do Acre, o ex-padre desenvolveu uma forma de ocupação de bordo de floresta. Utilizou o bordo para iniciar as plantações e seguiu em frente, na terra já devastada.
Alimentos
Dentro da floresta, continuaria o extrativismo da seringueira e a coleta da castanha. Fora dela, o plantio de abacaxi, hortaliças, mandioca e feijão, para servir de alimento às pessoas cooperadas, nos primeiro dois anos de atividade. Depois, com outros processos agronômicos, culturas de açaí, pupunha e cupuaçu, para atividades rentáveis posteriores a quatro ou cinco anos.
Os cooperados, pessoas de meia-idade, também plantaram mudas de uma castanheira que foi desenvolvida por enxertia pela Embrapa de Belém e que pode começar a dar frutos em 17 ou 18 anos. Quando o professor perguntou sobre o que fariam com essas castanheiras, responderam que elas ficariam para os filhos.
“Coisa de louco essa frase, não é?”, encanta-se Ab’Saber, que afirma ter sugerido que se fizesse o mesmo para as Florestas Nacionais. “Essa é a única proposta que eu tenho para ocupar os bordos de qualquer floresta, seja ela de terras devolutas, mal trabalhadas, ou de proprietários mais esclarecidos”, argumenta.
Ele acrescenta que para o conjunto das terras baixas da Amazônia, que estão em processo de devastação e têm sempre um paredão de borda de floresta, não conhece outra solução. “Quanto às planícies, é evitar que aconteça nelas a chegada das grandes agropecuárias. Porque o pessoal que está lá sabe como produzir”, finaliza.