Eleição de progressistas enfraquece Estados Unidos, diz professora da UERJ
Por Marina Mendes
Fonte Agência Notícias do Planalto
“Os Estados Unidos parecem destinados pela providência para encher a América de misérias em nome da liberdade”. A frase é do revolucionário Simon Bolívar, nascido em Caracas, na Venezuela, e morto na Colômbia em 1830. Dita há mais de 70 anos, parece que o teor da frase ainda estimula os outros países da América a buscar sua liberdade econômica, social, cultural e política.
2006 será um ano eleitoral e já desde 2002, as mudanças presidenciais nos países do Sul têm procurado fortalecer a identidade latino-americana. Não há uma fórmula específica de transformação, mas os fatos estão aí. A professora de Relações Internacionais da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ), Miriam Saraiva, comenta o assunto.
Como se explica esta nova tendência na América Latina?
Miriam Saraiva: Tenho a impressão de que toda a trajetória de ajuste das economias no sentido do neoliberalismo, de certa forma, não atendeu as expectativas das pessoas em geral. E veio junto com o processo de consolidação democrática em muitos Estados. Então, neste momento, o que você tem é uma expectativa da democracia, como se a democratização por si pudesse atender os problemas da população. Este movimento de consolidação democrática, junto da questão do neoliberalismo no campo econômico, não atendeu as expectativas. Ao contrário, em muitos casos agravou a situação. Então é claro que esta frustração, essa decepção, tanto com um tanto com outro fez com que as pessoas começassem a buscar candidatos alternativos. E na medida em que os candidatos da esquerda começaram a se eleger sem que causasse grandes transtornos, como no passado teria causado, isso abre uma perspectiva e uma certa esperança de que seja possível eleger estes candidatos e que com isso possa fazer algum tipos de mudança.
E como se comporta o império dos Estados Unidos com relação à América Latina?
MS: Até agora os EUA têm enfrentado esta mudança com uma certa calma. O governo Bush tem uma preocupação muito grande com questões que não se referem à América Latina. O terrorismo internacional, a guerra do Iraque. Do atentado de 2001 para frente, a América Latina perdeu peso, digamos assim, na política internacional norte-americana. Os Estados Unidos têm olhado com uma certa distância, embora, o que ele têm tentado fazer é buscar avançar nos temas que lhe são especialmente interessantes, que é questão da formação da Alca (Área de Livre Comércio das Américas) e, na ausência da Alca, ela vai buscando acordos bilaterais, com países específicos. A diplomacia norte-americana está concentrando suas críticas em cima do governo Chávez, que é um governo não somente populista, mas que busca o enfrentamento com os EUA também.
Como se devem sair os candidatos progressistas neste ano de eleições e como isso enfraquece as políticas estadunidenses?
MS: Eu acho que em princípio a tendência é que estes candidatos progressistas se elejam, pelo menos no Peru está parecendo assim e no México. É claro que a eleição destes candidatos enfraquece os EUA. Eu queria ver um pouco, em que medida as eleições destes candidatos poderá proporcionar uma união latino-americana clara. Os governos de esquerda não têm um comportamento único. Não existe um lema a esquerda se comporta assim. Mas seja lá como for eu acho que enfraquece sim, pelo menos existe uma tendência a pelo menos dar mais atenção à estas questões sociais que o governo norte-americano nunca se preocupou. A Alca é um modelo estritamente de mercado. Alca não tem preocupações de desenvolvimento, de diminuição de pobreza. A Alca tem uma preocupação de mercado, vamos vender mais, comprar mais. O que não vai acontecer aquilo que acontecia no passado que a gente se imaginava nos anos 60, depois da revolução cubana, de que os governos progressistas iam ser todos e teriam pensamentos parecidos para lutar contra os EUA, mas em termos individuais e em medidas diferentes, claro que sim. Vai enfraquecer.