Governo ainda não resolveu a questão agrária
Leia abaixo entrevista com Marina dos Santos, integrante da direção nacional do MST, sobre as mobilizações do Movimento neste mês.
Em março o MST fez ocupações simultâneas em 17 estados. Por quê?
Diferentemente do que diz a imprensa, o que está acontecendo não é fruto nenhuma jornada em nível nacional do MST. Essas ocupações e ações que estão ocorrendo nos estados são porque o nosso povo viu chegar o último ano do governo e os problemas não serem resolvidos. Nós temos estados em que as famílias estão há cinco, seis anos estão nos barracos de lona e não vêem solução para essa situação. Outra questão é a política econômica do governo, com altas taxas de juros e superávit primário: ela não tem contribuído com o processo de fortalecimento da pequena agricultura, que é a responsável pela produção de alimentos no país. Esse modelo econômico não tem feito sobrar dinheiro para as questões sociais e assim não há recursos para avançar na Reforma Agrária.
Dentro disso, nós estamos questionando a função social da terra e recuperando os termos da Constituição Federal sobre os elementos que uma área tem que ter para ser considerada produtiva: como é sua relação com o meio-ambiente, se tem trabalho escravo, se planta e colhe alimentos. Aí entra a questão da atualização dos índices de produtividade. O governo usa desde 1975 os mesmo índices e não conseguiu avançar na atualização nem para fazer uma portaria.
Além disso, nós temos em torno de 120 mil famílias ligadas ao MST acampadas e o governo não conseguiu avançar no assentamento delas. Então todas as mobilizações têm relação com essas questões: assentamento das famílias, mudança do índice de produtividade e no modelo econômico, que emperra o avanço da Reforma Agrária.
A atualização dos índices de produtividade e o assentamento das famílias eram pontos de reivindicação da Marcha Nacional pela Reforma Agrária, realizada no ano passado. Os demais pontos foram atendidos?
Algumas coisas foram atendidas, mas muito pouco. Avançamos na área da educação, para continuarmos realizando cursos de capacitação com o nosso povo. Mas o governo não resolveu de fato a questão agrária.
As mobilizações continuam em abril?
Certamente. Nosso povo sairá do campo para se juntar com os trabalhadores urbanos, fazendo vigílias e cobrando a punição dos responsáveis pelo Massacre de Eldorado dos Carajás, que nesse ano completa 10 anos. Hoje o cenário que temos é de impunidade dos crimes que o latifúndio comete contra os trabalhadores. Vamos também lutar juntos pelo aumento do salário mínimo, em torno das manifestações do 1° de maio.
Como o MST enxerga a saída do ex-ministro da Fazenda Antonio Palocci?
Como o Palocci é talvez o maior representante da política de continuidade do governo Fernando Henrique Cardoso, nós achamos importante a troca. Não vamos nos manifestar em torno do próximo ministro, que é problema do governo. Nós acreditamos que o presidente ficou refém da política econômica apresentada. Mas esta pode ser uma oportunidade para dar uma mexida nessa política de juros altos e exportação. Quem está obtendo os maiores lucros são as empresas transancionais e as grandes empresas nacionais. Quem sabe uma mudança não faça com que as questões sociais também sejam resolvidas e não sobre um pouco de dinheiro para resolvermos os problemas do povo brasileiro, motivo pelo qual Lula foi eleito para a Presidência.