MMM faz carta em repúdio a comercial da Aracruz
Em protesto à participação de personalidades culturais e esportivas no comercial “O papel do Brasil”, da empresa Aracruz Celulose, militantes da MMM (Marcha Mundial das Mulheres) enviaram cartas às personalidades que emprestaram sua imagem na peça publicitária.
A carta foi dirigida às sete personalidades que participam da propaganda e ao ministro da Cultura, Gilberto Gil, que cedeu os direitos de sua música “Balé de Berlim”. No comercial, Pelé, a ginasta Daiane dos Santos, o cantor Seu Jorge, o astronauta Marcos Pontes, o boxeador Popó, o técnico Bernardinho e o iatista Robert Scheidt mostram sua intimidade com a bola, sob o slogan “Fazendo um bonito papel no mundo inteiro”.
Leia abaixo a carta.
“Nós, da Marcha Mundial das Mulheres, ficamos incomodadas ao ver a sua imagem, junto à de uma série de personalidades da elite esportiva e cultural de nosso país, associada a da Aracruz Celulose, num milionário comercial de TV. Incômodo, embora seja uma palavra leve, talvez se adeque melhor ao sentimento que temos. Pois, conhecemos o grande apelo corporativo e institucional e as vantagens que uma marca como esta é capaz de proporcionar.
A Aracruz, como toda grande empresa voltada para o lucro, principalmente diante deste momento tumultuado em que enfrenta a oposição solene de diversos setores da sociedade ligados à luta pelos direitos humanos, solidariedade e soberania, sabe que o investimento numa campanha que vincule a sua imagem a um ideal vitorioso de cidadania é o melhor emprego que os seus dividendos poderiam ter. Sabemos disso também.
Sabemos que há apoios e ofertas para um atleta, músico ou artista, num país com uma política de educação e cultura frágil como a nossa, são praticamente impossíveis de se recusar. Mas, na contramão de tudo isto, também estamos cientes de que, mais que tudo, o valor de seu nome é o seu grande referencial. Seu nome é imediatamente relacionado a um exemplo de superação, é uma inspiração aos nossos corações e mentes. Seu nome, nesse mesmo país de tanta luta inglória daqueles que estão à margem até mesmo dos sonhos que sua imagem representa, é muito valioso.
Incomoda saber que ele estará associado à Aracruz, uma empresa que devasta milhares de hectares de terra no Brasil para plantação extrativista de eucalipto, uma planta que não mata a fome de nossa população e cuja produção só se destina a fortalecer o capital externo.
Incomoda saber que ao seu nome será atribuída uma parceria com a mesma empresa que expulsa de suas reservas milhares de quilombolas e indígenas, que derrama o sangue de tantos agricultores e agricultoras que necessitam de um pedaço de terra para alimentar suas famílias, para, em vez disso, estender um grande deserto verde, onde jaz a desigualdade e a marginalidade de todas as pessoas que lutam pelo direito igualitário à terra no Brasil.
Incomoda no mais profundo de nossa consciência saber que o seu nome, o seu valor, o seu ideal para todos nós, brasileiros e brasileiras, está assinado embaixo dessa grande força propulsora, que em nome do dinheiro promove a dor e a devastação nesse mesmo país, onde ele se tornou símbolo de tudo o que há de melhor.
Nos incomodamos por nos sentirmos responsáveis, por sabermos que nosso silêncio, diante de tudo isso, irá deixar nossos nomes, anônimos, também omissos. Nos incomodamos ao assistir a tudo isso na realidade do país que ajudamos a construir.
Nos incomodamos porque toca à nossa dignidade cidadã e fere os nossos princípios. E é por isso que lhe escrevemos está carta, para, ao menos tentar, lhe deixar tão incomodada quanto nós!
Marcha Mundial das Mulheres, Mossoró-RN, Brasil.”