Carta ao presidente do BNDES

Rio de Janeiro, 07 de março de 2007.

Ao sr. presidente do BNDES Demian Fiocca,

Nós, mulheres do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra e da Via Campesina, celebraremos amanhã o Dia Internacional da Mulher. No campo, entretanto, não há muito para comemorar. Por isso, viemos à sede do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social para expor nossa indignação e exigir atenção.

Nos últimos anos, o BNDES vem priorizando a aplicação de recursos em grandes empresas parceiras do capital estrangeiro e voltadas para a exportação em detrimento dos necessários investimentos para desenvolver o campo e a cidade e garantir a produção agropecuária voltada para o mercado interno. A opção do banco em financiar o agronegócio em grande escala e ignorar totalmente a pequena agricultura, responsável pela criação de 80% dos empregos na área rural e pela produção de alimentos de forma sustentável e segura, só pode ser interpretada como um sério equívoco que precisa ser enfrentado e sanado.

O BNDES tem aplicado cada vez mais recursos em setores que agridem o meio ambiente, exploram os trabalhadores e impedem a Reforma Agrária. Nos recursos para Papel e Celulose, por exemplo, o banco criou a absurda situação em que financia a si próprio visto que participa da composição acionária de empresas como Aracruz Celulose e Suzano Bahia Sul.

Este mesmo setor, recordista em repasses do banco, que já recebeu R$6,861 bilhões entre 1985 e 2005, será agraciado com mais 11,7 bilhões até 2010. E não está sozinho: na crescente área de biocombustíveis, os recursos aplicados pelo BNDES já chegam a R$3,3 bilhões e devem receber mais 10 bilhões no mesmo período.

Enquanto isso, a agricultura familiar e os assentamentos da Reforma Agrária penam para conquistar políticas de desenvolvimento que gerem renda para as famílias e alimentos saudáveis para a população.

Nós, do MST e da Via Campesina, lutamos pela soberania alimentar e contra o agronegócio. Denunciamos a degradação ambiental causada pela expansão das lavouras de cana-de-açúcar, das plantações de eucalipto e do cultivo de soja. Alertamos para a atuação da empresa Aracruz Celulose, condenada no Espírito Santo por expulsar e promover o preconceito contra indígenas e quilombolas e por desmatar áreas de Mata Atlântica, destruindo a biodiversidade e os recursos naturais.

Viemos ao BNDES para apontar os equívocos que têm norteado os investimentos do banco e reivindicar a criação de linhas de financiamento verdadeiramente voltadas para o desenvolvimento econômico e social dos assentamentos da Reforma Agrária e da agricultura familiar.

Por fim, queremos exigir o cumprimento do acordo firmado em 2005, quando a Marcha Nacional pela Reforma Agrária reuniu mais de 12 mil pessoas em Brasília. Naquela ocasião, o BNDES se comprometeu a disponibilizar R$ 10 milhões para projetos da Reforma Agrária que não foram liberados até hoje.

Se hoje ocupamos este prédio é porque, apesar das diversas reuniões realizadas, hoje não há qualquer projeto em andamento no banco voltado para a Reforma Agrária.

Queremos então reivindicar que sejam assegurados os 10 milhões prometidos e que seja proposto um modelo de apresentação e análise de projetos acessível para os assentados, garantindo assim a participação do BNDES no combate à fome, na geração de empregos e renda e na inclusão social.