Comissão do Congresso defende usinas do Rio Madeira
André Barrocal e Verena Glass
Agência Carta Maior
Às vésperas da semana mundial do meio ambiente, a comissão do Congresso que discute o impacto do aquecimento global sobre o Brasil e políticas públicas que ajudem a contornar o problema prepara-se para votar um relatório parcial que defende, de forma discreta, a construção de usinas hidrelétricas no Rio Madeira (RO).
Segundo o parecer, o país precisa continuar privilegiando geração de energia hidrelétrica, porque os combustíveis fósseis são os grandes vilões das mudanças climáticas – apesar de, no Brasil, três quartos da emissão de gases originar-se de desmatamentos e só um quarto, da queima de combustíveis fósseis; em outros países, a situação se inverte.
Setores do governo acreditam que, sem as usinas do Rio Madeira, será necessário recorrer a outras fontes de energia, como gás, para garantir o abastecimento nos próximos anos. Para a Comissão Mista Especial sobre Mudanças Climáticas, a alternativa termeletricidade tem de ser descartada.
“A comissão preocupa-se com a manutenção da participação percentual das fontes renováveis na matriz energética brasileira”, diz o relatório, que deve ser votado nesta terça-feira (29). “Neste contexto, ganham especial destaque, entre outras, as discussões sobre o licenciamento ambiental e da construção de novas usinas hidrelétricas, em especial as do rio Madeira.”
Políticas públicas
A defesa da hidroeletricidade é só uma das políticas públicas sugeridas pelo primeiro relatório do senador Renato Casagrande (PSB-ES) – está previsto outro parecer preliminar para outubro e o final, para dezembro; todas as versões serão encaminhadas ao governo, às Presidências da Câmara e do Senado e aos estados.
O documento também recomenda aprovar diversos projetos que estão no Congresso, condena o governo federal por não apoiar pesquisas científicas sobre mudanças climáticas, pede prioridade à educação ambiental e diz que falta ao país mobilização para enfrentar o problema – embora não diga por culpa de quem.
Entre os projetos de caráter genérico cuja aprovação é defendida, estão o que institui uma Política Nacional de Mudanças Climáticas, com recursos para iniciativas que ajudem a mitigar os efeitos do aquecimento global. E outro que dá isenções fiscais para empresas que tenham projetos de mecanismos de desenvolvimento limpo (MDL) que colaborem para o país obter créditos no mercado internacional de carbono.
Para combater o desmatamento, principal causa da emissão de gases no país, sugere aprovar um projeto que obriga o poder público a exigir certificado de legalidade da madeira em licitações de compra de madeira ou produtos derivados e outros dois que criam fundos: um para financiar o desenvolvimento sustentável na Amazônia Ocidental, mais protegida de desmatamentos, outro para financiar estados que possuem unidades de conservação de natureza ou terras indígenas.
Para controlar a queima de combustíveis fósseis, o relatório recomenda aprovar um projeto que obriga todos os veículos a passar por inspeções de controle de emissão de poluentes e receber licença ambiental para trafegar.
Negligência federal
O relatório também cobra mais apoio para pesquisas científicas que preparariam melhor o país para identificar impactos do aquecimento global e apontar adaptações necessárias. Tais atividades seriam negligenciadas pelo governo, o que foi criticado no texto. De 2001 a 2006, os gastos totais do governo federal dobraram, mas, informa o relatório, o orçamento do Instituto Nacional de Meteorologia (Inmet) encolheu 29%. O Instituto Nacional de Pesquisa da Amazônia (Inpa), 56%. E do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), 16%.
“Esses centros de pesquisa vêm passando por sucessivos contingenciamentos, o que prejudica muito a capacidade do país de se preparar para as alterações climáticas que já vêm ocorrendo”, diz o documento. “Percebemos claramente que as pesquisas para mitigar os efeitos das mudanças climáticas, bem como adaptar o Brasil à nova situação, ainda não são prioridades do governo.”
Fontes alternativas
Para o movimento ambientalista, a opção entre hidroeletricidade e fontes poluentes, como termoelétricas e energia atômica, apresentada pelo governo, é uma falácia que beira à chantagem. Segundo Marcelo Furtado, diretor de políticas públicas do Greenpeace, o discurso “ou as hidrelétricas do Madeira ou Angra 3” adotado até pelo presidente Lula seria duplamente falso, já que não apenas existiriam outras alternativas, como as duas, Madeira e Angra 3, estão na lista de prioridades do Planalto e não são excludentes.
Antes da reunião da Comissão Mista Especial sobre Mudanças Climáticas do Congresso, o Greenpeace apresentou aos parlamentares um resumo do conceito global de revolução Energética, fruto de um estudo elaborado pela entidade em parceria com o Conselho Europeu de Energia Renovável e com especialistas da Agência Espacial Alemã. O estudo detalha como gerar energia a um preço justo e promover crescimento econômico, bem como cortar emissões globais de CO2 em 50% até 2050, usando tecnologia limpa.
O problema maior do debate energético do ponto de vista político, segundo os ambientalistas, é que projetos que priorizam fontes alternativas de geração de energia tem sido ou menosprezadas ou distorcidas pelo governo. A discussão sobre eficiência no uso e geração de energia, por um lado – que inclui projetos como a repotenciação das hidrelétricas mais antigas e a manutanção da rede de transmissão, que hoje causa perdas superiores a 15% de toda energia gerada no país -, e a adoção de fontes limpas, são descartadas ou taxadas como caras.
“Se contabilizados todos os gastos e custos das fontes tradicionais de geração e das alternativas, e se retirados os subsídios praticados hoje, os valores se equivalem. O desperdício no Brasil hoje está por volta de 40%. Poderíamos, então criar usinas virtuais só com a economia que fazemos em nossa casa ao trocar, por exemplo, uma lâmpada incandescente por uma lâmpada fluorescente”, diz Furtado.