Mais de 300 entidades apoiam desapropriação da Syngenta

Mais de 300 entidades civis do Brasil e do exterior enviaram manifestações de apoio ao governador Roberto Requião pela desapropriação da área de cultivo ilegal de soja e milho transgênicos, dentro da zona de amortecimento do Parque Nacional do Iguaçu, Oeste do Paraná, que guarda uma das maiores riquezas da biodiversidade do mundo: as Cataratas do Iguaçu.

Segundo o agrônomo Valdir Izidoro Silveira, presidente da Claspar e especialista em produtos geneticamente modificados, “enquanto a Syngenta desafia, com arrogância e apostando na impunidade, a legislação do povo brasileiro, ao tentar, através de manobras jurídicas, retomar área de cultivo ilegal de transgênicos no Paraná, entidades civis nacionais e internacionais condenam a empresa e apóiam a decisão do governador Roberto Requião em manter a desapropriação do espaço de experimentos”.

“Se a Syngenta fizesse o que fez aqui em Bettingen, área rural de Basel, onde fica sua sede principal na Suíça, todos os seus administradores estariam na cadeia”, afirmou Silveira. Ele ainda argumentou que “desenvolver experimentos perigosos para o meio ambiente – e à saúde humana – em outras áreas, que representem riscos para outros povos e não para seus compatriotas, é a estratégia da Syngenta, que agora faz de tudo
para manter este privilégio”.

Silveira ressalta que “a biotecnologia é muito importante para a Syngenta. Entre 2001 e 2002, a empresa foi responsável pela maior contaminação genética da história, quando vendeu ilegalmente sementes transgênicas de milho BT10 aos agricultores nos Estados Unidos. Este milho transgênico entrou nos sistemas alimentares dos humanos e de animais”.

Para o agrônomo, “a decisão do governador Requião foi considerada como um perigoso precedente pelos barões do agronegócio e pelos senadores e deputados da bancada ruralista. Realmente pode ser um precedente, um exemplo para a luta pela soberania de nossa agricultura que tem de lutar contra aqueles que estão ao lado dos interesses das multinacionais”.

Ele ressalta que “a Syngenta também é líder no desenvolvimento da ‘Tecnologia Terminator’, (semente suicida) um processo de engenharia genética que torna sementes estéreis numa tentativa de forçar os agricultores a sempre comprarem suas sementes, em oposição à prática camponesa de selecionar, cuidar e compartilhar sementes livremente.

Apoio

A cientista britânica Mae-Wan Ho, considerada uma das mais respeitadas autoridades em Biologia do mundo, manifestou seu apoio integral à desapropriação da área da Syngenta, localizada a 6 quilômetros do parque. “Eu represento um grupo de cientistas independentes que trabalham para promover a ciência como um bem público, expondo a má ciência realizada por corporações de biotecnologia, como a Syngenta, que vem contribuindo para os efeitos devastadores que corroem o mundo. Nós apoiamos a iniciativa do governador Requião de questionar os experimentos ilegais e transformar o espaço em uma escola de agrotecnologia”, disse.

Para Isabel Bermejo, representante do Ecologistas en Acción de Madrid, é vergonhoso que a empresa não tenha pago a multa do Ibama, e ainda pressione o governo do Paraná para enviar forças militares para expulsar as famílias que ocupam a área. “Como cidadãos, exigimos que a Syngenta reconheça seu erro e pague a multa que ela deve. Esperamos que ela permita que o governo possa transformar esta área em uma escola de agroecologia”, acrescentou.

Entre as manifestações de apoio recebidas pelo governador, estão as de Graham Lingley, de Cambridge, Inglaterra; Jonh F. Kenfield do Rutgers University em New Jersey, USA; Edivande Freitas, diretor da Câmara Municipal de Mariluz, Paraná; Luiz de Lima, prefeito municipal de São João do Triunfo, Paraná; Grupo Hope Shand dos EUA; Roderick Taylor de Ottawa, Canadá; Kelly O’Neil, United States of America Citizen; Devindr Sharma e Bhaskar Goswami, Forum for Biotechnology and Food Security, Nova Deli, Índia; Ivor Hughes, CEO Herbdata, Nova Zelândia; Despina Psarra, University of Leeds, Inglaterra; Munlochy Vigil , Inglaterra; Pablo Bratte, Austrália; Natalia Arnáiz Martinz, do Centro Regional de Formacion Profesional Ecológica de León na Espanha; Jorge Gonzales, do Grupo de Estudios Ambientales, no México; José Merino, Presidente de la Asociación La Paz es Posible, em Málaga, Espanha; Secretaria Regional Latinoamericana-União Internacional de Trabalhadores da Alimentação e Agrícolas.

Contaminação

O assessor da Cáritas brasileira, do Fórum de Pastorais Sociais (CNBB) e de movimentos sociais, Ivo Poletto, também manifestou seu apoio à desapropriação da área da Syngenta. “A atitude do governo do Paraná está contribuindo para evitar que nossa pátria seja contaminada por sementes e produtos que colocam em risco a saúde das pessoas”.

“Nós acompanhamos de perto a situação dos experimentos ilegais que a Syngenta mantém no Brasil. É uma vergonha que a empresa ainda não tenha pago a multa ao Ibama e, ainda por cima, pressione o governo do Paraná para mandar força policial para retirar 120 famílias da área em que moram”, afirmou Isaac Rojas, da Instituição Friends of Earth, da Costa Rica.

Luta

As implicações do decreto de desapropriação do campo experimental da Syngenta são significativas para os movimentos sociais e para os interesses transnacionais e brasileiros do agronegócio. A decisão do Estado do Paraná em desapropriar a terra de uma empresa transnacional do agronegócio é sem precedentes no Brasil, e em todo o mundo.

“O decreto deu um golpe no agronegócio, abalando seu poder no país. É também é um ganho muito importante para os movimentos sociais. Por todo o mundo, a ocupação da Syngenta, pela Via Campesina, se tornou um dos símbolos mais poderosos da capacidade da sociedade civil resistir e enfrentar o agronegócio”, explica Valdir Izidoro.

Segundo Maria Rita Reis, advogada da Terra de Direitos, “o decreto é totalmente legal, porque o poder público no Brasil tem a possibilidade de desapropriar qualquer coisa desde que exista interesse público. Até mesmo o município pode desapropriar. No Brasil, tanto o município ou o estado, ou a união federal podem utilizar a desapropriação”.

Segundo Izidoro o poder combinado da Syngenta e o agronegócio brasileiro ameaça bloquear a implementação do decreto. “A Syngenta jurou resistir ao decreto e formou uma aliança política estratégica com a bancada ruralista, um grupo de parlamentares federais e estaduais representando os interesses da elite rural brasileira”, disse.

Os membros da bancada ruralista e o agronegócio transnacional estão determinados em manter o modelo econômico dominante de produção agrícola para exportação, do que, os dois grupos derivam seu poder. “Porque o decreto de Requião fortaleceria a oposição contra este modelo de produção agrícola, a bancada ruralista tem fortes interesses em seu bloqueio”, completou

A multinacional de sementes Syngenta Seeds não possuía as licenças ambientais exigidas pelo Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) para realização de testes com transgênicos em fazenda localizada em Santa Teresa do Oeste, no Oeste do Paraná.

Segundo Walter Santos Filho, chefe do Ibama na região, a empresa entregou apenas uma autorização da Comissão Técnica Nacional de Biossegurança (CTNBio) para a manipulação e pesquisa de milho transgênico nas fazendas experimentais do Paraná e de Uberlândia (BH). Mas não enviou ao Ibama licenças do projeto, de instalação da fazenda e de operação das atividades. A organização não-governamental paranaense Terra de Direitos contestou a regularidade da autorização da CTNBio.

Agroecologia

O Governo do Paraná decidiu desapropriar a área de 127 hectares para instalar um centro de agroecologia. A Syngenta plantava soja e milho transgênicos na estação de pesquisas, o que desrespeita a lei brasileira, pois a fazenda fica dentro da zona de amortecimento do Parque Nacional do Iguaçu. Estudos apontam que plantações de transgênicos estão contaminando de forma irreversível as lavouras convencionais.

A Syngenta já foi multada em R$ 1 milhão em março do 2006 pelo Ibama, que constatou o plantio de transgênico na estação de pesquisas, que fica na zona de amortecimento do Parque Nacional do Iguaçu, uma faixa de dez quilômetros contada a partir dos limites da reserva. A multinacional ignorou a autuação do Ibama. Não recorreu da decisão nem pagou a multa. Por causa do plantio irregular de transgênicos, a estação de pesquisas foi invadida por integrantes da Via Campesina.

Em março de 2006, o Ibama fez uma vistoria na vizinhança do Parque Nacional do Iguaçu e constatou o plantio de transgênicos em outras 13 propriedades, além da Syngenta. Todas foram multadas. Os proprietários de 13 fazendas recorreram e a Justiça Federal confirmou as multas.

A desapropriação da estação de pesquisas da Syngenta baseia-se em critérios técnicos. O decreto estadual 7.487/06, que trata da desapropriação da fazenda, deixa claro os fundamentos jurídicos da medida.

O decreto cita o artigo 23 da Constituição Federal, que outorga aos Estados competência para proteger as paisagens naturais notáveis e o meio ambiente, combater a poluição em qualquer de suas formas e preservar as florestas, a fauna e a flora.

Além disso, a área foi identificada tecnicamente pela Secretaria da Agricultura como o local ideal para instalar o centro de agroecologia, cuja criação e atribuições foram aprovados pela Assembléia Legislativa em dezembro do ano passado. Como qualquer desapropriação, ela implica no pagamento da justa indenização pelo governo estadual.

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Fonte: Agência Estadual de Notícias 05/06/07