Agrocombustíveis: plantio em pequena escala é a alternativa

Produção conduzida por pequenos produtores é a alternativa para a produção de energia de matriz vegetal. Pelo menos essa é a idéia defendida por muitos pesquisadores e pelos movimentos sociais que compõem a Via Campesina. O assunto é tema do ciclo de debates “Agroenergia no Brasil, suas potencialidades e desafios”, que pretende levar esse tema para algumas regiões do país.

Para Frei Sérgio Antônio Görgen, da Via Campesina, a agroenergia traz uma mudança estrutural para a sociedade, por isso o assunto não pode ser encarado sem a apresentação de alternativas práticas. Segundo ele, o Brasil conta com as quatro características que o fazem protagonista na produção de bioenergia: solo fértil, mão-de-obra e reservas de água bem distribuídas, e clima, já que o Brasil é o país tropical de maior território atingido pelo sol.

Para Görgen, é preciso levar em conta algumas questões. Uma delas é não deixar que o cultivo para a produção de agrocombustíveis venha a substituir a produção de alimentos. Para ele, o controle dos trabalhadores do campo sobre a produção deve ser completo. “O agricultor não pode produzir matéria-prima sem um valor agregado, é preciso controlar o máximo possível da cadeia produtiva, agregando outras forças”, diz.

Como mediador do debate, que aconteceu em Cascavel, na quinta-feira, dia 12, João Pedro Stedile, do MST, expôs que a urgência da agroenergia surge da compreensão de que as reservas de petróleo estão cada vez mais escassas. Hoje, o valor do barril de petróleo está na casa dos U$ 70 dólares (cerca de R$ 150 reais), mas pode subir para U$ 100 dólares em um futuro próximo. Ele ressaltou também o processo de conscientização da opinião pública de que o atual modelo de produção e consumo de energia é ecologicamente inviável.

Stedile fez uma leitura dos projetos que estão em disputa em torno da agroenergia. Alguns deles trazem riscos para a produção dos pequenos agricultores, outros podem explorar o potencial e a viabilidade desta forma de produção. Por exemplo, a produção de energia pode se dar em parceria entre os pequenos agricultores e a Petrobrás. Outra proposta seria uma pequena usina sob o controle dos camponeses, organizados em cooperativas.

Acrescentou também a possibilidade de a produção feita a partir de micro-usinas familiares, nas quais a geração de energia elétrica se dá ali mesmo, de modo racional e integrado com os cultivos e com a produção de óleos vegetais. Por fim, Stedile apontou uma demanda simbolizada pelo engenheiro físico Bautista Vidal. Esta proposta dá conta da criação de uma empresa estatal de agroenergia. Ficou claro ao longo de todas as exposições que a agricultura familiar possui um modelo de produção alternativo para a agroenergia, mas isto só vai acontecer se houver programas governamentais de apoio a esta produção, que não pode estar submetida às leis do mercado.

De acordo com o representante da Petrobras, Cláudio Dode, também presente no debate, o programa da estatal para o biodiesel está focado em parcerias com a agricultura familiar, a partir da decisão das comunidades. Os projetos da empresa estão pensados para os policultivos, e não para a monocultura. Segundo Dode, a agroenergia incentivada pela estatal tem que se dar dentro de um projeto de emprego e renda, e a produção de óleo vegetal não pode estar afastada do pequeno produtor. O representante da Petrobras afastou a possibilidade de trabalhar com os cultivos transgênicos. “Nos programas em que o agricultor fornece matéria-prima para ser industrializada, a base do projeto é a agroecologia”, comentou.

Os riscos do canavial

Já o engenheiro agrônomo e pesquisador Horácio Martins, falou sobre a expansão da cana-de-açúcar no Brasil. De acordo com o pesquisador, o número de projetos de usinas atualmente é de 189, sendo que 77 delas já estão autorizadas.

A preocupação ressaltada pelo engenheiro agrônomo é a de que a produção agrícola para a matriz vegetal seja feita voltada para a exportação. Segundo ele, a safra de 2007/2008 vai produzir R$ 20 bilhões de litros de álcool, com o objetivo de fornecer a mistura de 25% de álcool exigido na gasolina. Mesmo assim, a maior parte da produção será destinada para a exportação.

Para Martins, a inviabilidade do atual modelo de sociedade exige formas alternativas de produção e consumo. “Necessitamos uma nova concepção de sociedade, romper com esta concepção individualista, temos que mudar o modelo de referência europeu e norte-americano. Precisamos de governos populares e, na base, os camponeses podem produzir a sua autonomia, por meio de pequenas e médias usinas. O camponês tem que acreditar que ele é viável como produtor”, afirma Martins.

O ciclo de debates “Agroenergia no Brasil, suas potencialidades e desafios” é uma iniciativa da Via Campesina em parceria com o jornal Brasil de Fato, com patrocínio da Petrobras. O segundo evento está agendado para o dia 18 de julho, em Belo Horizonte (MG). O objetivo é levar até às bases dos movimentos sociais no campo e também para a sociedade o tema da agroenergia, os projetos e a disputa de classes que caracterizam o assunto.

Fonte: Pedro Carrano – Brasil de Fato