Famílias bloqueiam estrada para impedir construção da barragem Baguari em MG

Cerca de 200 famílias bloquearam na madrugada desta terça-feira, dia 16, a estrada que dá acesso ao canteiro de obras da hidrelétrica e barragem de Baguari, no município de Governador Valadares, Minas Gerais. O bloqueou começou por volta das 4 horas da madrugada. As famílias estão a cerca de 1 quilometro das obras. O objetivo da ação é impedir o acesso dos trabalhadores ao canteiro e assim paralisar as obras.

De acordo com o padre José Leão, da Via Campesina, a ocupação o fechamento do acesso ao canteiro continuam por tempo indeterminado até que haja negociações com representantes dos governos estadual e federal e as reivindicações sejam atendidas. As famílias querem a interrupção da construção da usina hidrelétrica e sua barragem e o arquivamento do projeto; o assentamento das famílias e a realização da Reforma Agrária na região e indenização de todas as famílias atingidas por barragens.

A manifestação também exige a mudança no modelo energético, com diversificação do modelo e uso sustentável e novas formas de energia, como solar, eólica, biodigestor e outras formas alternativas e ecológicas. As famílias também exigem a realização do projeto do Atlas Nordeste, da ASA, que prescreve a realização de 530 obras para beneficiar 34 milhões de pessoas de 1.150 municípios de todo o Nordeste, do norte de Minas e Vale do Jequitinhonha, sepultando dessa forma o projeto de Transposição do Rio São Francisco. Contra o modelo de monocultivo, os manifestantes também exigem que órgãos públicos façam uma revisão do licenciamento de todos os projetos de monocultivo eucalipto, já que o Deserto Verde se expande a passos largos em Minas Gerais.

Ação Civil

O Ministério Público Federal (MPF) pediu à Justiça que suspenda obras de construção da Usina Hidrelétrica de Baguari. No dia 23 de janeiro de 2007, perante a 1ª Vara da Justiça Federal em Governador Valadares, o MPF ajuizou a Ação Civil Pública com pedido de liminar contra o Estado de Minas Gerais, o Consórcio Baguari e o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente-IBAMA. Na ação, o MPF pede a imediata paralisação de quaisquer obras ou serviços relativos à implantação da usina hidrelétrica de Baguari e, em especial, que o Ibama atue no licenciamento ambiental, bem como seja cumprida a Lei federal nº 11.428/2006, impedindo a supressão de Mata Atlântica pelos empreendedores.

A Usina de Baguari irá explorar o potencial hidráulico do Rio Doce em trechos situados nos municípios mineiros de Alpercata, Fernandes Tourinho, Governador Valadares, Periquito, Sobrália e Iapu. Conforme o artigo 20, III, da Constituição Federal, o Rio Doce insere-se entre os bens da União, já que seu curso se estende por mais de um estado da Federação, mais especificamente Minas Gerais e Espírito Santo. No entanto, a Licença Prévia Ambiental foi expedida por órgão estadual, o Conselho de Política Ambiental (Copam), e não pelo órgão que, sustenta o Ministério Público, seria competente para tal fim – o Ibama.

Segundo o MPF, deve-se lembrar que “em trecho de pequena extensão do Rio Doce há três hidrelétricas, quais sejam, a Usina Hidrelétrica de Mascarenhas, que teve sua capacidade de geração de energia ampliada em torno de 40% em julho último; a Usina Hidrelétrica de Aimorés, que recentemente teve o consórcio responsável pelo empreendimento multado em 400 mil reais por descumprimento de condicionantes, e, agora, a Usina Hidrelétrica de Baguari. Forçoso reconhecer, portanto, que o Estudo de Impacto Ambiental deveria ter melhor se debruçado sobre os efeitos, em tão pequeno trecho, da confluência de três empreendimentos de tal porte, respeitando o disposto na Res. 01/86 do Conama”.

Ao contrário disso, a própria Procuradoria da FEAM – órgão técnico de apoio às decisões políticas do Copam -, em resposta à Recomendação feita pelo MPF, afirmou que “sem proceder a qualquer planejamento de uso da bacia em referência, a União, por meio da ANEEL, deu a concessão para a construção no exato local onde o empreendedor planeja construir a hidrelétrica e, o que é pior, a ANA, maior responsável pela gestão das águas federais, deu a outorga de uso para o mesmo empreendedor – aí é nítido o sentido de propriedade da União. O bem foi visto apenas do ponto de vista econômico e financeiro e não como bem comum de uso do povo e essencial à sadia qualidade de vida”.

A competência do Ibama se estabelece, pois, não só pelo fato de o rio pertencer ao domínio da União, mas também pela peculiaridade do trecho em que se encontra a Usina Baguari (três usinas distintas em distância de aproximadamente 150 km).

O MPF considera que o Copam teria falhado em dois momentos: na concessão da licença prévia e na concessão da licença de instalação ocorrida em dezembro último. Não bastasse isso, não se pode ignorar a presença do bioma mata atlântica na área de influência e de alagamento da usina. Há, no Rio Doce, uma ilha de nome Bonaparte onde se pode encontrar 16 hectares de floresta com características atlânticas primitivas. O EIA-RIMA apontou que a “implantação do empreendimento causará impactos bastante expressivos, irreversíveis e de grande magnitude sobre as populações faunísticas da ilha, principalmente para as comunidades de aves coloridas, inclusive de espécies presumivelmente ameaçadas de extinção e raras, que utilizam a ilha como sítios reprodutivos e alimentares.”

Fica evidente, assim, o interesse nacional, e, portanto, da União, na preservação da ilha, o que fundamenta a intervenção do Ibama no licenciamento, órgão, aliás, responsável pela autorização, ou não, da supressão desse tipo de vegetação.

O MPF ressalta a importância da nova lei protetora da Mata Atlântica, sancionada pelo presidente da República no final de 2006 e saudada pela comunidade internacional como um grande avanço na preservação das florestas brasileiras. Essa lei proíbe por completo a supressão da vegetação primária de mata atlântica que abriga espécies de flora e fauna silvestres ameaçadas de extinção, desde que a intervenção ponha em risco a sobrevivência dessas espécies.

Por todos esses fatos, e considerando que a instalação da usina de Baguari, por sua própria natureza, possui considerável potencial danoso ao meio ambiente ecologicamente equilibrado e risco de lesão irreparável ao patrimônio ambiental e social de toda a região, o MPF pede a intervenção imediata do Poder Judiciário para afastar os efeitos do licenciamento ambiental indevidamente concedido pelo Copam, declarando-se a nulidade dos seus atos e a subseqüente competência do Ibama para conduzir o processo de licenciamento.

A ação também faz parte da Jornada Internacional Contra as Transnacionais, realizada pela Via Campesina, da qual fazem parte o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), a Comissão Pastoral da Terra (CPT), o Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB), o Movimento dos Pequenos Agricultores (MPA), a CÁRITAS, o Centro de Agricultura Alternativa (CAA), e a Federação dos Estudantes de Agronomia do Brasil (FEAB). A ação também tem como objetivo debater com a sociedade as conseqüências do agronegócio e da construção da hidrelétrica de Baguari, com sua barragem, no rio Doce, em Governador Valadares. Mostrando que ambos fazem parte do projeto neoliberal que passa pelo hidronegócio e agronegócio. Tratam a água, não como um bem comum, mas como mercadoria. Assim pisoteiam os direitos humanos e sociais e agridem covardemente o meio ambiente.