Trabalhadores protestam contra monocultura em PE
Começou nesta terça-feira a Jornada Nacional de Luta da Via Campesina Brasil. Agricultores e agricultoras de todos os Movimentos que fazem parte da Via Campesina estão se mobilizando em todo o país por trabalho, alimento, um novo modelo agrícola e soberania nacional.
Em Pernambuco, as ações da Via Campesina se concentrarão na luta contra o avanço do monocultivo de cana-de-açúcar na Zona da Mata e contra o avanço do agronegócio no Sertão do São Francisco, impulsionado pelos grandes projetos de irrigação como o projeto de transposição do Rio São Francisco e o Pontal Sul, em Petrolina.
Cana-de-açúcar X alimentos
Na madrugada de hoje (10/06) cerca de 200 trabalhadores rurais da Via Campesina ocuparam a Estação Experimental de Cana-de-Açúcar (EECAC), no município de Carpina, Zona da Mata Norte de Pernambuco. Os agricultores protestaram contra o avanço do monocultivo de cana-de-açúcar no local, que tem aumentado ainda mais a miséria e a concentração de terra numa região que já sofre com a pobreza e a opressão do trabalho nos canaviais.
Durante a ocupação os agricultores destruíram mudas de variedades de cana, inclusive espécies transgênicas, e cortaram cerca de dois hectares dos 100 de cana-de-açúcar plantados na Estação. A Estação Experimental é uma Parceria Público-Privada entre o Sindaçúcar – Sindicato da Indústria do Açúcar e do Álcool no Estado de Pernambuco, que reúne as 20 maiores usinas do Estado – e a Universidade Federal Rural de Pernambuco. Com 250 hectares, a área poderia assentar cerca de 50 famílias Sem Terra e produzir alimentos para abastecer as feiras da região. Ao invés disso, ela é usada para desenvolver pesquisas de variedades de cana voltada para o setor privado, em especial para a produção em larga escala.
Ao invés da Universidade Federal Rural – uma universidade pública – investir o dinheiro público em pesquisas que promovam o aumento da produção e a diminuição dos custos dos alimentos, beneficiando assim, não só os camponeses, mas toda a população brasileira, a universidade investe o dinheiro do povo em pesquisas para promover o monocultivo de cana-de-açúcar para o mercado externo. Um dos responsáveis pela elevação dos preços dos alimentos, pelo maior índice de trabalhadores em condições análogas a escravidão e pelo grande número de empresas estrangeiras que compram terras em nosso país.
A Zona da Mata Pernambucana já está tomada pela cana-de-açúcar. Dados do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) mostram que 98% das terras de lavouras temporárias da Mata Norte de Pernambuco são usadas para a produção de cana-de-açúcar, e apenas 2% para a
produção de alimentos. Com o aumento da demanda do mercado internacional por agrocombustíveis, mais terras são usadas para plantação de cana, cai a produção dos alimentos, que ficam mais caros para a população. Em São Paulo, a cana substituiu lavouras de feijão, alimento que dobrou de preço nos últimos meses. Produtos agrícolas representaram 40% da inflação, como a soja, o milho e carne bovina em 2007. Além disso, a demanda internacional tem reflexos nos preços dos alimentos no país.
Os impactos ambientais do monocultivo são negativos e este não tem condições de enfrentar o aquecimento global. O modo de produção vigente usa muita água, polui rios, utiliza fertilizantes nitrogenados em grandes quantidades e provoca queimadas.
Agronegócio X Alimentos
No Sertão da Bahia, agricultores da Via Campesina de Pernambuco e Bahia ocuparam a barragem da usina de Sobradinho. Os agricultores protestam contra o modelo de desenvolvimento que vem
sendo implantado na região, simbolizado por grandes projetos de irrigação para o agronegócio como o projeto de transposição do Rio São Francisco, o Pontal Sul, em Petrolina, e o Projeto Salitre, na cidade vizinha de Juazeiro, na Bahia.
Tais projetos revelam um modelo de desenvolvimento que mantém a lógica colonialista de colocar nossas terras a serviço dos interesses do mercado internacional. Depois de altíssimo investimento publico em infra-estrutura de irrigação (no caso do Pontal Sul já foram investidos cerca de 250 milhões de reais), essa estrutura é privatizada através de acordos de Parceria Publica Privada (PPP). As terras, a água e toda a infra-estrutura é passada para as mãos de grandes empresas do agronegócio, que produzem para o mercado externo. Existe até acordos para a produção de cana de açúcar em larga escala na região desses projetos de irrigação.
Os pequenos agricultores e agricultoras que vivem no entorno desses projetos servirão de reservatório de trabalhadores mal remunerados à serviço das empresas de agronegócio. E os que hoje são pequenos agricultores se tornarão futuros Sem Terra, bóia-frias, desempregados ou até mesmo, cortadores de cana, vivendo sob as condições desumanas que o povo da Zona da Mata de Pernambuco conhece tão bem.
Ao contrário do que prega a propaganda oficial, esses projetos não só não levarão água para a população do Sertão, como afetarão negativamente o abastecimento de água ao público da região. A agricultura irrigada intensiva afeta diretamente o abastecimento de
água à população porque diminui a quantidade de água disponível.