Assentamento modelo completa 15 anos no Paraná
Por Solange Engelmann
O MST do Paraná está em clima de festa. Este sábado (12/07) será uma data especial, em que os trabalhadores acampados e assentados do estado comemoram 15 anos de fundação de uma cooperativa modelo em produção e trabalho coletivo na área de Reforma Agrária, a Copavi (Cooperativa de Produção Agropecuária Vitória Ltda), localizada no assentamento Santa Maria, município de Paranacity, na região noroeste do Paraná.
A comemoração terá início às 9h, com seminário sobre Cooperação, Agroecologia e Agroindústria na Reforma Agrária. Às 11h, ocorre o Ato Político Comemorativo, com a presença de autoridades, amigos do MST e Sem Terra de todo o Estado. Ao meio dia haverá churrasco e à tarde uma visita às instalações do assentamento.
A Copavi se tornou referência para os assentamentos do MST, pela experiência de produção coletiva, sem a propriedade privada e individualizada da terra. Para o Incra (Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária), a cooperativa é considera um dos 10 assentamentos mais bem sucedidos do Paraná.
No modelo de sociedade e agricultura sustentado pelas 23 famílias que integram a cooperativa, os aspetos que se destacam são a garantia de vida digna para as pessoas, a produção de alimentos e o respeito ao meio ambiente.
Jacques Pellenz, presidente da Copavi diz se orgulhar em fazer parte de uma sociedade coletiva que deu certo e conta que a experiência do assentamento mostra à sociedade que a Reforma Agrária é viável e proporciona uma grande diversidade na forma de produzir e se relacionar. “A comunidade local, que a princípio ficou bastante apreensiva com a presença dos Sem Terra no município, hoje demonstra um grande apoio e apreço ao perceber que realmente a Reforma Agrária dá certo, e é uma necessidade social para o desenvolvimento econômico da maior parte da população brasileira”, declara.
A experiência de trabalhar e viver em coletivo é uma das formas mais complexas de cooperação que vem sendo praticada no MST, fazendo com que as pessoas sejam mais solidárias. “Essa forma organizativa exige mais das pessoas, nas relações pessoais. Como fomos criados na vivência individual, no coletivo é preciso fazer a mudança ‘do meu para o nosso’. Mas, este sistema ajuda todos a se educarem juntos, além de elevar o nível de consciência do ser humano, dar mais autonomia a mulher, aos jovens e crianças”, ressalta Jacques.
A Copavi foi fundada em 10 de julho de 1993, e conta com uma área de 106 alqueires, que fica à cerca de 1 km da cidade, onde o trabalho é feito de forma coletiva. Tudo funciona através da divisão de tarefas e está organizado por setores de produção. As decisões mais importantes são tomadas com a participação de todos, em Assembléia Geral.
As famílias moram próximas uma das outras, em forma de agrovilas. As casas, que recentemente passaram por reformas têm energia elétrica e água encanada. Além do trabalho produtivo, as refeições de café da manhã e almoço também ocorrem de forma coletiva, de segunda à sexta-feira, em um refeitório comunitário. À noite e nos finais de semana, as alimentações são feitas na casa de cada família.
Produção
Os assentados vêm trabalhando para converter toda a produção em sistemas agrocológicos. A produção de gado de leite é a última que se encontra em fase de transição para a agroecologia, os outros setores produtivos já funcionam neste modelo. A produção está organizada em grandes linhas como: leite e derivados; frangos, suínos e derivados; cana-de-açúcar e derivados; e produção de hortaliças agroecológicas.
A opção pela forma de produção que respeita o meio ambiente e melhora a qualidade de vida dos assentados também é uma forma de resistência e combate ao modelo do agronegócio, baseado no monocultivo de grandes extensões de terras, na destruição do meio ambiente e na superexploração dos trabalhadores rurais. “A Copavi sempre procurou desenvolver suas atividades da forma mais natural e menos nociva ao meio ambiente, a natureza e à saúde humana, por isso tem orgulho de ter a atividade de hortaliças totalmente agroecológica, sem utilizar nenhum tipo de produto químico ou tóxico”, explica Jacques.
Na Cooperativa são produzidos mensalmente 24 mil litros de leite pasteurizado e comercializado em saquinhos. Uma parte é transformada em doce de leite, queijos e iogurte. Para a industrialização foi construído um Mini-Laticínio, com capacidade diária de 3.000 litros de leite. Também são produzidos mensalmente cerca de 2.000 kg de melado, 25 mil kg de açúcar mascavo, além de uma produção anual de 13 mil litros de cachaça artesanal da marca “Libertação” e “Camponeses”. Em uma área de aproximadamente 1,5 alqueires são cultivados, a cada mês, cerca de 8,6 mil kg de diversas hortaliças e legumes agroecológicos.
A receita bruta da Copavi gira em torno de R$ 715 mil ao ano. A venda dos produtos é feita diretamente ao consumidor e em feiras, nos municípios mais próximos. Alguns alimentos são comercializados em redes de supermercados da região. A cachaça artesanal, além de ser vendida em vários locais do Brasil, é exportada para a França e Espanha, representando 5% da receita da cooperativa.
No entanto, a produção não é voltada somente para o abastecimento do mercado local, regional e internacional. Para o auto-consumo, são produzidos por mês cerca de 200 quilos de frango, 350 quilos de suínos e, por ano, 30 toneladas de mandioca comestível.
Histórico
A ocupação da antiga fazenda Santa Maria – que deu nome ao assentamento – aconteceu no dia 19 de janeiro de 1993, por 16 famílias ligadas ao MST. O local, antes usado para o plantio de cana-de-açúcar, em maio de 1994 foi desapropriado pelo Incra e transformado no assentamento onde foi criada a Copavi. Francisco Strozake, de 67 anos, conhecido como “Chicão” é um dos fundadores da cooperativa e relata que desde o acampamento um grupo de famílias se organizou e decidiu trabalhar coletivamente. “Desde o princípio o objetivo das famílias que participaram da conquista deste assentamento foi desenvolver as atividades e a organização interna de forma coletiva e comunitária”, relembra.