7ª Jornada de Agroecologia apresenta túnel do tempo da agricultura

Como parte da programação da 7ª Jornada de Agroecologia, que acontece do campus da Unioeste (Universidade Estadual do Oeste do Paraná), em Cascavel até sábado (26/07), nesta quinta-feira (24/07), os cerca de 3 mil camponeses da Via Campesina farão uma viagem no tempo sem sair do lugar. Eles irão conhecer o Túnel do Tempo, que de uma forma diferente e dinâmica conta a história da agricultura desde o surgimento na humanidade até os dias atuais. No Túnel, os visitantes da exposição caminham por várias salas que, ocupadas cada uma por um cenário, remontam épocas diferentes dessa história.

A experiência é uma iniciativa em educação popular criada por estudantes de escolas estaduais do município de São João do Triunfo. A exposição estará aberta para visitação durante toda a programação da Jornada.

Para iniciar as atividades do dia, às 8 horas o professor e engenheiro agrônomo Horácio Martins de Carvalho discute “o poder das transnacionais do agronegócio na agricultura paranaense”.

Oficinas e trocas de conhecimento

Às 14 h desta quinta-feira e sexta-feira (25/07), cerca de 45 oficinas, desenvolvidas por agricultores, entidades populares e movimentos sociais. Entre as experiências apresentadas estão: agricultura sustentável, apicultura, educação, experiências agroecológicas, alimentos, organização e saúde popular, programas governamentais, entre outros temas.

Estas trocas de experiências serão abertas ao público e ministradas por várias entidades e docentes da Unioeste que vai certificar os participantes. Às 17 h acontece um Ato Público em defesa da educação e da biodiversidade, com plantio de árvores na Universidade.

A Jornada é um espaço de debate em torno da necessidade de produção de alimentos e da prática de uma agricultura, baseada na agroecologia, respeitando o meio ambiente (sem uso de agrotóxicos ou cultivo de transgênicos), os campones e pequenos agricultores e sua relação saudável com a terra, além de reafirmar as formas organizativas tradicionais de cooperação e prosseguir com a marcha de luta pela reforma agrária.

“A construção das Jornadas de Agroecologia faz parte de um processo de luta permanente, contra o projeto das empresas transnacionais e do agronegócio, na construção de um projeto popular e soberano para a agricultura brasileira, baseada na agroecologia e na soberania alimentar”, explica o militante da Via Campesina, José Maria Tardin.

A comunidade da região está convidada para participar das atividades, que são um espaço de formação e intercâmbio de experiências entre camponeses, pequenos agricultores, pesquisadores e estudantes.

Na quart-feira (23/07) foram realizados debates com o coordenador nacional do MST João Pedro Stédile, sobre a estratégia das transnacionais para dominar a agricultura e com pesquisadora do grupo ETC – México, Sílvia Ribeiro, em relação ao “domínio das transnacionais nas sementes”. Na programação ainda estão previstas palestras com a filha do revolucionário argentino Che Guevara, Aleida Guevara, entre outros que tratarão de temas ligados à agroecologia, transnacionais, criminalização dos movimentos sociais, educação popular e soberania alimentar.

Entenda quem é a Via Campesina

A Via Campesina é um movimento internacional que coordena organizações camponesas de pequenos e médios agricultores, trabalhadores agrícolas, mulheres rurais e comunidades indígenas e negras da Ásia, África, América e Europa.

Uma das principais políticas da Via Campesina é a defesa da soberania alimentar, como o direito dos povos de decidir sobre sua própria política agrícola e alimentar. Isso inclui: prioridade para uma produção de alimentos sadios, de boa qualidade e culturalmente apropriados, para o mercado interno.

É fundamental, então, manter um sistema de produção camponês diversificado (biodiversidade, respeito à capacidade produtiva das terras, valor cultural, preservação dos recursos naturais).

Fazem parte da Via Campesina o CIMI (Conselho Indiginista Missionário), CPT (Comissão Pastoral da Terra), FEAB (Federação dos Estudantes de Agronomia do Brasil), MAB (Movimento dos Atingidos por Barragem), MPA (Movimento dos Pequenos Agricultores), MMC (Movimento de Mulheres Camponesas), IEEP (Instituto Equipe de Educadores Populares), MST e Escola Latino-Americana de Agroecologia. A Jornada de Agroecologia também conta com o apoio da Assesoar (Associação de Estudos, Orientação e Assistência Rural) e da organização de direitos humanos Terra de Direitos.

Trabalhadores debatem domínio das transnacionais na agricultura e crise de alimentos

Por Weslei Venâncio e Taís de Mendonça

A atuação das transnacionais, sua relação com a agricultura camponesa e a crise de alimentos foram temas de conferências, realizadas na tarde desta terça-feira (23), durante o primeiro dia da 7° Jornada de Agroecologia. O evento, organizado pela Via Campesina, recebeu o membro da coordenação nacional João Pedro Stédile e a pesquisadora do grupo ETC (Grupo de Ação sobre Erosão, Tecnologia e Concentração), México, Sílvia Ribeiro.

A crise que desde janeiro tem provocado o aumento no preço dos alimentos é apontada por Stédile, como conseqüência da estratégia de atuação do agronegócio. A formação de oligopólios nos setores de fertilizantes, de venenos e no setor agrícola é apontado como a principal causa do aumento dos preços nos alimentos, basta lembrar que não aconteceu nenhum evento catastrófico que devastasse a produção de alimentos em escala mundial e pudessem justificar a repentina alta desses preços. “Os alimentos dobraram de preço, mas os pequenos agricultores continuam ganhando o mesmo. A imprensa não explica os motivos da crise porque teria que denunciar os verdadeiros culpados”, denuncia.

Para o coordenador do MST, a crise dos alimentos tem colocado em evidência as contradições do modelo baseado no agronegócio e pode ser encarada como um marco para a superação desse sistema. “O preço dos alimentos vai continuar subindo, porque com o oligopólio o preço e o custo de produção deixaram de estar vinculados”. Stédile aponta, ainda, como contradições do modelo, a dependência do petróleo para o uso com maquinário e fertilizantes, a ação depredatória do meio ambiente e a relação de exclusão de mão-de-obra.

Ele também denunciou a dominação que as transnacionais exercem sobre a agricultura e as conseqüências dessa relação para os pequenos agricultores e a sociedade que consome os alimentos produzidos pelo agronegócio. A lógica produtiva das transnacionais, voltada para a obtenção do lucro, o cultivo baseado na monocultura, exploração dos recursos naturais e uso de sementes transgênicas, é incompatível com a preservação do meio ambiente e a produção de alimentos saudáveis. “Já está comprovado que o cultivo de monocultura destrói o meio ambiente, mas as transnacionais não querem produzir alimentos sadios, querem só lucro”, argumenta.

Veneno e sementes

“No México não tem opção, ou os agricultores têm suas semente ou tem de comprar das transnacionais” afirmou Sílvia Ribeiro, do ETC. O controle das sementes deve ser visto como uma questão de segurança alimentar, e não pode ser pensado isoladamente. Para Ribeiro, existe todo um movimento do capitalismo de aumento do controle por parte das empresas do mercado de alimentos, desde seu inicio até seu processamento.

Empresas como Cargill e Bunge dominam o mercado de sementes. Também houve aumento da concentração das empresas no mercado de grãos e cereais. No controle do processamento de alimentos se destacam a Nestlé e Coca-Cola.

Do monopólio das sementes resulta a perda de controle na produção de alimentos. Antigas produtoras de fertilizantes, como Du Pont, Bayer, Syngenta, Monsantos e voltaram para o mercado de alimentos, diversificando sua produção. Esse processo exerce uma grande pressão para que os pordutores comprem conjuntamente o veneno e a semente. Os transgênicos são sementes frágeis e necessitam de agrotóxicos das próprias empresas fabricantes para se desenvolver.

Em relação aos transgênicos, a pesquisadora mexicana denuncia que é a primeira vez, na história da humanidade, que um ser vivo recebe a patente de uma empresa particular. “Os produtos transgênicos tem menor produtividade e servem para aumentar o controle da Monsanto e das transnacionais sobre a produção”, enfatiza Ribeiro.

Esta concentração e centralização do complexo de produção de alimentos também resulta da crise imobiliária dos Estados Unidos. Com os prejuízos financeiros resultantes dessa crise as empresas migraram seus investimentos para o agronegócio, ou seja, numa típica inversão de capitais, passaram a especular com as colheitas de milho, trigo, soja, na tentativa de garantir a segurança dos investimentos num mercado imobiliário inseguro.

Ribeiro avalia, ainda, que a defesa do direito de se ter acesso a sementes deve ser uma estratégia fundamental para os povos, pois em questões dessa gravidade não há solução individual, mas coletiva. “É essencial o controle dos camponeses sob suas sementes, a produção do tipo crioula, evitando a padronização. A desobediência civil em relação a produção de sementes deverá ser tática essencial no combate ao monopólio, pois a produção autônoma de comida tenderá a ser criminalizada”, conclui.