7ª Jornada de Agroecologia discute políticas públicas
Como parte da programação da 7ª Jornada de Agroecologia, que acontece do campus da Unioeste (Universidade Estadual do Oeste do Paraná), em Cascavel até sábado (26/07), nesta sexta-feira, às 11h a Via Campesina realizou encontro com autoridades para discussão de políticas públicas no avanço da reforma agrária, sob a construção da matriz agroecológica e soberania alimentar.
Estiveram presentes no Ato, a superintendente o Incra (Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária) do Paraná, Cláudia Sonda; o diretor de coordenação e meio ambiente da Itaipu Binacional, Nelton Friedrich; o representante do secretário de Agricultura e Abastecimento, Erlon Goelzer; representante da secretária de Ciência, Tecnologia e Ensino Suporior, Aníbal Santos Rodrigues, entre outras autoridades e sindicatos.
No início da manhã, antes do ato, a professora Sivone Ernst Silva ministrou palestra sobre a experiência de Educação Popular com o Túnel do Tempo, criado por professores e alunos de uma escola estadual de São João do Triunfo (PR). A exposição foi montada no ginásio da Unioeste para contar aos visitantes a trajetória da agricultura. Cada estande recria ambientes desde a
Era dos Dinossauros, passando pelo agronegócio, e a conservação de sementes crioulas. Izabel Grein também vai falar sobre ”a educação como ferramenta que mobiliza, organiza e forma a consciência libertadora”.
No início da tarde José Maria Tardin, da Via Campesina realizou um debate sobre a “Agroecologia e a cooperação como estratégia para a soberania alimentar”. Às 14h30 aconteceram diversas oficinas com trocas de experiências entre os participantes. Entre as experiências apresentadas estão: agricultura sustentável, apicultura, educação, experiências agroecológicas, alimentos,
organização e saúde popular, programas governamentais, entre outros temas.
As experiências são abertas ao público e ministradas por várias entidades, movimentos sociais e docentes da Unioeste que vai certificar os participantes.
A influência do agronegócio na agricultura paranaense
Por Crystiane Perinazzo e Weslei Venancio
As ações das transnacionais do agronegócio na agricultura paranaense: cana de açúcar, grãos, pecuária, eucalipto, pinus, agrocombustíveis e o controle da água, foram o tema principal da palestra do segundo dia (24/07) da 7ª Jornada de Agroecologia. “O aumento da monocultura e o uso intensivo da terra para produtividade do agronegócio subordina os camponeses, retirando sua autonomia”, afirma o agrônomo, cientista e pesquisador da agricultura, Horácio Martins.
O principal enfoque da discussão foi baseado em três pontos: a expansão da monocultura e da pecuária; a integração do camponês na agroindústria; e a expulsão do camponês da terra. “A concentração da terra está levando a uma elevação de seus preços, isso força uma produção de alta rentabilidade, e, portanto, ligadas à exportação, dessa forma a produção de alimentos fica deslocada porque tem baixa rentabilidade, pois o mercado interno tende a achatar o preço dos produtos para alimentação popular ligado ao salário pago pelas indústrias”, explicou Horácio Martins.
Segundo Martins, no ano passado o Brasil foi um dos maiores exportadores de grãos, e o trigo foi o produto que mais cresceu no Paraná, juntamente com o pinus e eucalipto. Já o feijão e o arroz tiveram um declínio. “Uma empresa transnacional concentra diferentes marcas, sendo todas do mesmo grupo. Seus produtos acabam chegando nas mãos dos consumidores caracterizados com se fossem de várias empresas”, complementa. Com essa concentração do capital transnacional, os camponeses ficam cada vez mais na dependência destas multinacionais, que controlam o processo produtivo em todas as suas fases, desde a compra dos insumos até a venda dos alimentos, o produtor acaba sendo sujeito da determinação da Monsanto, Cargill, Bunge e outras transnacionais.
A questão do crédito rural também é um problema grave, em que os camponeses perdem o controle e a qualidade na produção da semente, pois ao comprar a terra, automaticamente adquirem o pacote tecnológico. “Os camponeses se sentem acuados pela grande pressão das propagandas das multinacionais”, define.
No último ano, o Paraná ficou em segundo lugar na produção nacional de frango, isso vem ocorrendo pelo fato de empresas multinacionais terem um crescimento demasiado, pois compram os frangos diretamente das cooperativas.
Para Horácio Martins a integração dos pequenos agricultores nas agroindústrias capitalistas leva a sua destruição, tanto materialmente quanto ideologicamente. “Eles estão associados ao capital, não podem lutar, são sócios explorados, perdem sua autonomia, como na produção de cana onde os trabalhadores estão tendo que se associar aos usineiros”, argumenta. Uma das formas dessa integração é o arrendamento das terras. “O arrendamento é o pior o inimigo dentro de casa, o lote fica destruído, há perda de autonomia e integração como subordinação”, esclarece.
A concepção de que o pequeno agricultor deva ser um empreendedor, também é considerada negativa por Martins. “Quando os camponeses imitam os capitalistas introduzem tecnologias da monocultura que é inadequada à produção camponesa, perde controle das sementes, se tornam dependentes da safra que deprecia seus preços de venda”, explana.
Há três grandes mitos na Europa usados para reforçar o modelo do monocultivo de agricultura, de que os transgênicos, garantem alimentação animal, segurança em relação às mudanças climáticas, e enfrentariam a fome no mundo. Para Martins, estes mitos servem apenas para reforçar a dependência tecnológica dos camponeses em relação ao capital e, não garantem a segurança alimentar, com comida barata e saudável.
A racionalidade do capital se faz às custas da destruição do ambiente e desertificação da Amazônia. Por isso, ele diz acreditar que os camponeses tem obrigação ética e moral de denunciar a política nacional de crescimento do agronegócio, por destruir o ambiente. “A nossa estratégia deve ser a luta contra o capital, para isso é fundamental a agroecologia, ou seja, a luta por uma matriz energética que garanta segurança alimentar como as sementes crioulas, e preserve o meio ambiente”, conclui Martins.
Em defesa da educação e da biodiversidade
Por Pedro Carrano
O segundo dia da 7ª Jornada de Agroecologia foi marcado por um ato em defesa da educação e da biodiversidade, realizado no próprio campus da Universidade Estadual do Oeste do Paraná
(Unioeste), com o plantio simbólico de sete mudas de árvores, em defesa da educação e da biodiversidade. A Via Campesina realizou uma mística em homenagem aos militantes assassinados entre o segundo semestre de 2007 e 2008, Keno e Eli Dallemole.
Para o representante da Via Campesina, José Damasceno, o plantio de árvores dentro da Universidade representa a produção e reprodução da vida e a preservação da biodiversidade. “O ato demonstra o compromisso dos camponeses da Via Campesina com a recuperação do meio ambiente e dos recursos naturais. É o resultado de um processo de construção de sete anos de jornada, com o conhecimento dos camponeses na relação com a natureza”, explica.
O sistema Judiciário recebeu muitas críticas durante o ato porque está deixando de atender as solicitações da sociedade para ostentar ideológico de braço executor da hegemonia, especialmente nas ações de perseguição ao movimento do campo, em todo o país. Assim como acontece no Rio Grande do Sul (RS), em Cascavel e na região sudoeste do Paraná, os trabalhadores Sem Terra têm sido alvo de investidas do Judiciário, como no caso a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB)-Cascavel.
Outra denúncia preocupante é a perseguição do agronegócio utilizando-se de milícias armadas e capangas. Também são motivos de preocupação os despejos oficiais pelo governo estadual realizados contra os acampamentos. De acordo com dados da Comissão Pastoral da Terra (CPT), a cada dez dias ocorre no Paraná uma ação de reintegração de posse. Apenas no ano de 2007, 2077 famílias sofreram com o cumprimento de 18 mandatos de reintegração de posse.
O ato da Via Campesina contou com a presença de representantes da Assembléia Popular, da APP-Sindicato de Curitiba, do Centro de Formação Urbano Rural Irmã Araújo (Cefuria), Coletivo Despejo Zero, do DCE da Universidade Federal do Paraná (UFPR), entre outros movimentos sociais. Estava presente também o Movimento dos Camponeses Paraguaios (MCP), que ressaltou a necessidade de um projeto popular para os dois países. “Que a luta não tem fronteira, estamos lutando para construir um projeto popular também para o Paraguai, e em toda América Latina”, disse Jose Bobadilla, membro do movimento.
Estiveram presentes no ato o deputado federal Dr. Rosinha e representantes da Unioeste.
Feira de Agroecologia: embrião de uma resistência
Na feira de produtos agroecológicos, agricultores exibem as variedades de sementes pesquisadas, refletindo sobre a necessidade de superação do modelo do agronegócio, no entanto, reconhecendo que a agroecologia ainda é um embrião de resistência, frente à expansão do capital no campo.
Roque Gandin é um dos 25 produtores familiares do Movimento dos Pequenos Agricultores (MPA) que compareceram à Jornada. A barraca em que estavam instalados exibia mais de 30 sementes, de diferentes espécies, como feijão de porco, milho orgânico e arroz crioulo, esta última uma variedade rara, segundo ele.
Na avaliação de José Damasceno, da coordenação estadual do MST, a agroecologia e suas técnicas devem ser analisadas como um processo e não como um fim em si mesmo. “Do meu ponto de vista, a agroecologia não deve negar a tecnologia, mas sim do ponto do avanço, mas sim negar a modernidade do ponto de vista do capitalismo, da concentração e do dano ao meio ambiente. Neste momento da luta de classes, a agroecologia é a proposta de enfrentamento no campo”, define.
Oficinas apresentam experiências agroecológicas
Tiveram início no dia 24 a maioria das 48 oficinas temáticas, divididas em 10 eixos, em torno do tema da agroecologia. As principais linhas foram as seguintes: Técnicas de agroecologia, Água, Apicultura, Educação, Experiências em Agroecologia, Segurança e Soberania Alimentar, Organização Popular, Programas Governamentais, Saúde Popular.
Todos os temas foram abordadas no contexto da Jornada que busca refletir sobre um modelo de agricultura sustentável e sobre as experiências, as técnicas, as possibilidades e as contradições que vêm sendo desenvolvidas pelos camponeses.
Educação do Campo: acesso a educação e estratégia de soberania popular
Thaíse Mendonça
Nesta quarta-feira (24), a oficina “Educação do Campo: o protagonismo dos camponeses e movimentos sociais na luta por educação” apresentou aos participantes da 7º Jornada de Agroecologia um pouco das experiências concretas de ensino popular desenvolvidas pelo MST. Durante toda à tarde foram realizadas 37 oficinas, cinco delas sobre educação.
O MST mantém 11 Escolas Itinerantes em funcionamento no Paraná. Baseadas no princípio da auto-organização, na importância da coletividade e na formação crítica dos educandos. As escolas funcionam dentro dos acampamentos e atendem 1500 jovens e adultos. Fátima Knopf, educadora da Escola Itinerante Carlos Marighela e ministrante da oficina sobre educação do campo, conta que as escolas surgiram como forma de garantir o acesso à educação para os filhos/as dos militantes acampados que lutam pela Reforma Agrária.
O projeto político-pedagógico das escolas itinerantes utiliza as práticas da educação popular e o método pedagógico proposto por Paulo Freire que considera os educandos como sujeitos inseridos em uma realidade social que deve ser levada em conta no processo educativo. “O projeto de educação está vinculado ao projeto de sociedade que os militantes do MST defendem e que pretende romper com o modelo de sociedade atual”, conta. Fátima explica também que os educadores de cada escola são militantes do próprio acampamento onde lecionam e recebem qualificação e assessoria permanente do Setor de Educação do movimento.
A experiência da Escola Milton Santos
Os estudantes do curso técnico integrado em agroecologia da Escola Milton Santos também relataram durante a oficina um pouco da experiência que realizam em Maringá, município no noroeste do Estado. A iniciativa mantém parceria com a Escola Técnica da Universidade Federal do Paraná (UFPR) e fornece formação técnica e política para os educandos. A turma Karl Marx foi a primeira formada, em 2005, com 13 técnicos.
Além de formar profissionais com qualificação para trabalhar com a agricultura camponesa e familiar e com uma tecnologia agrícola que não prejudica o meio ambiente, a escola funciona como um centro de experiência em agroecologia. Durante a visita a Cascavel, o membro da coordenação
nacional do MST João Pedro Stédile criticou o ensino das faculdades tradicionais que formam profissionais capacitados apenas para o modelo de agricultura desenvolvido pelas transnacionais, baseado na monocultura e na utilização extensiva de agrotóxicos e insumos químicos. “Faltam
agrônomos que dominem os processos da agroecologia. Para fazer a transição do modelo de produção é preciso difusão do conhecimento, convencimento e apoio do governo”.
Experiência do Projeto Mandala de produção integrada
Pedro Carrano
Inspirado na experiência realizada no estado da Paraíba, o sistema de produção mandala foi adaptado para o assentamento do Contestado, na Lapa (PR).
A mandala consiste na irrigação que parte de um açude central e distribui a água, por meio de um motor d’água, para uma grande variedade de cultivos, dispostos em espiral.
A água circula por meio de mangueiras pretas, furadas com pequenos bastões de cotonetes, por onde a água deve se espalhar. Este sistema permite a circulação de nutrientes e também de energia entre as diferentes espécies.“Tudo o que é produzido na mandala possui uma associação baseada na busca do equilíbrio da cadeia alimentar, praticamente se aproveita toda a energia do sistema”, descrevem Celson José Chagas e Ceres Luisa Hadich, ministrantes da oficina. Nos arredores da mandala são plantadas árvores, que servem como quebra ventos e ajudam
no sistema.
Na Lapa, o sistema chega a abarcar cerca de 1000 metros de canteiro, e uma área total de 2000 metros quadrados. A produção tem caráter comunitário. O sistema do Contestado, por exemplo, serve à produção de quatro famílias e fornece alimento também para a Escola Latino-americana de Agroecologia.
Experiência de agroindústria em produção de leite
Cooperativa produtora de leite, criada pela brigada Sebastião da Maia, do MST, em Querência do Norte (PR), a Coana (Cooperativa de Comercialização Avante Ltda) surgiu no ano de 1992. Na oficina que explicou o processo de criação desta agroindústria, foi ressaltada a necessidade do trabalho de base e da organização coletiva para que o projeto pudesse se sustentar.
Apenas 10 anos depois, após um longo trabalho de intercâmbio com a experiência de outros assentamentos, a Coana passou a produzir leite e, principalmente, derivados como o queijo. De acordo com os organizadores da oficina, apenas desta maneira –coletiva – um assentamento de pequenos produtores consegue atingir escala para a produção e, além disso, equilibrar a matéria-prima com a necessidade de produção. Afinal, a matéria-prima é fornecida pelos próprios assentamentos do MST. “A sociedade não acredita que os pobres podem se organizar e fazer as
coisas”, afirmam os organizadores da oficina, da brigada Sebastião da Maia.
A cooperativa, ainda assim, encontrou dificuldades, como a necessidade de adaptar-se à normativa 51, instituída no ano de 2002, medida que impõe limitações na compra de maquinário, a partir de índices de produção, o que favorece os grandes produtores. Afora a tarefa de enfrentar transnacionais da área da alimentação, como Parmalat, Nestlé e as cooperativas que trabalham associadas ao agronegócio.