Unificada, esquerda brasileira apóia povos bolivianos em Brasília

O embaixador da Bolívia no Brasil, René Mauricio Dorfler Ocampo, recebeu nesta sexta-feira (26/09) uma comissão formada por representantes de entidades de classe, partidos, pastorais e movimentos sociais brasileiros que, durante toda a manhã, mobilizaram-se em Brasília em solidariedade aos povos da chamada “meia-lua”.

Na embaixada boliviana, os manifestantes entregaram a Ocampo uma carta de repúdio à tentativa de golpe separatista promovida pela direita daquele país e ao ataque que vitimou mais de 30 camponeses na Província de Pando. “Mas é, sobretudo, uma mensagem de força aos povos originários da Nação Boliviana e uma resposta ao chamado dos povos irmãos da América Latina”, diz o texto (em anexo).

Ao receber a carta, o embaixador agradeceu o apoio do povo brasileiro: “Nós consideramos essa mobilização de extrema importância. Nas últimas semanas, a Bolívia tem sofrido uma tentativa de golpe de Estado civil, e o governo boliviano manifestou sua vontade de diálogo, de tentar fazer tudo no quadro na democracia”, afirmou.

Ao comentar os esforços do governo boliviano para tentar assinar um acordo de pacificação com a oposição, Ocampo ressaltou que Evo Morales não pretende modificar a proposta de Constituinte apresentada em dezembro de 2007, que será submetida a um referendo no final deste ano.

“Não estamos dispostos a ter a possibilidade de constitucionalizar os estatutos autônomos que foram aprovados de maneira ilegal. Não é uma nova assembléia constituinte o que está acontecendo em Cochambamba, mas um processo de diálogo. Não vamos abrir mão dos projetos da Constituição, porque é um trabalho que representa todos os setores sociais da Bolívia. O governo ratifica sua vontade de dialogar, mas gostaria de ver essa mesma vontade por parte dos oposicionistas”.

O embaixador citou o referendo revogatório ocorrido em agosto deste ano – que mediu a aceitação do presidente Morales e seu vice perante o povo boliviano – para afirmar a existência de processos democráticos no país. “As mostras da vontade política do governo no quadro da democracia são mais que eloqüentes, e vamos seguir trabalhando nesse quadro. Mas também acreditamos que as ingerências externas nos assuntos de nossos países e o imperialismo que às vezes tenta seguir influenciando nossas políticas têm que ser rejeitados”, ponderou.

Após a entrega da carta, cerca de 200 militantes e dirigentes políticos das entidades mais representativas da esquerda realizaram uma marcha até a embaixada dos Estados Unidos, onde fizeram um ato para denunciar a ingerência do país norte-americano nos processos democráticos da América Latina. Philip Goldberg, embaixador americano em La Paz, se reuniu dias antes dos ataques com o governador Rúben Costas, de Santa Cruz, que faz oposição ao governo. Goldberg representou os Estados Unidos na Bósnia de 1994 a 2000 e no Kosovo de 2004 a 2006, incentivando o desmembramento da Iugoslávia.

No final do ato, cruzes de madeira foram fincadas no gramado da embaixada para representar os assassinatos cometidos por grupos oposicionistas no departamento de Pando.

A seguir, leia a carta entregue ao embaixador:

Excelentíssimo Embaixador da Bolívia no Brasil?

Sr. René Mauricio Dorfler Ocampo

É com enorme preocupação e expectativa que nós, movimentos sociais e populares, organizações sindicais e partidárias do Brasil, temos acompanhado a situação política da Bolívia nesse último mês.

Esta carta, mais que uma manifestação de solidariedade ao Governo do Presidente Evo Morales, é uma expressão de repúdio à tentativa de golpe separatista promovida pela direita fascista de vosso país e ao ataque que vitimou nossos companheiros camponeses na Província de Pando, mas, sobretudo, uma mensagem de força aos povos originários da Nação Boliviana e uma resposta ao chamado dos povos irmãos da América Latina.

Sabemos que a ação dos governadores e de seus apoiadores oposicionistas, em conluio com o imperialismo norte americano, é uma reação a decisão do Governo Morales de priorizar a defesa da soberania nacional, os direitos dos povos, a democracia e o combate à pobreza e à desigualdade.

A partir do decreto de nacionalização de empresas estratégicas, do gás e dos hidrocarbonetos, as oligarquias nacionais, aliadas ao capital estrangeiro, perderam poder sobre a exploração e comercialização das riquezas naturais e sobre o fornecimento de serviços.

Sem esperanças de retomar o controle do país após o referendo de agosto, quando 67% da população boliviana confirmou seu apoio ao Governo Morales, a saída da direita fascista foi organizar um golpe, cuja estratégia é dividir o território e provocar um confronto entre os bolivianos para permitir que as riquezas nacionais voltem a ser controladas pelas multinacionais. Não contavam eles com a resistência corajosa dos trabalhadores e de suas organizações classistas, que foram às ruas em defesa dos seus direitos e de seu governo legítimo. Ao contrário da solução buscada pelo Governo, a forma que os separatistas encontraram para acabar com o conflito, foi ceifar as vozes dos trabalhadores.

Sabemos que essa tentativa de ingerência norte americana na Bolívia é parte da política do Governo Bush, que já vitimou milhares de trabalhadores no mundo inteiro em nome do poder econômico.

Conforme declarou o próprio presidente Evo Morales, “não é somente a unidade da Bolívia, é toda a América do Sul” que está em risco nessa disputa. Nós concordamos com sua avaliação. Por isso defendemos que a luta do povo boliviano pela soberania e pela integridade da nação seja uma luta de todos nós.

Hoje estamos realizando um ato público, em frente à embaixada americana no Brasil, para repudiar a tentativa de golpe e dizer NÃO à ingerência do imperialismo estadunidense sobre a América!

Sabemos que os EUA nunca hesitaram em utilizar a força para impor estados de terror com o objetivo de impedir o avanço das lutas e reivindicações camponesas, indígenas e operárias. Por isso, aceitamos o chamado de nossos companheiros e nos somamos à construção de uma frente única continental em defesa da soberania e da unidade da Bolívia!

Via Campesina, Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB), Movimento dos Pequenos Agricultores (MPA), Movimento de Mulheres Camponesas (MMC), Central Única dos Trabalhadores (CUT), Intersindical, Conlutas, SINDPREV-DF, CELA, CÁRITAS, Coordenação dos Movimentos Sociais (CMS) Consulta Popular, Movimento Democracia Direta (MDD), Grito dos Excluídos Continental, PT, PSOL, PC do B, PCB, UJS, DCE-UNB, MTL, Assembléia Popular DF, Movimento Olho na Justiça, Assera.