Movimentos apontam agroecologia como desenvolvimento

Por Rogério Almeida
Do Maranhão

A disputa pela terra e os recursos nela existentes coloca no centro do debate a disputa pelo projeto de desenvolvimento.

De um lado, estão grandes corporações do setor do agronegócio, mineradoras, construtoras de barragens, base de lançamento de foguetes de Alcântara, empresas de cosméticos e farmácia.

No outro extremo, camponeses, indígenas e quilombolas e demais modos de vida considerados tradicionais na Amazônia.

No setor de sementes os mastodontes são a Monsanto, Dupont e Syngenta, que controlam próximo de 40% do mercado mundial.

A diferença de força e do poder político e econômico entre as partes envolvidas foi um dos pontos de reflexão do Seminário Agrobiodiversidade da Amazônia, ocorrido nos dias 17 e 18, na ilha de São Luís, Maranhão.

Rede de Agroecologia do Maranhão (RAMA), Articulação Nacional de Agroecologia (ANA) foram os organizadores do evento.

A ensolarada cidade recebeu cerca de 130 pessoas de todo o canto da Amazônia e de outras regiões do país para refletir sobre a questão e expor produtos numa feira dedicada à riqueza de variedades da natureza e do artesanato.

Cachaça, licores, mel, comidas típicas, geléias, compotas foram expostos, entre outros itens. Na semana que reflete sobre a Consciência Negra, num estado de grande contingência afro, o Tambor de Crioula do Mestre Felipe fez as honras da casa.

A consolidação de ações em rede a partir de frentes que alternem mobilização política de pressão nos níveis locais e nacionais e a potencialização das iniciativas locais de agroecologia, fortalecimento da troca de experiências foram algumas sugestões de enfrentamento com a conjuntura que favorece as grandes corporações.

Quilombolas, camponeses, indígenas e assessores partilharam práticas baseadas nos princípios da agroecologia e que ainda carecem de maior visibilidade como possibilidades concretas de desenvolvimento que contemple o saber e os modos de produção das populações da terra firme, várzea, ilha, estuário, cerrado, áreas de colonização consideradas antigas e as áreas de colonização mais recentes na Amazônia.

Grandes projetos em questão

Nice Tavares, uma negra quebradeira de coco babaçu do Maranhão e integrante do Movimento Interestadual das Quebradeiras de Coco Babaçu (MIQCB), reflete que a manutenção da agrobiodiversidade representa a garantia da vida. A militante arremata que o desenvolvimento baseado nas grandes empresas só traz destruição ao povo que vive mo campo.
R.Almeida- Nice Tavares reflete sobre os grandes projetos na Amazônia

A interpretação da Tavares comunga da fala dos depoimentos de militantes de outras regiões, como no caso do José Maria, do Baixo Parnaíba, mesorregião leste maranhense (Chapadinha, Coelho Neto, Caxias, Codó e Chapada do Alto Itapecuru), onde proliferam monoculturas de soja e cana.

No contexto de expansão de grandes grupos sobre áreas de populações consideradas tradicionais é comum a lógica da violência em diferentes níveis: expulsão da família camponesa, grilagens de terra, corrupção do poder público, destruição ambiental, condições análogas a trabalho escravo, prostituição e violência urbana. O militante indicar que o Grupo João Santos é um dos protagonistas. José Maria informa ainda para o elevado índice de poluição dos recursos hídricos por conta do uso intensivo da monocultura da soja.

Marly e Santinha são índias Makuxi da área da Raposa Serra do Sol, em Roraima. Além do povo Makuxi a reserva registra os povos Ingarikó, Patamona, Taurepang e Wapixana. As simpáticas índias informam que o processo da presença dos sulistas na região teve início lá na década 1960 e foi se aprofundando com o passar dos anos. Elas festejam o fracasso eleitoral do prefeito de Pacaraima, Paulo César Quartiero, o mais voraz opositor da demarcação continua da reserva.

A ação contra a União que visa o esquartejamento da reserva Raposa Serra do Sol foi movida pelos senadores Augusto Afonso Botelho Neto (PT/RR) e Francisco Mazarildo de Melo Cavalcanti (PTB/RR), com o endosso do governador do estado, Ottomar Pinto (PSDB).

As indígenas relatam que os grandes produtores de arroz expulsam os homens da região e cometem todos os tipos de violência contra crianças e mulheres. As mulheres são estupradas, ressalvam com revolta as índias. As Makuxi pontuam que a monocultura do arroz destrói os mananciais e os buritizais, palmeira comum na região. Uma artemanha corrente para a composição de latifúndios tem sido a compra de lotes em projetos de assentamento da reforma agrária. Além do arroz registra-se a introdução da leguminosa Acácia Manja, uma planta exótica.

Dinâmicas agroecológicas

O seminário alternou dois momentos distintos. O primeiro dedicado para reflexão e o segundo para a apresentação de experiências locais. Silenciosamente homens e mulheres do campo fazem uma pequena revolução. A oeste do Maranhão a ONG, que tem como caráter ser dirigida por trabalhadores/as rurais tem consolidado uma prática em agroecologia que contempla inúmeras dimensões, como gênero, geração, educação e tecnologias baratas. Trata-se do Centro de Educação e Cultura do Trabalhador Rural (CENTRU), que tem entre os integrantes o histórico militante da luta camponesa Manoel Conceição Santos.

Ainda no Maranhão, na região do Mearim, região marcada pela proeminência de palmeiras de babaçu, a Associação de Assentamentos no Estado do Maranhão (ASSEMA), incentiva uma prática em agroecologia que já alcançou o mercado internacional e tem na linha de frente mulheres camponesas.

Já na região do Baixo Tocantins, onde predomina uma dinâmica de estuário, onde a vida se condiciona às oscilações das marés, a Associação Paraense de Apoio às Comunidades Carentes (APACC) anima uma rede de agricultores/as em agroecologia em três municípios locais.