Marcha em Salvador une movimentos do campo e da cidade
[img_assist|nid=7955|title=|desc=|link=none|align=left|width=640|height=428]Sexta-feira, 14 de Agosto de 2009: um dia ignorado pela grande mídia baiana. Os gritos de rebeldia de sem terra, sem teto, sindicalistas, pescadores, quilombolas, indígenas e estudantes ecoaram pelas ruas de Salvador, em protesto contra a crise e as demissões, pela redução da jornada de trabalho sem redução de salários, pela Reforma Agrária e urbana e em defesa dos investimentos em políticas sociais. O ato fez parte da Jornada Nacional de Lutas por Reforma Agrária, que promoveu diversas atividades em todo o país e um grande Acampamento Nacional em Brasília.
“O povo não é responsável pela crise econômica, então não iremos pagar essa conta. Exigimos que o Estado brasileiro tome medidas que garantam o acesso do povo aos seus direitos, como trabalho, condições de moradia e de subsistência dignas. O modelo de desenvolvimento que está em curso, ligado aos interesses do grande capital, gera mais desigualdade e miséria” afirmou Vera Lucia Barbosa, integrante da direção nacional do MST. O Movimento ocupou no dia 11/8 a sede local do Ministério da Fazenda, passando em seguida para a superintendência do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), onde permaneceu por toda a semana em protesto contra os cortes do orçamento da Reforma Agrária e em defesa do assentamento das 28 mil famílias acampadas em todo o Estado. Os Sem Terra exigem o descontingenciamento de R$ 800 milhões do orçamento do Incra para este ano e aplicação na desapropriação e obtenção de terras, além de investimentos no passivo dos assentamentos.
Os cerca de mil manifestantes pertenciam também a movimentos como MTD, MSTB, CETA, CIMI, MOPEBA, Via do Trabalho, MPA, MAB, CJP, CPP, Cáritas, Jubileu Brasil, ISPAC, NEPPA, ASFAP, Campanha Reaja, Direito em Questão e Consulta Popular, todos ligados à Assembléia Popular, que articula a construção de um projeto popular de desenvolvimento para o Brasil. As ruas do Comércio, na região da Cidade Baixa, em Salvador, ficaram coloridas pelo vermelho das bandeiras e pelas diferentes cores, culturas e etnias presentes, unidas numa só luta. Em frente às sedes dos Correios e do Banco do Brasil, um alerta: o povo está atento e em guarda contra as privatizações que dilapidaram o patrimônio público brasileiro.
Performances teatrais acompanharam o cortejo, traduzindo em arte a rebeldia de um povo que teima em não se submeter ao projeto hegemônico e devastador imposto pelo capital. Uma roda de capoeira improvisou-se em meio à caminhada, misturando corpos e ritmos em uma tradicional luta por libertação. O samba se fez presente pela voz de quilombolas, marisqueiros e pescadores, embalando o povo em sua caminhada por melhores condições de trabalho e de vida. Depois de subir a Ladeira da Montanha, já na Cidade Alta, uma bênção ancestral: os índios Tupinambá de Olivença e Buerarema encenaram o ritual do Poranci, também conhecido como Toré, uma dança circular ritmada ao som de maracás.
Genocídio da população negra[img_assist|nid=7956|title=|desc=|link=none|align=right|width=640|height=480]
À tarde, após um pequeno descanso e uma farta alimentação à base de peixe e marisco, cedidos e preparados pelas guerreiras quilombolas da ilha de Maré, reiniciaram-se as atividades, já com outra tônica. Um ato político pela vida e por uma outra segurança pública foi realizada durante toda a tarde e início da noite, na Praça da Piedade. Militantes de diversos movimentos negros, comunidades organizadas, movimentos sociais e de direitos humanos fortaleceram a abertura do I ENPOSP – Encontro Popular Pela Vida e por um outro Modelo de Segurança Publica. No pequeno coreto que foi montado, depoimentos dramáticos e denúncias arrepiantes de violência e abusos policiais. Apenas nos três primeiros meses de 2009, ocorreram 508 assassinatos em Salvador. As execuções sumárias feitas por policiais contra a população negra e pobre, moradora de bairros periféricos, geralmente nem são investigadas, e justificam-se através de um auto lavrado com suposta “Resistência Seguida de Morte”. O genocídio explícito expõe a falência da política de segurança pública no estado da Bahia, completamente atrelada aos interesses do grande capital, que tem por trás dela esquemas de privatização das cadeias e de defesa dos interesses das empresas do setor imobiliário.
O racismo institucional e as práticas de extermínio sobre as comunidades negras e pobres foram denunciadas pelo encontro, que durou três dias. Lá também foram debatidos temas como: segurança pública, violência policial e execuções sumárias; violência para-militar e grupos de extermínio; violência penal, política carcerária nacional e defesa de direitos de presas e presos e seus familiares; saúde e segurança; representação criminal nas mídias e nas artes; sistema de Justiça Criminal e os limites da política nacional de segurança – Sistema Único de Segurança Publica (Susp), Plano Nacional de Segurança com Cidadania (Pronasci) e o processo de construção da Primeira Conferência Nacional de Segurança Pública (Conseg).