Dr. Rosinha: “Ruralistas defendem cartel da laranja”
Do boletim do deputado Dr. Rosinha
A bancada ruralista no Congresso Nacional defende o cartel internacional das indústrias de suco de laranja e faz uso de um fato isolado para tentar ressuscitar um pedido de CPI contra o MST já rejeitado pela maioria do Legislativo.
A avaliação é do deputado federal Dr. Rosinha (PT-PR), coordenador nacional da Frente Parlamentar da Terra, ao comentar o episódio ocorrido na fazenda Santo Henrique, na divisa dos municípios de Iaras, Lençóis Paulista e Borebi (SP), em que trabalhadores rurais ligados ao MST derrubaram pés de laranja durante uma ocupação.
“O que os ruralistas querem é requentar a CPI do ódio contra o MST, ressuscitar um pedido já rejeitado pelo Congresso, a partir de um episódio isolado”, afirma Dr. Rosinha. “Ninguém defende a derrubada de árvores, mas, antes de qualquer análise leviana, é preciso avaliar quem é quem nessa história e o total de árvores cultivadas pela empresa.”
Conforme dados obtidos pela assessoria do mandato do deputado Dr. Rosinha, a Sucocítrico Cutrale Ltda., dona da fazenda, teria mais de 20 milhões de pés de laranja distribuídos em mais de 40 fazendas de sua propriedade no Brasil, além de outras unidades na Flórida (EUA).
Ao se tomar por base a estimativa da PM de São Paulo, que divulgou o número de 7 mil pés derrubados —o MST sustenta que o número foi menor, inferior a três mil—, chega-se ao percentual de 0,7% das árvores da fazenda, que totalizam um milhão, ou então de 0,035% dos cerca de 20 milhões de pés de laranja das fazendas da Cutrale em território nacional.
Em protesto contra a monocultura, o movimento plantaria feijão no lugar da laranja.
Os herdeiros da família Cutrale detêm cerca de 30% do mercado global de suco da fruta. Entre seus clientes estão companhias como Parmalat, Nestlé e Coca-Cola. A família seria uma das mais ricas do país, com fortuna acumulada equivalente a 5 bilhões de dólares.
Emissoras de TV e jornais citaram o vídeo como se fosse produção de um cinegrafista amador. Ocorre que as imagens foram captadas a partir de um helicóptero. “Um cinegrafista amador a bordo de um helicóptero?”, questiona Dr. Rosinha. “Pelo que apuramos, foi a PM paulista que fez a gravação e a repassou à mídia, em mais uma tentativa de criminalização da luta do MST por uma distribuição mais justa da terra.”
Cartel
Alvo de pelo menos cinco processos no Cade (Conselho Administrativo de Defesa Econômica), órgão encarregado de preservar a concorrência, a Cutrale é líder de um cartel formado por quatro empresas que dominam o setor.
Duas delas são multinacionais de outros países: Citrosuco, do grupo holandês Fischer; e Coinbra-Frutesp, do grupo francês Louis Dreyfus. A Cutrale e a Citrovita, do grupo Votorantin, são as outras duas.
Essas quatro indústrias detêm mais de 50 milhões de pés de laranja, o equivalente a 30% das 170 milhões de árvores produtoras de laranja do Estado de São Paulo, e impõem seus preços aos demais produtores.
Os donos da Cutrale são réus em processos por crime de formação de cartel e posse ilegal de armas de fogo. Armas e munições foram encontradas em seu gabinete durante cumprimento de mandado de busca e apreensão em 2006. O processo que trata do crime de cartel tramita na 9ª Vara Criminal de São Paulo.
Grilagem
Há cerca de uma década o Incra (Instituto Nacional de Reforma Agrária) reivindica na Justiça a posse da fazenda Santo Henrique. Conforme o órgão, em 1919 a União adquiriu área de aproximadamente 50 mil hectares de terras particulares para promover um projeto de colonização no interior.
Apenas partes das terras foram transferidas. O restante permaneceu em poder da União, como o caso da propriedade ilegalmente ocupada pela Cutrale.
Em janeiro de 2008, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) negou a tutela antecipada solicitada pelo Incra, mas a ação reivindicatória segue sua tramitação na 1ª Vara Federal de Ourinhos.
“Como forma de legitimar a grilagem, a Cutrale realizou irregularmente o plantio de laranja em terras da União”, diz trecho de nota da direção estadual do MST em São Paulo. “A produtividade da área não pode esconder que a Cutrale grilou terras públicas, que estão sendo utilizadas de forma ilegal, sendo que, neste caso, a laranja é o símbolo da irregularidade.”
A Cutrale também já foi autuada diversas vezes por impactos ao ecossistema, poluição ao meio ambiente e lançamento de esgoto sem tratamento em rios.
O MST calcula que 400 famílias acampadas poderiam ser assentadas na região. Em todo o estado de São Paulo, 1,6 mil famílias sem-terra estão acampadas. No país, são 90 mil.