Cinismo e conservadorismo na Câmara
Por Paulo Rubem*
Ao colher assinaturas para criar uma CPI destinada a investigar o MST os ruralistas e seus agregados demonstram o quão são cínicos e conservadores.
Bradam em todos os jornais que é preciso investigar o MST pois o movimento recebe verbas federais.
Por Paulo Rubem*
Ao colher assinaturas para criar uma CPI destinada a investigar o MST os ruralistas e seus agregados demonstram o quão são cínicos e conservadores.
Bradam em todos os jornais que é preciso investigar o MST pois o movimento recebe verbas federais.
Bem, as entidades legalmente organizadas para dar apoio e assessoria na organização da Reforma Agrária têm o legítimo e legal direito de defender que as receitas públicas sejam aplicadas para que se atinjam os objetivos definidos no artigo 3o. da Constituição Federal de 1988. Através da reforma agrária avança a luta contra a pobreza e o sub-desenvolvimento regional.
Os ruralistas querem investigar o MST mas não falam em investigar os bilionários contratos de crédito que empresários da elite rural brasileira tiveram há décadas com o Banco do Brasil, a SUDENE e os bancos estaduais, sobretudo os nordestinos, levando bilhões e bilhões e sempre buscando o apoio de sua base no Congresso para ter assegurada a ”renegociação” (nome educado) de suas dívidas nunca efetivamente apuradas.
Que o digam os R$ 150 milhões de reais que investigamos entre 1995 e 1998 nas contas de crédito do antigo BANDEPE, em Pernambuco, concedidos desde 1982 a usineiros e donos de destilarias, levados esses milhões à liquidação e prejuízo sem qualquer sanção aplicada pelo Banco Central aos tomadores desses crédito nem aos antigos gestores do banco do estado de Pernambuco. Idem para o PRODUBAN, de Alagoas, PARAIBAN, da Paraíba , entre outros.
Na verdade os ruralistas usam seu poder de fogo no Congresso, inclusive por estarem na “base aliada ” do Governo Lula , para impedir o avanço da luta pela reforma agrária.
Para eles o país deve se manter por décadas e décadas como exportador de produtos primários, financiando-se a produção e a exportação com dinheiro público subsidiado, em nome da balança comercial brasileira. Para eles os milhões de hectares desmatados na Amazônia, o trabalho escravo, a escolarização precária e o analfabetismo no meio rural são uma espécie de “insumo”, ou “ônus” que o País deve aceitar pelo “desenvolvimento” que eles trouxeram para o país.
Até um dia desses crianças acordavam às quatro da manhã e iam para o corte da cana, em milhares de engenhos no nordeste, aos seis, sete, oito anos de idade, enquanto os filhos dessa elite estudavam nas melhores escolas privadas das capitais Maceió, Recife e João Pessoa, muitos seguindo para estudos de nível médio na Europa e nos Estados Unidos, por lá ficando para a conclusão de seus “estudos” superiores. Cotidianamente as forças tarefas do Ministério do Trabalho, da Procuradoria do Trabalho, com a Polícia Federal, encontram e libertam trabalhadores em condições análogas à escravidão, em fazendas, usinas e outras propriedades rurais pelo País afora.
Isso, porém, não foi suficiente para impedir que fiscais do trabalho fossem assassinados por capangas atuando a mando de fazendeiros, em Unaí, Minas Gerais, anos atrás.
Por que será, senão por essa herança trágica, que a imensa maiora das cidades nordestinas que dependeram, por séculos, da economia canavieira tinham e ainda apresentam os piores indicadores sociais e humanos (IDH ) ? Coincidência ?
Na ocupação ocorrida em 2002 na Usina Aliança, em Pernambuco, que acompanhamos como Deputado Estadual, foram encontradas fotos de trabalhadores mortos, arquivadas nas gavetas dos móveis do escritório da Casa Grande da Usina, numa espécie de “prova” ( ou terá sido confirmação de ordens que haviam sido dadas ? ) do que fora feito contra esses trabalhadores.
Um agricultor de uma dessas fotos foi reconhecido, quase 40 anos depois, por uma de suas irmãs que disse ter o mesmo saído de casa, poucos dias depois do golpe de 1964, para reivindicar pagamentos atrasados na Usina e nunca mais ter voltado para casa.
A CPI do MST não é uma CPI para servir ao País e ao interesse público. É uma CPI para derrotar a reforma agrária, para atacar as entidades e movimentos que lutam por um outro projeto de desenvolvimento para a nação através da reforma agrária e das políticas que lhe são associadas.
Os ruralistas criticam os métodos do MST e de outros movimentos e por isso querem a CPI, que na verdade não quer apurar nada, mas apenas criminalizar por antecipação a justa luta dessas entidades e movimentos sociais.
Os movimentos denunciam a grilagem de terras, as fraudes nos cartórios na Amazônia, a lentidão do governo federal em liberar recursos para acelerar a reforma agrária, a impunidade dos criminosos e mandantes nos assassinatos de sem-terra, de civis e dirigentes sindicais no campo há décadas e nada disso é devidamente analisado em nosso País, com mandantes e criminosos dormindo sossegados o sono da impunidade.
Por isso expressamos nossa solidariedade ao MST frente a essa tentativa de se impor uma CPI contra a reforma agrária.
Viva Chico Mendes, Viva Francisco Julião, Viva Gregório Bezerra, Viva Margarida Maria Alves,Viva Irmã Dorothy !
Viva a luta pela reforma agrária, pela justiça social no campo brasileiro, viva a luta pela educação básica no campo, pela superação do analfabetismo secular e da mortalidade infantil, da baixa escolaridade das crianças e jovens no meio rural, vítimas das monoculturas, da ação das oligarquias, da falência e incompetência de um Estado que insiste em fazer de conta no tocante à promoção dessas políticas públicas emancipatórias, executando( em gastos públicos federais) gordos orçamentos para os juros e amortizações da dívida pública e quase imperceptíveis fatias das receitas públicas para a reforma agrária.
Vamos derrotar a CPI da criminalização, do atraso e das oligarquias da economia rural.
*Paulo Rubem é deputado federal pelo PDT-PE.