Entidades repudiam violência contra Sem Terra no Pará
Os sindicatos reunidos na Federação dos Trabalhadores na Agricultura do Estado do Pará (Fetagri) e a Comissão Pastoral da Terra (CPT) exigem, em nota, liberdade para os trabalhadores Sem Terra presos no Pará e o fim da impunidade dos crimes cometidos contra trabalhadores rurais.
Leia as notas abaixo:
NOTA PÚBLICA DE SOLIDARIEDADE AO ADVOGADO DA CPT DR. JOSÉ BATISTA E AOS DEFENSORES PÚBLICOS DR. ROSSIVAGNER E DR. ARCLÉBIO
Nós, da Federação dos Trabalhadores na Agricultura do Estado do Pará (Fetagri) regional Sudeste e dos sindicatos, dessa regional, viemos a público, manifestar total apoio ao advogado da Comissão Pastoral da Terra (CPT) Dr. José Batista Afonso e aos defensores públicos agrários Dr. Rossivagner Santana Santos e Dr Arclébio Avelino da Silva em razão das infundadas acusações feitas contra eles, pelo Delegado Geral de Polícia Civil do Pará Raimundo Benassuly.
Nós somos testemunhas do trabalho sério e comprometido do advogado da CPT e dos defensores públicos. Razão pela qual não temos qualquer dúvida sobre a veracidade do relato feito por eles sobre a ação violenta e truculenta do Delegado Benassuly na curva do “S”no ultimo dia 6/11. Por outro lado, não acreditamos nas explicações fantasiosas do delegado, em sua nota, divulgada por este jornal. A veracidade da referida nota não resiste a algumas perguntas obvias: 1) Se tinham crianças sendo usadas como “bucha de canhão”, como diz o delegado para interditar a estrada, por que a imprensa que esteve no local não viu nada disso? O Delegado diz que filmou tudo isso, porque não divulgou essas imagens? 2) Diz que sacou a arma para se defender de um trabalhador que o ameaçou com uma faca, porque o trabalhador não foi preso com a faca e indiciado por atentar contra a vida do Delegado? 3) Diz que o advogado da CPT estava apoiando a ocupação de estrada pelos Sem Terra, mas, quem intermediou a desocupação foi o advogado Batista e quando o Delegado chegou ao local, a estrada já estava desinterditada há várias horas. Ou seja, a nota do delegado é uma expressão do seu despreparo.
A atitude do Delegado Geral nada mais é do que uma demonstração clara de como parte da polícia do Estado do Pará tem agido durante muitos anos: de forma violenta, truculenta e na maioria das vezes contra os trabalhadores rurais. No Estado do Pará, mais de 800 trabalhadores rurais foram assassinados nos últimos 30 anos simplesmente porque estavam reivindicando os seus direitos garantidos na Constituição Federal e no Estatuto da Terra que é a reforma agrária. Na maioria dos casos, nem inquérito policial foi instaurado, outros foram mal feitos e impossibilitou a punição dos culpados pelos crimes.
A atitude do Delegado Geral da Polícia Civil do Pará na Curva do “S” no dia 6 de novembro e sua nota acusando e denegrindo a imagem da CPT, do advogado José Batista Gonçalves Afonso e dos Defensores Públicos Rossivagner e Arclébio, parece querer perpetuar a má fama de uma parcela da polícia civil do Estado do Pará. Em vez de prender assassinos e mandantes de crimes contra trabalhadores rurais. E em vez de prender os inúmeros assaltantes de bancos e das estradas que aterrorizam milhares de cidadãos do Pará, o Delegado Geral da Polícia Civil vem a público acusar quem durante muitos anos tem defendido os direitos humanos, sobretudo dos mais pobres que buscam a terra para criar seus filhos.
Nós não queremos que voltem as práticas do período da Ditadura Militar, quando policiais conversavam com trabalhadores rurais com uma arma na mão e não mediam esforços para acusar os defensores de direitos humanos. Atitude como essa, só faz denegrir ainda mais a imagem da polícia civil do Estado do Pará e a reputação daqueles que estão na instituição e são preocupados com a justiça social e a não violência.
Exigimos liberdade para os trabalhadores presos e imediata revogação do mandado de prisão das lideranças do MST! Exigimos ainda a suspensão imediata do cumprimento das liminares de despejo na região!
Marabá-PA, 16 de novembro de 2009
Federação dos Trabalhadores na Agricultura do Estado do Pará – Regional Sudeste
Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Rondon do Pará
Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Bom Jesus do Tocantins
Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Marabá
Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Nova Ipixuna
Sindicato dos Trabalhadores Rurais de São João do Araguaia
Nota da CPT Pará sobre os conflitos fundiários no Estado
“Ai daqueles que juntam casa com casa e emendam campo a campo, até que não sobre mais espaço e sejam os únicos a habitarem no meio do país”(Is. 5,8).
Nas últimas semanas temos acompanhado o agravamento dos conflitos no campo em várias regiões do Estado do Pará. Analisando o que ocorre em cada uma das regiões, percebemos que, na origem desses conflitos estão: o avanço criminoso de várias frentes (madeira, minério, pecuária e produção de energia) do poder econômico sobre as riquezas regionais e a rearticulação do setor ruralista chefiado pela CNA, aliado aos principais meios de comunicação do Estado e a maioria conservadora do poder Judiciário. O objetivo é desestabilizar o atual governo e desarticular os movimentos sociais que fazem o enfrentamento com esses setores. A opção política dos Governos Federal e Estadual, infelizmente, tem contribuído para reforçar esses grupos, que sempre dominaram a política e a economia paraense, e fragilizar a atuação dos movimentos sociais.
No Sul e Sudeste do Pará. Presenciamos a expansão indiscriminada da mineração e da pecuária. Os gigantescos projetos já implantados pela VALE já expulsou de seus lotes, cerca de 150 famílias de assentamentos de reforma agrária e a implantação de novos projetos na região, ameaça expulsar mais de 500 famílias também de assentamentos.
A nova ofensiva da pecuária na região é protagonizada pelo banqueiro Daniel Dantas, que nos três últimos anos comprou mais de 50 fazendas, acumulando uma área de 600 mil hectares de terras. Um patrimônio construído, segundo a justiça, a custa de lavagem de dinheiro. Essa frente pecuária no Sul e Sudeste do Pará tem causado não só graves danos ambientais como a destruição da floresta nativa, mas também, submetido milhares de trabalhadores a escravidão. Entre 1996 e 2008, foram libertados 11.193 trabalhadores pelo Ministério do Trabalho, sendo que, quase totalidade dos casos ocorreu nessas duas regiões.
A migração crescente para a região atraída pela propaganda enganosa dos grandes projetos agrava os problemas sociais. Como esses migrantes não são absorvidos por estes projetos não resta alternativa a não ser a terra para sobreviver. Nos últimos três anos, 66 fazendas foram ocupadas por 10.599 famílias sem terra no sul e sudeste; 101 trabalhadores e lideranças foram ameaçados de morte; 23 trabalhadores foram feridos a bala por pistoleiros e seguranças de fazendas; 17 trabalhadores foram assassinados na luta pela terra e 128 foram presos pela polícia. Os conflitos das últimas semanas que resultaram em depredações de patrimônio e interdição de estradas é conseqüência dessa violência desenfreada e impune contra os trabalhadores rurais.
Por outro lado, a resposta do governo a essa situação tem sido desastrosa: Reforma Agrária engessada, recursos públicos canalizados para atender o interesse dos grupos econômicos, negativa em defender os projetos dos Movimentos Sociais e negociar suas pautas de reivindicações, incapacidade de dialogar na solução dos conflitos e insistência na alternativa policial para resolver problema social.
Exemplo dessa política equivocada se deu no sul do Pará na penúltima semana, 5 delegados foram escalados para indiciar e prender as lideranças do MST, 10 mandados de prisão já foram decretados e três foram presos. 200 policiais da tropa de choque foram liberados para despejar mais de 2 mil famílias. O despreparo é tamanho que no penúltimo final de semana quase ocorre uma nova tragédia na Curva do “S” em razão de uma ação violenta e truculenta do Delegado Geral da Polícia Civil do Pará Raimundo Benassuly e do sub-comandante da PM, Coronel Leitão. Algo muito grave não aconteceu devido à presença, no local, do advogado da CPT e de dois defensores públicos agrários. Se a ação do delegado foi desastrosa, pior ainda foi sua reação através de nota escrita, comprovando seu despreparo, sua má fé ao falsear os fatos na tentativa desesperada de justificar sua ação. Acusou, levianamente, o advogado da CPT de rasgar o Estatuto da Criança e do Adolescente, mas, será que o delegado pensa que a sociedade já esqueceu de seu comportamento frente ao caso da adolescente de Abaetetuba? É lamentável que o governo, que se diz popular, escale esse delegado, já conhecido nacionalmente por seu despreparo para “resolver” os conflitos e falar em nome do Estado.
No Oeste do Pará. A situação é cada vez mais tensa, em conseqüência da intransigência do Governo em construir a qualquer custo a Hidrelétrica de Belo Monte. O governo ignora a inviabilidade social, ambiental e financeira do projeto. Territórios indígenas demarcados e homologados e áreas de preservação ambiental serão atingidos. Não se sabe quantas famílias serão retiradas de suas moradias. A população a ser atingida está sendo subestimada. A região da Volta Grande do Xingu ficará praticamente seca com a construção da usina ocasionando sério desastre ambiental. Os migrantes que chegarão aos milhares para a região a procura de um emprego que, em sua grande maioria, não encontrarão, terão que enfrentar a violência, o descaso e a pobreza.
Mesmo frente a esses e muitos outros problemas que as populações do Xingu tem denunciado, o governo tem ignorado e se negado a rediscutir o projeto. O autoritarismo presente nas audiências públicas realizadas é um exemplo da intransigência do governo. Frente a essa situação a tensão é crescente entre as comunidades a ser atingidas, podendo desembocar em conflitos de graves proporções.
No Baixo Amazonas. Há várias semanas que centenas de famílias da Gleba Nova Olinda, apreenderam algumas balsas carregadas de madeira no rio Arapiuns, como forma de protesto contra o desmatamento de seus territórios e falta de regularização fundiária. As famílias exigem a suspensão de todos os planos de manejo existentes na área, a regularização e demarcação pela FUNAI, das terras indígenas Maró; a retirada dos grileiros e madeireiros da Gleba; a ampliação do projeto de assentamento agroextrativista de Vista Alegre, etc.
A morosidade e omissão do governo em solucionar o problema provocou a insatisfação das famílias que incendiaram, no ultimo dia 10, duas balsas carregadas de madeiras que estavam bloqueadas desde o dia 17 de outubro. Paciência tem limites! Os moradores acusam a Secretaria Estadual de Meio Ambiente do Pará de permitir manejo irregular no território que reivindicam como posse das comunidades tradicionais.
Encurralado pelos ruralistas e pelos principais meios de comunicação do Estado, que nada mais são que empresas de comunicação a serviço dos interesses dos grandes grupos econômicos cujo papel é criminalizar as lutas sociais, o Governo tem assumido uma postura de distanciamento dos principais movimentos que fazem a luta no campo. Ao invés de fortalecer as políticas voltadas para a população camponesa, o governo tem se curvado às pressões do setor ruralista e viabilizado seus interesses. A negociação do TAC dos latifundiários infratores processados pelo MPF, a mudança na legislação fundiária estadual que permite a regularização de terras públicas até 2.450 hectares para os ocupantes ilegais, as concessões em favor da implantação da siderúrgica da VALE em Marabá, a prisão de 18 integrantes do MAB em Tucuruí, o pedido de prisão das principais lideranças do MST no sudeste, são alguns dos tantos exemplos desta equivocada política do Governo Estadual.
Frente a esse quadro a Comissão Pastoral da Terra (CPT) reafirma seu apoio:
• A todos os trabalhadores vítimas de criminalização por lutarem pela defesa de seus direitos;
• A luta dos quilombolas e indígenas em favor do respeito e demarcação de seus territórios e contra os grandes projetos que impactam suas terras;
• A revogação imediata dos mandados de prisão decretados contra lideranças do MST e liberdade para os trabalhadores presos;
• A luta pelo fim da impunidade dos crimes cometidos contra trabalhadores rurais e lideranças a mando de fazendeiros e madeireiros;
• Ao trabalho da defensoria agrária nas mediações dos conflitos.
• A defesa da Reforma Agrária, do meio ambiente e da agricultura familiar/camponesa.
Belém, 13 de novembro de 2009.
Comissão Pastoral da Terra – Regional Pará