Sem Terrinhas lutam por escolas do campo
Por Vanessa Ramos e Meire Cardoso
Da Página do MST
O 12 de outubro deixa a criançada ansiosa, louca por presentes. Não importa em que dia da semana será comemorado o tradicional Dia das Crianças, a data é sempre motivo de muita festa e de diversão. Certo? Mas não é só isso.
Para as crianças Sem Terrinha, filhos de acampados e assentados do MST, o Dia das Crianças é muito mais que ganhar presentes.
O mês de outubro é, principalmente, referência de luta das crianças, quando fortalecem a identidade da criança Sem Terra e realizam uma grande festa, onde também trocam experiências culturais.
Por isso, desde 1994, o MST promove atividades com os Sem Terrinha.
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“A criança Sem Terrinha vem ocupando e construindo a sua organização no processo de luta do MST e sua identidade vai sendo forjada. Creio que um Sem Terrinha é uma criança organizadora, decidida, com personalidade e que não tem vergonha de dizer que está na luta para ter a terra”, afirma Márcia Mara Ramos, do setor de educação do MST.
A seguir, leia a entrevista concedida à Pagina do MST.
Qual é o objetivo da jornada das crianças do MST neste ano?
A jornada Sem Terrinha tem buscado dar conta de alguns objetivos gerais, embora cada Estado realize o encontro de acordo com a sua realidade. Mas, de um modo geral, o que buscamos é realizar uma grande festa de socialização das experiências educativas e culturais das crianças, com isso valorizar a organização dos Sem Terrinha nos acampamentos e assentamentos e assim fortalecer a identidade Sem Terra. E ao mesmo tempo, os encontros têm como objetivo negociar com as autoridades locais e estaduais as demandas de escola, espaços de lazer para as crianças e infraestrutura geral nos assentamentos.
Que temas serão debatidos?
A jornada mantém o tema “Por escola, Terra e Dignidade”, que continua muito atual. A luta por escola é uma necessidade permanente, dado que muitas escolas estão sendo fechadas no campo. Muitos de nossos assentamentos não têm escolas. E os que têm a infraestrutura é precária e com o atendimento somente nos anos iniciais do Ensino Fundamental.
Quantos estados e crianças vão participar dessa atividade neste ano?
Em geral, todos os estados se mobilizam de alguma forma nessa data. No momento temos informações de 18 estados que vão realizar os encontros, reunindo 12 mil crianças em todo o Brasil. Mas acreditamos que esse número pode ser ainda maior, sentimos muita animação com a jornada.
Por que o MST promove a jornada dos Sem Terrinhas?
A Jornada Nacional dos Sem Terrinha foi sendo construída ao longo da historia do MST com a participação permanente das crianças na luta pela terra, demarcando o território na luta pelo direito à escola desde o acampamento ao assentamento e assim construindo a identidade de Sem Terrinha.
A jornada é organizada a partir dos Encontros de Sem Terrinha nos Estados, com ações locais, regionais e estaduais, mas tem caráter nacional. Os encontros são espaços de socialização de conhecimentos, de brincadeiras, de reivindicação e de muita festa, alegria e compromisso que são firmados diante esse coletivo de crianças.
E esse espaço para as crianças é muito importante. Lembro do Sem Terrinha Luciano, de Pernambuco, por exemplo, que quando participou pela primeira vez do encontro relatou que tudo era muito bonito, que nunca tinha visto tanta criança junta e que iria continuar lutando porque era Sem Terrinha e tinha orgulho disso. É dessa forma as crianças que participam se comprometem com a Jornada Nacional dos Sem Terrinha.
Assim, a Jornada Nacional é um espaço de brincar, socializar, “arquitetar” planos e fazer um grande encontro de reivindicação, diante dos poderes públicos exigindo a efetivação dos direitos da criança e do adolescente.
Como surgiu a ideia de criar uma jornada de crianças?
O MST, sendo um movimento camponês, não surge para pensar a criança especificamente. Mas a realidade concreta da luta pela terra foi colocando para o movimento a necessidade de ter escolas dentro dos acampamentos e assentamentos.
É nessa realidade que o trabalho com as crianças no movimento vai sendo construído. A necessidade de ter uma escola que não seja discriminadora, que permita que as crianças sejam críticas e possam falar, ter opiniões que respeitem a sua luta levou o MST a discutir com as crianças sobre os seus direitos.
E daí, a organizar idas até as prefeituras, secretarias de Educação para colocar os problemas cotidiano da vida coletiva das crianças Sem Terra, como a falta de assistência médica, falta de escolas, transporte escolar, estradas, merenda escolar e tantas outras reivindicação que estão na pauta nos dias de hoje. A criança no MST está sempre na luta.
Como se constrói a identidade dos Sem Terrinha?
A criança Sem Terrinha vem ocupando e construindo a sua organização no processo de luta do MST e sua identidade vai sendo forjada. Creio que um sem terrinha é uma criança organizadora, decidida, com personalidade e que não tem vergonha de dizer que está na luta para ter a terra, ou que mora no assentamento.
Os Sem Terrinha são crianças da classe trabalhadora que tem um espaço de criação, de reflexão, de brincadeiras e de muita seriedade. As crianças Sem Terrinha têm, nesse lugar, a referência para sua vida, sabem que a ocupação da terra que deu origem ao seu território é necessária para que outras crianças no Brasil tenham casa, terra e dignidade e possam se encontrar para brincar e crescer. Como disse o Tiago, uma criança de 11 anos: “Sou Sem Terra, sou da terra, vou ter casa, vou crescer, vou ter asa, correndo e pulando”.
Qual o papel da infância no MST?
É um desafio pensar a infância na perspectiva de um projeto de emancipação humana. O MST fazendo a luta pela terra no Brasil vai constituindo um lugar para a criança Sem Terra como sujeito que vai aprendendo a lutar e a construir junto com a comunidade do acampamento e assentamento. Uma das grandes conquistas das crianças Sem Terrinha é ter desafiado o próprio movimento a produzir um Jornal e uma Revista das Crianças Sem Terrinha.