Código Florestal, CNA e a privatização cinza da Embrapa
Por Vicente Almeida
Pesquisador da Embrapa e presidente do Sindicato Nacional
dos trabalhadores de Pesquisa e desenvolvimento Agropecuário – SINPAF
Por Vicente Almeida
Pesquisador da Embrapa e presidente do Sindicato Nacional
dos trabalhadores de Pesquisa e desenvolvimento Agropecuário – SINPAF
No decorrer de vários meses a sociedade brasileira vivenciou o esforço da comunidade científica nacional na tentativa de subsidiá-la frente à necessária composição entre a produção de alimentos e o equilíbrio ambiental.
A Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC) e a Academia Brasileira de Ciências (ABC), ao cabo de vários meses e rigoroso trabalho – que contou com a contribuição de pesquisadores da Embrapa, concluiu pela inadequação das proposições apresentadas pelo deputado Aldo Rebelo para alteração do Código Florestal.
As contribuições estão acessíveis em página da SBPC (clique aqui) e certamente expressam uma unidade consistente da ciência e da academia frente ao tema.
Entretanto, antevendo a sua conclusão e na contramão de relevante estudo, a Confederação Nacional da Agricultura (CNA), parte interessada no tema, firmou um contrato milionário com a Embrapa para “viabilizar soluções que compatibilizem os sistemas de produção e preservação em diferentes paisagens brasileiras, fortalecendo o uso do componente arbóreo na propriedade rural”, coordenado pela Embrapa Floresta, na cidade de Colombo – PR.
Infelizmente, em que pese a reconhecida seriedade e desejo dos mais de 240 trabalhadores pesquisadores envolvidos no projeto com duração prevista de nove anos – e valor estimado de 20 milhões de reais, a Senadora Kátia Abreu, por diversas vezes e em diversos canais de comunicação, tem usado inescrupulosamente o referido contrato CNA/Embrapa como arma de fogo contra o Código Florestal Brasileiro.
Denuncias de pesquisadores da Embrapa vinculados ao projeto em todo país chegam ao SINPAF dando conta de que os objetivos do projeto, em diversos momentos, foram conduzidos à condição de alavanca dos interesses da CNA nas alterações do Código Florestal. Relatam, ainda, constrangimentos impostos àqueles que se posicionaram de forma mais crítica na sua condução. Há poucos meses atrás, o cerceamento de pesquisadores da Embrapa em debate sobre o Código Florestal no congresso foi denunciado por jornais de grande circulação nacional.
O SINPAF solicitou audiência emergencial com o ministro da Agricultura, Wagner Rossi, para tratar do tema há mais de 30 dias e até o momento não obteve retorno do gabinete.
A pergunta que se faz agora é: por que, diante de tamanha importância e urgência do tema, a Embrapa ainda não se posicionou de forma pública e oficial sobre o Código Florestal? Será que lhe falta competência? Será que o documento da SPBC e ABC subscrito pelos pesquisadores da Embrapa representa o seu real posicionamento institucional ou foi apenas “política de boa vizinhança”? Será que seu “silêncio ensurdecedor” contribui com a sociedade ou apenas coaduna com os interesses da CNA, sua interessada “investidora”?!
Para que estas dúvidas sejam sanadas a Embrapa deve afirmar com clareza límpida sua posição institucional junto ao estudo produzido por seus pesquisadores em articulação com a SBPC e ABC, através de urgente nota técnica pública oficial emitida pela presidência da Embrapa, sob pena da CNA e da Senadora Kátia Abreu, e quem mais se arvorar, usarem indistintamente as contribuições dos seus trabalhadores de pesquisa e o nome da própria instituição indevidamente.
Não aceitaremos que a CNA queira impor uma privatização cinza à Embrapa, antecipando aqui e alhures resultados de pesquisas que somente daqui a nove ou dez anos terão algo a comentar de significativo sobre o tema, segundo os próprios pesquisadores mais otimistas envolvidos no citado projeto.
De outra forma, a Embrapa demonstrará sua tibieza frente às pressões econômicas; uma inexplicável desconsideração de seu quadro técnico profissional e descortinará, de uma vez por todas, sua subserviência a uma agricultura lobista, alheia à grande maioria dos interesses do povo brasileiro, que pensa poder “comprar” a Embrapa e seus pesquisadores trabalhadores com contratos milionários pagos com dinheiro sujo vindo do trabalho escravo, do desmatamento e da contaminação dos alimentos e de nossos recursos naturais.
Uma empresa pública deve estar voltada para o interesse público. O governo brasileiro deve entender que a Embrapa não pode e não deve, para seu bem e para o bem do país, ser amordaçada e silenciada por setores conservadores ainda presentes no Ministério da Agricultura, em que pese os esforços atuais de democratização da gestão pública e abertura de seu conselho administrativo.
Os trabalhadores da Embrapa exigem um posicionamento público da empresa sobre o código florestal de forma a resguardar a seriedade de seu trabalho e a valorização de seu esforço em prol de uma agricultura forte e ambientalmente equilibrada.
Somos pelo lobby da pesquisa e não pela pesquisa do lobby!