Preservação da RL e APP aumenta retorno econômico

 

Por Luiz Felipe Albuquerque
Fotos Douglas Mansur
Da Página do MST

 

 

Por Luiz Felipe Albuquerque
Fotos Douglas Mansur
Da Página do MST

 

O professor e pesquisador da Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiróz (Esald/USP), Paulo Kageyama, defende a importância de conciliar tanto as Áreas de Proteção Permanente (APPs) quanto as áreas de Reserva Legal (RL) para avançar a atividade agrícola e aumentar o retorno econômico dos agricultores. 

Paulo Kageyama apresenta dados para demonstrar o ganho na produtividade que a biodiversidade nativa pode proporcionar, com a diminuição ou extinção de pragas e doenças nas áreas agrícolas, graças ao equilíbrio que tal metodologia propicia ao ecossistema.

O professor compara dois tipos de produtividade: de um lado o sistema convencional, com média de 36 aplicações de veneno em dois meses. Do outro o Sistema Agro-Florestal (SAF), no qual se combina a utilização de árvores com a plantação de alimentos. “É o modelo mais avançado que existe”, segundo o pesquisador, na agricultura tropical.

Os estudos de Kageyama apontam que a cada mil pés de tomates plantados, a agricultura convencional colhe 200 caixas ante 50 da agricultura orgânica – quatro vezes menos. Todavia, o custo de produção da primeira é de R$ 5.000, com um retorno econômico de R$1.000 reais ao agricultor. O custo de produção da orgânica é de R$ 700 por mil pés – sete vezes menos –, com um retorno econômico de R$ 800.

No caso da produção de bananas no Vale do Ribeira, por exemplo, num sistema de agrobiodiversidade que conta com cerca de 40 outras espécies, Kageyama apresenta outra disparidade entre os modelos de produção.

No modelo convencional são utilizados 30,6 quilos de agrotóxicos, enquanto no sistema SAF apenas 6,8. O primeiro apresenta um custo de produção de quase R$ 8.000 por hectare, com rendimento de R$ 1,8 mil por hectare. Já o custo de produção do SAF encontra-se no patamar de R$ 172 por hectare, ou seja, 46 vezes menos, tendo ainda uma rentabilidade de R$ 2,5 mil por hectare ao agricultor.

Esses dados demonstram a real diferença existente entre os modelos de agricultura. “Estamos questionando o modelo, na verdade. É o agronegócio versus a agricultura agroecológcia. Essa agricultura que estamos propondo, somente pode ser utilizada pela agricultura familiar”, sustenta Kageyama.

Código Florestal é desenvolvimento

Luiz Zarref, dirigente da Via Campesina Brasil, procurou destacar o papel progressista que fora a criação do Código Florestal, em 1965, com a subordinação da propriedade privada aos interesses da sociedade brasileira. “Não é uma lei exclusivamente ambientalista. Ela é uma lei de desenvolvimento do país.”

Zarref destacou dois pontos fundamentais do Código Florestal para o debate: a função social da propriedade, que faz das “florestas bens e interesses da sociedade brasileira”. E a produção agrícola é aliada da preservação das florestas.

“A importância da Reserva Legal é fundamental para a luta agrária desse país. Não é à toa que o agronegócio quer destruir”, observa Zarref.

Uma vez que a Reserva Legal não é respeitada, a dívida do agronegócio está estimada em R$ 80 bilhões, segundo o Ministério do Meio Ambiente. “É uma questão ideológica: querem acabar com a função social da propriedade”, ressalva.

Ele acredita ainda na necessidade de se criar políticas para que se permita uma real utilização das APPs e das RLs pelo agricultor, de modo que se concilie a produtividade juntamente com as áreas de preservação.

“A área de uso sustentável não é para ser cercada do agricultor. Tem que ter política para que a floresta possa ser utilizada produtivamente. Essa parte da natureza produtiva é fundamental para que nós possamos defender o Código Florestal de forma correta”, defende Zarref.

Reforma do Código

Para Zarref, a perspectiva que os apoiadores do novo Código estão colocando é que os pequenos agricultores iriam se inviabilizar com a manutenção do código atual, pelo fato de muitos também não terem cumprido com as exigências de preservação ambiental. “Defendemos justamente ao contrário. Se essa proposta passar, daqui a dez anos nós teremos milhares de camponeses sendo expulsos do campo, pela improdutividade de suas terras”.

Ele destaca ainda a possibilidade que essa revisão do Código permite, podendo compensar a área devastada fora da microbacia, em qualquer lugar do bioma, que teria impactos negativos.

“O impacto disso na luta pela terra nesse país é gigantesco. As terras mais baratas são as terras dos camponeses, porque historicamente foram expulsos das terras mais férteis. Irá ter um aliciamento gigantesco em cima dos agricultores para venderem suas terras. Vai ter latifúndio improdutivo dizendo que é Reserva Legal em recuperação”, aponta.

Outra proposta presente na revisão do Código é a possibilidade de poder recompor as APPs de inclinação, de topos de morro e de borda de chapada, com as culturas lenhosas perenes, em até 50% de sua área, utilizando-se do discurso de recompor as áreas com espécies exóticas e frutíferas, como o café e a uva. As papeleiras seriam as grandes beneficiadas com tal medida, segundo Zarref, já que elas se aproveitariam para plantar eucaliptos e pinos.

Além de tudo, os que recomporem suas áreas dessa maneira, ainda teriam direito a créditos com juros mais baixo e prioridade no seguro agrícola, podendo, inclusive, deduzir do Imposto de Renda.

Código e a cidade

A professora da Faculdade de Arquitetura da USP Ermínia Maricato, por sua vez, destaca para a necessidade de buscar a unidade entre o urbano e rural sobre a discussão ambiental, tendo em vista que a questão ambiental conseguiu entrar na agenda política do país, enquanto a questão urbana ainda é deixada de lado.

Ela criticou o fato do Código Ambiental não abordar a questão urbana, levando em conta que mais de 80% da população do país está na cidade. Entretanto, tal temática não pôde ser colocada em discussão, pois neste caso “os ruralistas levariam a melhor.”
“Nós recuamos em nome da unidade. Preferimos manter o código atual a dar oportunidade aos ruralistas”, aponta. 

No que diz a questões urbanas, Maricato aponta para a falta de controle sobre o uso sem regulação do solo, aliada à especulação imobiliária que, enquanto é considerada progresso para alguns, desloca a população de baixa renda para áreas de mananciais, principalmente para a região sul do Estado de São Paulo.

“A terra é o negócio do Brasil, e o mercado não inclui a população com até três salários mínimos. A população pobre ocupa o que sobra: áreas de proteção ambiental, que não interessam ao mercado imobiliário”, observa.

A professora avalia que é necessário pensar o urbano como um universo específico, não deixando de lado a inter-relação existente com o campo. “O Código Florestal é insuficiente. Ele precisa dialogar com a cidade. Temos de achar o caminho da unidade e independência”, acredita.