“Mobilizações abrem necessidade de debater Reforma Agrária”, diz Stedile
Da Página do MST
Em entrevista coletiva concedida aos veículos alternativos presentes na 12ª Jornada de Agroecologia, João Pedro Stedile, da coordenação nacional do MST, avaliou a conjuntura do país criada pelas manifestações nas ruas e como elas afetam pautas históricas dos movimentos sociais, como a Reforma Agrária e a democratização dos meios de comunicação.
Confira abaixo a entrevista:
Qual a situação da Reforma Agrária?
A Reforma Agrária está parada desde o governo Lula, por vários motivos, como a pressão do capital que disputa a grande propriedade improdutiva, a falta de verbas do Incra e a aliança político-eleitoral que sustenta o governo, ao ter os ruralistas como sua base.
Nesse ano não houve nenhum projeto de assentamento ou desapropriações de terras no Brasil. Na nossa base, temos por volta de 120 mil famílias acampadas, é um absurdo. Vamos ter uma reunião com a Dilma e cobrar que as políticas públicas sejam alteradas.
Ninguém aguenta mais esta situação no campo. A Reforma Agrária precisa de um impulso, e acredito que as mobilizações recentes ocorridas nas ruas vão ajudar a dar uma sacudida no país e obrigar a necessidade de se abrir um debate sobre as políticas estruturais do país como a Reforma Agrária.
Quais as principais ofensivas do agronegócio nesse momento?
A principal ofensiva dos capitalistas é a disputa pela terra, pela água e pelas mercadorias agrícolas. Daí a ofensiva contra o antigo Código Florestal e, agora, a ofensiva contra as áreas quilombolas e indígenas.
Além disso, há o debate em torno do Código de Mineração, fruto de articulação do capital com o ministério de Minas e Energia para ser aprovado em regime de urgência na Câmara, evitando o debate com a sociedade. Se for aprovado desta forma, esse código será um desastre, dando às empresas estrangeiras segurança jurídica para explorar o subsolo.
Como você avalia as manifestações ocorridas no Brasil?
Essas manifestações oxigenaram a política brasileira e abriram um novo ciclo de debates, e cada vez que um novo ciclo se abre, ele demora a desaparecer. O que se levantou nas ruas não é algo que irá acabar nas próximas eleições. Analisamos que esse ciclo vai trazer mudanças, queira o Congresso ou não.
Temos feito um esforço para que os setores organizados da classe trabalhadora e movimentos sociais se apresentem de forma organizada nesse clima, apresentando um programa de mudanças para a sociedade por meio de jornadas de lutas e manifestações, como fizemos no dia 11 de julho e vamos fazer novamente no dia 30 de agosto.
As manifestações pressionam o governo a dar um passo à esquerda?
Na cabeça do governo estava tudo arrumadinho: a popularidade da presidenta em alta e o pacto de classes que sustenta o governo sob controle. As manifestações mostraram a fragilidade deste pacto.
A presidenta tentou dar este passo quando anunciou as medidas de convocar a Constituinte e o plebiscito, mas foi derrotada por seus ministros e sua própria base parlamentar. O que eu acho positivo é que o tema foi para a rua, e isso abre um espaço de debates sobre a reforma política, a constituinte e o plebiscito popular.
Queremos, inclusive, fazer um plebiscito perguntando à sociedade se ela quer reforma política ou não. O Ibope fez essa pergunta semana passada e deu que 85% da população quer a Constituinte.
Por que o governo tem dificuldades em pautar a democratização dos meios de comunicação?
Não tocar neste tema faz parte dessa aliança de classe do governo. Os meios de comunicação do Brasil se transformaram numa arma da burguesia, num negócio que lucra financeiramente e reproduz as ideias da classe dominante.
O tema da democratização da comunicação é muito parecido com a Reforma Agrária, porque ele propõe democratizar algo que a burguesia tem como seu patrimônio sagrado. Mas o movimento social está colhendo assinaturas para levar um projeto de lei popular ao Congresso. E só vamos conseguir esta democratização com um amplo movimento popular, nas ruas.
E as manifestações das ruas vão nesta direção. Não é à toa que vários protestos terminaram na porta da Globo. E agora a juventude marcou uma jornada dos estudantes pela democratização da mídia e contra a Globo, de 28 de agosto a 5 de setembro. Essa luta está só começando.