Stedile: “Movimentos tem de mostrar que o agronegócio não é o futuro”
Da Página do MST
Nesta quinta-feira (06/02), João Pedro Stedile, da coordenação nacional do MST, participou de uma coletiva de imprensa que pautou o 6° Congresso Nacional do Movimento, que será realizado entre os dias 10 a 14/02.
Stedile analisou os desafios da luta pela Reforma Agrária, as mobilizações da classe trabalhadora para o próximo período e a importância de uma reforma política para o Brasil.
Da Página do MST
Nesta quinta-feira (06/02), João Pedro Stedile, da coordenação nacional do MST, participou de uma coletiva de imprensa que pautou o 6° Congresso Nacional do Movimento, que será realizado entre os dias 10 a 14/02.
Stedile analisou os desafios da luta pela Reforma Agrária, as mobilizações da classe trabalhadora para o próximo período e a importância de uma reforma política para o Brasil.
Segundo ele, a Reforma Agrária está paralisada por vários fatores. “Existe uma pressão grande do capital financeiro, que domina a agricultura através do agronegócio e das empresas transnacionais. O governo se tornou refém do agronegócio. Como a Kátia Abreu pode ser base desse governo, se ela assinou o impeachment do Lula?”, indaga.
Segundo o Sem Terra, a composição conciliadora dos governos Lula-Dilma não dá mais certo, já que as políticas paliativas não dão mais conta de resolver as pressões sociais.
Além disso, a mídia, que noticiava as lutas sociais, “tem feito campanha sistemática para desmobilizar e criminalizar as lutas, para que os trabalhadores nem pensem em se mobilizar e protestar. Por fim, a letargia da Reforma Agrária também é fruto das derrotas políticas sofridas pela classe trabalhadora”, acredita.
Para reverter esse quadro, Stedile acredita que apenas fortes mobilizações poderiam mudar essa correlação de forças. “Temos de mostrar que o agronegócio não é o futuro. Importamos 21 milhões de toneladas de fertilizantes. É um modelo que não se sustenta e uma hora vai estourar. Os trabalhadores vão voltar a se mobilizar, e a união da classe trabalhadora vai dar gás para a Reforma Agrária”.
Ano da agricultura familiar
A Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura (FAO) definiu que 2014 será o ano da agricultura familiar. Para Stedile, essa decisão é muito positiva para a luta camponesa.
“As contradições do agronegócio estão cada vez mais claras. A fase em que o mundo acreditava que o agronegócio iria salvar o mundo passou. Seus efeitos negativos se evidenciam cada vez mais. A prova disso é apresentada nesse tipo de atitude. É muito importante que a FAO, que representa os governos do mundo, tome essa decisão, pois é uma demonstração clara que os governos não acreditam no agronegócio”.
Paralelamente, outro ponto que segue essa mesma linha é o fato do Vaticano também ter declarado que este ano seria o ano mundial contra a fome, valorizando o camponês e a cultura tradicional. “Esperamos que mais manifestações como essas aflorem e que governos desenvolvam políticas de fomento à agricultura familiar”, ressaltou.
Copa do Mundo
Entre as perspectivas de luta para esse ano, Stedile é otimista e já apontou para as mobilizações organizada pelas mulheres, em março, e as mobilizações unificadas entre as centrais sindicais para o dia 9 de abril.
“Há problemas estruturais latentes na sociedade, e a juventude também vai se manifestar nessa época”, acredita, que somado aos programas de mudanças dos movimentos sociais, pode-se multiplicar as mobilizações e colocar essa plataforma de mudanças em pauta.
Entretanto, não aposta que haja grandes mobilizações durante a Copa do Mundo. “A Copa é que nem carnaval. Alguém vai marcar mobilização durante o carnaval?”.
“Além disso, os 8 bilhões que o governo usa na reforma dos estádios equivalem a duas semanas de juros que o governo paga para os bancos. É um erro colocar todos os problemas políticos do país na reforma dos estádios. A classe trabalhadora deve se mobilizar para resolver seus problemas, e a Copa não interfere muito nisso”, pontua.
Dentro dessa linha, muitos dos problemas estruturais só poderão ser resolvidos com uma reforma política. Nesse sentido, a campanha por um plebiscito popular, que paute a reforma política na sociedade, será um dos principais focos dos movimentos sociais neste ano.
“Com a via institucional bloqueada, temos que mobilizar e conscientizar a sociedade, debater os rumos do país com o povo. Vamos fazer pressão política para arrancar dos políticos o compromisso da constituinte. Se conseguirmos 20, 30 milhões de assinaturas, levamos isso aos três poderes. E se não houver uma assembleia para pensar a reforma política, o país vai entrar em uma grande crise política”, avalia.
Ditadura Militar
Quando perguntado sobre o golpe militar, que completa 50 anos em 2014 e os impactos do período para a Reforma Agrária, Stedile afirmou que o golpe acabou com a possibilidade de se fazer uma Reforma Agrária tradicional.
“No Período Goulart chegamos próximos de fazer a Reforma Agrária clássica. O projeto de Celso Furtado em 64 era radical, prevendo desapropriações de todas as áreas com mais de 500 hectares. Era uma reforma que dependia da aliança da burguesia industrial com o campesinato para enfrentar o latifúndio e criar um mercado interno forte”.
Porém, essa Reforma Agrária não se viabilizou, não sendo mais possível uma Reforma Agrária desse tipo, “porque quem controla o país hoje são os bancos e o capital financeiro, que não precisam de mercado interno de alimentos, querem apenas exportar commodities”.
Diante desse novo contexto é que o MST construiu o programa da Reforma Agrária Popular, uma nova leitura de realidade agrária brasileira. “A luta não é mais só por terras. Nos últimos 10 anos, a agricultura sofreu mudanças estruturais por conta do capital financeiro e produz lucro, não alimento. A nossa luta hoje é também pela agroecologia, por mais agroindústrias para os camponeses, uma educação rural que dialogue com a realidade do campo, enfim, por condições dignas de vidae produção para os agricultores familiares”, coloca.
Ainda em relação ao período militar, Stedile disse que o MST está em diálogo com Maria Rita Kehl, integrante da Comissão da Verdade que será responsável pelo relatório dos assassinatos no campo.
“Entregamos os dossiês que temos para ela. O Estado tem uma grande dívida com camponeses mortos, cujas famílias até hoje não tiveram nenhum tipo de reparação. Esperamos que o Estado faça justiça aos camponeses perseguidos pela ditadura. A repressão foi massiva, mais de 1600 camponeses foram assassinatos no campo e apenas 60 casos foram julgados”.