A obstinação tecnicista e a formação bancária no campo
Por Vinicius Borba*
Da Revista Fórum
A presidenta Dilma defendeu o “Brasil, pátria educadora” em seu discurso de posse no dia primeiro. Observamos com cautela o que isso significa, apesar de convictos da importância de se educar muita gente por aí. Mas alguns “expoentes”, para bem ou mal do país, já demonstram a que vêm. Recém empossada, e evitando tratar de polêmicas como a existência ou não de latifúndios, a nova ministra da Agricultura e Pecuária, Kátia Abreu (PMDB-TO), determinou suas metas de educar para incluir cerca de 800 mil trabalhadores rurais, a quem definiu como classe C.
“Vamos de porteira em porteira”, afirmou. A dúvida é: que tipo de educação rural vai levar a essas porteiras na inclusão dessas pessoas. O ódio à esquerda, ao PT e aos povos tradicionais? Ou o ranço ruralista e udenista contra as classes trabalhadoras?
— Vamos de porteira em porteira atrás dessas pessoas buscando e levando uma revolução em tecnologia para que eles possam ascender socialmente e ter uma renda mais elevada — disse Kátia Abreu em sua posse no Ministério.
Estou sinceramente curioso e preocupado para saber qual o objetivo da presidenta Dilma ao buscar esse tipo de “apoio” para a gestão do cargo de ministra da Agricultura. Num setor tão estratégico do país, ter habituais adversárias/os das causas populares dessa natureza como aliados já não é compreensível, quem dirá com as mãos em todo o recurso para promover a Assistência rural técnica tendo como filosofia de base o capitalismo extremado da revolução verde, a transgenia e o agrotóxico como base. Se for por aí, presidenta Dilma, acho que devemos repensar nossa construção de identidade de Partido dos Trabalhadores.
O nome começa a ficar de fato incoerente, quando ao fim e ao cabo do processo, a massa atendida avança de classificação em letras mas não é ouvida, preparada para entender as consequências dos próprios atos e essa formação só prepara para reproduzir os cânceres que o sistema agroindustrial brasileiro hoje propaga.
Aliás, para a classe trabalhadora depois não há hospitais Albert Einstein. O SUS avançou muito, mas terá que melhorar muito mais para atender a explosão cancerígena que esse tipo de alimento nos traz à mesa todos os dias.
Incentivar com a liderança de alguém que propugna ódios aos povos tradicionalmente habitantes de nossas terras, estimula ainda mais este tipo de ponto de vista.
A premiação do ódio, potencializado por Kátia Abreu com cargos do primeiro escalão não pode ser compreendido como algum tipo de concessão ao setor produtivo, se não como um erro crasso. Essa falha estratégica há de custar ainda mais caro às bases de um projeto antes pensado para construção democrática e popular.
O Projeto pensado pelo PT incluiu milhões, sim, mas pela forma acrítica como o fez, criou um contingente de combatentes do próprio regime democrático, como se outra solução qualquer fosse de fato viável sem um novo período de trevas. Ditadura que a senhora, presidenta Dilma, a duríssimas penas combateu, e sofreu as consequências destes outros tempos.
É hora de mudarmos essa postura senhora presidenta, seguir com esse despautério pode custar muito, mas muito mais caro às bases populares que a reelegeram, e por consequência tornar inviável o próprio projeto de nação com a classe trabalhadora sendo preparada para entender e se posicionar nesse processo de inclusão. A
bancarização da educação, denunciada por Paulo Freire, deve ser lembrada para que, nesse processo de criação de uma Pátria Educadora, não se forme uma massa ainda maior de oprimidos que sonham tornar-se opressores e destruidores do planeta.
Sob pena de fortalecermos um desenvolvimento totalmente insustentável, e alinhar a nação brasileira ao péssimo exemplo de grandes países, que de potências tornaram-se vilões mundiais.
O genocídio de nossos índios e quilombolas, espalhar agrotóxicos no Brasil (ainda mais) e distribuir a quimioterapia das próprias indústrias que criam o transgênico e o agrotóxico, não nos parece uma grande “revolução em tecnologia” para nossa agricultura e os trabalhadores e trabalhadoras rurais do Brasil.
Mas é um verdadeiro crime contra nossa humanidade, deles que produzem e de nós que consumimos e dependemos de seus produtos. A transição de que falamos não é meramente de classe, mas da produção agrotóxica para a agroecológica. O Brasil pode mais. E muito, mas muito melhor.
(*) Vinicius Borba é jornalista, ativista cultural e poeta da periferia do DF