A ocupação de terras e prédios públicos tem apoio na lei

Os protestos dos movimentos populares têm sólida e legítima base justa, constitucional, legal e ético-política.

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Por Jacques Távora Alfonsin

Fotos: Mídia Ninja

A mídia está divulgando neste 3 de agosto, a movimentação do MST, ocupando prédios públicos em vários Estados da Federação. Qual a motivação explicativa ou justificativa desse tipo de protesto?

As respostas se dividem, na maioria contrárias, mas as poucas favoráveis denunciam uma injustiça social refletida em décadas de promessas legais de solução repetida e injustificadamente traídas; tanto pela preferência das administrações públicas em implementar políticas opostas às mudanças estruturais exigidas pelo acesso à terra, previstas na Constituição Federal, no Estatuto da Terra e em diversas outras leis, quanto pelo bloqueio judicial.

 

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Esse está quase todo ele pouco preocupado com as urgências inerentes às necessidades vitais de milhões de brasileiras/os sem-terra ou dela expulsos por uma economia social e ambientalmente predatória, coberta por uma aura cultural e ideologicamente cevada como imune a qualquer contestação.

É ela a garantia das divisas – haja ironia nessa expressão – julgadas indispensáveis à afirmação do poder do Brasil no mercado externo, tão defendidas e elogiadas pelo agronegócio exportador, por menos que elas “dividam” aqui dentro o necessário à supressão da nossa injusta desigualdade social, embora aí se encontre a prova do desrespeito ao próprio conteúdo dos direitos humanos fundamentais sociais.  

Em nome do “respeito devido à lei”, é possível manter essa desordem institucionalizada, como dizia Roberto Lira Filho, como se ela fosse ordem e pressuposto de segurança, escolhendo com cuidado somente a parte dela com poder suficiente para explicar e justificar a conservação da terra exatamente como está.

Preservando assim apenas na letra da lei a reforma agrária, mistifica-se todo um projeto de mudança sem outro objetivo senão o de neutralizá-lo indefinidamente, para não efetivá-lo. Fingindo adesão  à uma reivindicação secular expressa todos os dias em protestos como o realizado hoje, passa-se a impressão de respeitar a democracia,  o direito legítimo da liberdade de reunião (artigo 5º. Inciso XVI) e de locomoção (artigo  5º, inciso XV) da Constituição Federal.   

Cabe questionar-se, então: quando grande parte do vozerio midiático se escandaliza com gestos de protesto como os realizados hoje pela reforma agrária,  em boa parte do Brasil, alguém já parou para pensar um pouco nos princípios constitucionais da administração pública, à ela impostos como soleníssima obrigação?

Moralidade e eficiência, por exemplo, estão lá no artigo 37 da mesma Constituição, como as disposições sobre reforma agrária, política agrícola e fundiária, dos artigos 184/194 da Constituição, com a intenção de, embora princípios (!), não começarem nada?
 

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E a função social do direito, do Estado, da sociedade civil toda, da propriedade privada, também não deve e não pode se efetivar para prevenir a necessidade –  mais justa e legítima do que  legal –  desses protestos serem realizados em defesa da vida, da liberdade, da dignidade humana, dos direitos humanos fundamentais sociais para garantia dos quais ninguém está isento de responsabilidade, muito menos a lei e as instituições?

A perguntas incômodas como essas, não se permitem nem ser formuladas quanto mais bem e satisfatoriamente serem respondidas, nisso se infringindo outro direito, o da informação e outro  princípio, o da publicidade.

Não há qualquer ilegalidade, assim, nesses protestos populares como os da ocupação de terra e prédios públicos, quando eles estiverem sustentados por inquestionável necessidade, sempre que essa, a não ser satisfeita,  esteja pondo em risco a vida, a liberdade, a dignidade humana e a cidadania das/os manifestantes.

Se eles também põem em risco a ordem e a segurança pública, ameaçam ou violam outros direitos, têm de ser tratados também como direitos postos em conflito com outros, pois foram, estão e  continuam sendo  violados pelas duas.
 

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Seja pelo notório descumprimento de direitos gravados por  funções sociais públicas ou privadas, toda a vez que o Estado prioriza a execução de políticas públicas notoriamente infiéis aos objetivos fundamentais da República, previstos no inciso III do artigo 2º da Constituição (erradicação da pobreza e da marginalização), infringe o princípio da moralidade.

Toda a vez que ele atrasa, ou inviabiliza reformas como a agrária, como está fazendo agora, cortando verbas orçamentárias indispensáveis à sua implementação, viola o princípio da eficiência.

Os protestos dos movimentos populares contra essas arbitrariedades, por tudo isso, têm sólida e legítima base justa, constitucional, legal e ético-política. A ilegalidade, bem ao contrário da opinião comum, seja ela ingênua ou cúmplice, habilmente manipulada por grande parte da mídia, reside mesmo é na violenta e abusiva repressão que eles sofrem.