A identidade cultural do ser Sem Terra

A cultura do MST vem sendo gerada desde antes da primeira cerca rompida pelo Movimento.

 

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Por Geanini Hackbardt
Da Página do MST

O MST procura socializar a produção cultural, um processo antagônico ao da indústria cultural, para a qual o público é uma massa passiva a ser convencida e mantida inerte.

Socializar a cultura significa compartilhar o que há de melhor, fruir a arte, construir o belo coletivamente. Assim, todos os envolvidos são transformados em sujeitos do processo.

A cultura do “ser Sem Terra” vem sendo gerada desde antes da primeira cerca rompida pelo Movimento, porém, a plataforma política da Reforma Agrária Popular reposiciona este elemento no centro dos debates e da tática política.

Esta se transforma, portanto, numa arma potente de diálogo com toda a classe trabalhadora.

Para contextualizar a análise, Rafael Vilas Boas, durante uma mesa de debates que foi realizada no 2° Encontro Nacional de Educadores da Reforma Agrária (Enera), dados da realidade do país, ressaltando a imagem fictícia que é vendida para a população e exportada através da produção audiovisual, sobretudo, pelas novelas da Rede Globo.

“O país do povo cordial é o mesmo que mata 600 mil negros por década, maior índice do mundo de assassinato por conflito bélico com a polícia. A elite que sonha em ser europeia tem na base histórica da produção de toda riqueza o trabalho escravo. O país recordista em número de cirurgias plásticas, com tecnologia altamente avançada, possui o sistema público de saúde extremamente precário. Também é o que possui maior número de analfabetos na América Latina e as melhores empresas publicitárias, ou seja, a pedagogia do consumo está instaurada com força brutal”, assevera Rafael.

Assim, a indústria cultural rouba do trabalhador o seu escasso momento de descanso, manipulando suas ideias, incutindo a ideologia da classe dominante no pensamento e em todo seu universo simbólico.

O professor explicou ainda que a criação desta máquina da desinformação está imbricada com a Ditadura Militar e a Revolução Verde, processo de transformação da matriz tecnológica do campo caracterizada pela intensa mecanização, o uso de agrotóxicos e expulsão do homem do campo.

“A ditatura de 64 instalou energia pelo país e um ano depois, com capital ilegal dos EUA, criou a Rede Globo. A imagem do Brasil pelo mundo se confunde com a Globo, uma potência de produção cultural para o capital, que se apropria inclusive das pautas dos movimentos sociais, como o Rei do Gado, que rendeu milhões para a emissora, trazendo um retrato desfocado da luta pela terra”.

O Agronegócio gerou uma cultura transgênica

A mídia protagoniza ataques aos governos progressistas e aos movimentos sociais, pautam os partidos como se fosse vanguarda da direita, enquanto omite, distorce e mente sobre as ações em busca de direitos legítimos.

A territorialização do agronegócio no campo, com as transnacionais produtoras dos agrotóxicos (Cargil, Syngenta, Monsanto) ocorre com incentivo do estado e suporte da mídia.

Esta última, por sua vez, abre amplos espaços para que o agronegócio construa sua própria cultura e ideologia, invadindo as casas diariamente com seus espetáculos vazios. A AgroBusness incorpora em si empresas de comunicação, como a Globo, além de bancos financiadores entre os quais está o Itaú e o Unibanco. Para ela criam-se novas necessidades e transforma-se tudo em grande espetáculo, até a comida, a exemplo das propagandas da Friboy.

Outro modelo disso é o óleo de soja, que nunca esteve presente na alimentação dos brasileiros, até o capitalismo decidir que era preciso dar vazão as grandes produções do grão. Hoje, nem se sabe mais que óleo era utilizado há duas décadas. Essa naturalização é o resultado da atuação intensa da mídia, deformando a cultura para criar a nova necessidade. Assim, ela passa a integrar a cadeia produtiva e de consumo.

Para Ana Chã do setor de cultura que também participou do debate realizado durante o 2° Enrera, há séculos o camponês é produtor de sua cultura, mas o agronegócio não precisa mais deste camponês no país.

“O agronegócio cria uma concepção de um modo de vida camponês que não é mais aquele existente há tempos atrás, em que os camponeses produziam e preservavam suas sementes, festejavam as colheitas. O camponês era o produtor agrícola, de sua cultura, de seu modo de comer, vestir, agir no campo”, argumentou 

Para isso, além da intensa publicidade, o latifundiário modernizado procura empregar o incentivo cultural para ser reconhecido como parte da sociedade culta, anda de botas limpas e belos chapéus. Tudo isso com dinheiro público que é desviado pelo incentivo fiscal, a partir da Lei Rouanet.

O conteúdo ideológico destes está embutido nas cartilhas do Senar, em projetos aparentemente benéficos, como a Ciranda da Cultura, o Circuito Syngenta de Viola Caipira, o Saci-Monsanto, entre outros, especialmente direcionados a jovens e crianças.

 

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A Cultura de Combate pela vida do MST

Ainda para Chã, o acesso à terra é acesso à educação, saúde, tecnologia não destrutiva, é preservar a natureza e exercitar o respeito à vida. Uma forma de lidar com a realidade que cativa quem se aproxima.

“Se as nossas práticas aparecessem nos jornais, como aparecemos de forma difamatória, isso mudaria a percepção dos brasileiros sobre a classe trabalhadora e suas organizações. Estamos falando de algo muito potente e perigoso para burguesia”, afirma.
 

Para ela, o Movimento demorou até consolidar como prioritária a trincheira pela democratização dos meios de comunicação e da cultura, porque a ofensiva simbólica sobre a organização se intensificou muito há décadas. “Desde os anos 90 estamos sendo atacados e ainda não respondemos no nível da disputa ideológica”, adverte.

Atualmente, o MST desenvolve uma cultura de combate e procura, através disso, gerar e fortalecer protagonistas da organização política.

A Cultura Sem Terra é permeada pelas cores floridas dos panos de chita, pelos poemas com temáticas da fraternidade, do trabalho, das belas histórias de resistência, da solidariedade, do respeito ao outro e a toda forma de vida e as músicas que cantam o amor, a partir da igualdade entre homens e mulheres… Estas práticas são chave para avançar na construção da estratégia de luta pela Reforma Agrária, com protagonismo de toda classe trabalhadora, trata-se do fazer agora, tendo o novo mundo no horizonte.  

 

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