Agronegócio: as corporações internacionais comandam
Por Najar Tubino
Da Carta Maior
A produção internacional de commodities é um negócio internacional e financeiro, comandado por meia dúzia de empresas, as conhecidas no Brasil como ABCD – ADM, Bunge, Cargill e Louis Dreyfus -, além de novos atores como Noble Group, de Hong Kong, a Mitsui e a Mitsubishi – japonesas – e os fundos de todos os tipos, de capital inglês e dos Estados Unidos. No Brasil, o Mato Grosso representa a essência do agronegócio com mais de nove milhões de hectares ocupados pela soja, e as corporações dominam mais de 50% das exportações do estado – quase US$10 bilhões – e 90% do esmagamento da soja. Dentro desse seleto grupo está a Amaggi. A Bunge, maior valor em exportação, teve um lucro líquido no primeiro trimestre de 2015 de US$263 milhões. E a Cargill, no mesmo período lucrou US$425 milhões, com vendas de US$33,3 bilhões- números globais. No Brasil a Cargill comprou, processou e vendeu 21 milhões de toneladas no ano passado, sendo 78% para exportação.
O agronegócio, como diz o executivo da Agrifirma, empresa do Barão Jacob de Rothschild, Ian Watson exporta água para os chineses que tem escassez em seu território. A projeção para este ano é uma exportação de 57 milhões de toneladas de grãos de soja, a maioria comprada pela China. Na verdade o agronegócio exporta água, biodiversidade destruída, sangue e suor dos trabalhadores brasileiros, envenena o meio ambiente e as populações locais e ainda posa de campeão do PIB. Mas tem um fato que retrata ainda melhor esta situação. Trata-se da indústria canavieira ou sucroalcooleira, onde as corporações transnacionais já ocupam 33% do setor – há pouco mais de cinco anos era 12%.
Novo nirvana do mercado
Depois da crise de 2008, quando os usineiros familiares perderam US$4 bilhões em derivativos, os fundos de investimentos especulativos invadiram o Brasil e o Cone Sul em especial, para comprar terras e ativos, que envolvessem a produção de agrocombustíveis. Como o golpe da especulação imobiliária estourara eles viram na produção de commodities e de combustíveis vegetais o novo nirvana do mercado. Um verdadeiro paraíso: terra barata, água à vontade, grupos familiares loucos por capital e políticos ávidos por desenvolvimento. A cana-de-açúcar e o etanol assumem os ares da modernidade rural, com a benção do movimento ambientalista, porque polui menos do que os combustíveis fósseis. Um engodo de péssima calibragem.
Hoje, a cana cresceu de 5,6 milhões de hectares ocupados para 9,2 milhões em 2016. Os números variam muito, mas existem entre 420 e 450 usinas de açúcar e etanol – em 2016, a produção de álcool será de 58%. Desde 2008, 80 usinas fecharam as portas e em torno de 70 estão em recuperação judicial. As empresas de consultoria do setor canavieira, como a Agroconsult, calculam que a dívida do setor equivale ao valor de uma safra, ou seja, mais de R$80 bilhões. Sendo que desde 2003 até 2011, o BNDES emprestou aos usineiros e canavieiros, para se modernizarem, a cifra de R$28 bilhões, a juros de 6% ao ano. O Pró-álcool, programa lançado pelo general Ernesto Geisel na década de 1970 deixou em 1991 uma dívida de US$2 bilhões para os cofres do Tesouro Nacional, segundo informações do pesquisador da USP, Fábio Pitta.
Direcionamento do boi para o norte
Entretanto, o mais grave ainda quando o assunto é a expansão cana-de-açúcar está relacionado com o direcionamento da pecuária para o norte do país. A cana tomou conta de São Paulo, com mais de cinco milhões de hectares – 54% da produção nacional, que é de 590 milhões de toneladas. Mas em estados como Goiás, Minas Gerais e Mato Grosso do Sul deu um salto enorme em poucos anos. Em Goiás passou de 180 mil há para 725 mil em 2013; Minas Gerais de 334 mil para 721 e Mato Grosso do Sul de 131 mil para 542, sendo parte da área onde os Guarani Kaiowás reivindicam as suas reservas. Outra característica desta que é uma indústria secularmente concentradora de terra, exploradora de mão de obra e totalmente autoritária.
No final da década de 1970 um boia fria cortava 3,77 toneladas por dia. Em 1985 a quantidade aumentou para cinco toneladas por dia. Em 2005, chegou a oito toneladas e agora varia entre 12 e 15 toneladas/dia – a mecanização diminuiu a mão de obra e agora eles selecionam por produtividade. Na verdade as usinas terceirizaram o trabalho que antigamente os gatos, recrutadores de mão de obra, faziam. Agora, na era do agribusiness as usinas contratam outras empresas que fazem o CCT – corte, carregamento e transporte.
Corrida induzida pelos Estados Unidos e União Europeia
A corrida pelos agrocombustíveis pelo mundo piorou a vida de muita gente no campo- tanto camponeses, como comunidades tradicionais, na América do Sul, como na África e na Ásia. Um movimento que foi induzido pelos Estados Unidos e a União Europeia sob o argumento que precisavam reduzir as emissões de gases estufa. Na verdade criaram novas oportunidades para o mercado gerar lucros com o capital especulativo que corre pelo globo. O Banco Mundial fez um estudo em 2011 sobre a compra de terras por grupos empresariais. Avaliaram 464 aquisições que envolviam mais de 200 milhões de hectares – em média as compras eram de 40 mil hectares. Porém em 203 desses negócios – envolviam 56 milhões de hectares – 21% a commodity relacionada era de bioenergéticos, outros 21% era madeira e borracha e 37% relacionados a produção de alimentos, que no conceito deles é soja e milho.
As informações estão detalhadas na tese do pesquisador Alberto Arruda Villela, da COPPE-UFRJ sobre a expansão da palma (dendê) na Amazônia Oriental. A palma é a soja da Ásia, embora a sua produção de óleo global supere a da soja – 58,4 milhões de toneladas. Os maiores produtores são Malásia e Indonésia, que em 20 anos destruíram 3,5 milhões de hectares de florestas para expansão da cultura – ocupa hoje 10 milhões de hectares, com um aumento de 474% na área plantada. O problema é ainda mais grave: 25% dessas terras eram turfeiras, considerados sumidouros de carbono orgânico e armazenam no sudeste asiático 68,5 bilhões de toneladas de carbono.
A insanidade de produzir agrocombustíveis
Para traçar outro parâmetro da insanidade de produzir combustíveis vegetais: 1/3 da produção de milho dos Estados Unidos é direcionado para o etanol, que corresponde a apenas 7% do consumo de gasolina. No mundo 13% da produção de óleos vegetais é transformada em agrocombustível. No Brasil, a soja abocanha dois milhões de toneladas de grãos. A ADM tem a maior fábrica de diesel vegetal em Rondonópolis com capacidade para produzir 486,7 milhões de litros.
Depois dos últimos relatórios do IPCC os europeus mudaram de ideia quanto ao uso de o setor plantam como a kolza. Depois compram os grãos de outros países. Daí surgiu o cálculo sobre as consequências indiretas que a produção de agrocombustíveis acarretam em áreas de florestas, ou ocupadas por pecuária, ou plantios de culturas para alimentação. Esta é a realidade do Brasil, com a expansão agrícola no Piauí, Bahia, Maranhão e Tocantins pelos grupos estrangeiros associados com famílias locais ou de sulistas, como ocorre no Mato Grosso.
O Grupo Bom Futuro, de Iraí Maggi, primo do senador Blairo Maggi, ocupa 260 mil hectares com commodities, o Grupo Itaquerê possui 107 mil hectares, o Grupo Pinesso com 117 mil hectares, ou o Grupo Insolo, no Maranhão com 80 mil hectares, da família de banqueiros Iochpe. No agronegócio está tudo dominado pelas corporações. A safra de soja 2015/16 no Mato Grosso tem um custo de produção acima de R$16 bilhões – 26% financiado pelos bancos privados e federais; 34% pelas tradings e revendas, ou seja pelas corporações internacionais e o restante 40% com o dinheiro antecipado dos produtores que no final de 2015 já tinham vendido quase 60% da safra. Na hora que houver uma quebra de safra significativa na soja o pânico tomará conta do noticiário da mídia esquizofrênica. Certamente convencerão os brasileiros a doar as suas esquálidas poupanças, para ajudar o setor mais moderno e querido do país.