O campo em Rondônia, um barril de pólvora
Da CPT
A Comissão Pastoral da Terra (CPT) em Rondônia vem manifestar sua grande preocupação diante do aumento da violência em conflitos por terra no estado. Os sem terra, ao buscarem o sagrado direito a terra, sofrem despejos, agressões, ameaças, roubos, culminando com o assassinato.
No ano de 2015, Rondônia despontou no cenário nacional como o estado com o maior número de mortes em conflitos no campo no país. Foram 21 trabalhadores assassinados, muitos com características de execução. É o número mais elevado de assassinatos de camponeses e sem terra já registrado no estado desde 1985, quando a CPT começou a divulgar os registros destes fatos.
O mais grave, porém, é que essa onda de violência continua. Só nos primeiros dias deste ano, outras quatro pessoas foram assassinadas.
– A militante do Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB), Nilce de Souza Magalhães, conhecida como Nicinha, foi assassinada com três tiros, num acampamento de pescadores atingidos pela Hidrelétrica de Jirau, na localidade chamada de “Velha Mutum Paraná”, no dia 7 de janeiro. Seu corpo, até o momento, não foi encontrado.
– Enilson Ribeiro dos Santos e Valdiro Chagas de Moura, lideranças do acampamento Paulo Justino, foram assassinados no município de Jaru, no dia 23 de janeiro. Eles foram perseguidos e mortos por um motoqueiro.
– Em Cujubim, cinco jovens sem terra foram atacados por pistoleiros no final de janeiro. Dias antes, eles e outros acampados haviam sido despejados da Fazenda Tucumã. Após o despejo, os jovens retornaram a área para buscar alguns objetos que haviam ficado no local. Mas eles foram surpreendidos pelos pistoleiros. Três conseguiram fugir. Dois estão desparecidos e um corpo foi encontrado no carro dos jovens, que os acampados acreditam ser de um dos desaparecidos.
A recente violência é a filha adulta do latifúndio, amasiado com a pistolagem patrocinada e a repressão estatal, acobertada pela impunidade dos pretensos proprietários de terras, especuladores imobiliários e grileiros.
Esta violência está espalhada por todas as regiões do estado, mas os maiores conflitos estão nos municípios de Monte Negro, Ariquemes, Cujubim, Buritis, Alto do Paraíso, a maioria no Vale do Jamari (15 mortes em 2015 e 2 em 2016).
A situação agrária de Rondônia pode-se dizer que é um autêntico barril de pólvora prestes a estourar a qualquer momento, já que os fazendeiros estão se organizando em associações de produtores rurais para defenderem seus interesses, muitos com áreas em terras públicas da União. Por outro lado há centenas de famílias acampadas em terras da União, jogadas à beira de estradas, decididas a conquistar um pedaço de terra, incentivadas pelo chicote da pobreza. Esperam por reforma agrária que está engessada há anos.
O mais preocupante é o fato de que toda esta violência está sendo debitada por autoridades policiais e outras autoridades públicas e por veículos da imprensa na conta dos movimentos dos trabalhadores do campo. O comandante geral da polícia militar, Ênedy Dias, que foi ao Vale do Jamari, ontem, dia 9, “para coordenar ações para diminuir a violência”, afirmou à imprensa: “Estamos mandando um recado: não vamos descansar enquanto não prendermos todos esses criminosos, que considero, na verdade, terroristas. Esses ditos sem-terras agem como terroristas. Vamos colocá-los no devido lugar. Por isso, vim aqui até hoje para definir as novas estratégias de combate a esses criminosos”.
O comandante e a imprensa se esquecem, porém, da prisão, no dia 3, de pistoleiros fortemente armados, inclusive com armas de uso restrito das forças armadas que atacaram um carro da polícia que investigava o desaparecimento de jovens sem terra (citados acima), no mesmo Vale do Jamari. Fazia parte do grupo de pistoleiros um sargento da polícia que conseguiu fugir. O comandante também não se refere, como registrou o portal Diário da Amazônia, no dia 6 de fevereiro, que “durante o ano de 2015, em uma operação especial da Polícia Militar na região de Buritis, armamentos pesados, como fuzis AR-15, estavam em poder de homens que, ao serem presos, argumentaram que o material era utilizado para proteção pessoal e de familiares de um fazendeiro da região”.
A Comissão Pastoral da Terra pede socorro. São imprescindíveis providências imediatas que freiem de uma vez o caos que vem se instalando nas áreas rurais de Rondônia, com execuções sumárias de trabalhadores. Exige-se também investigação imparcial dos assassinatos com punição exemplar de seus autores.
Se nenhuma medida séria e eficaz for tomada pelas autoridades competentes, a situação poderá ser calamitosa, beirando a catástrofe social.
Nosso país necessita de Justiça social à altura dos problemas que sua falta acarreta, que garanta a dignidade da pessoa humana e os seus direitos fundamentais, como o direito à terra, à vida e à sua manutenção.
A Reforma Agrária é urgente e necessária para que se rompam as fronteiras da intolerância e se ofereça dignidade para todos.