MST vai inserir o tema da agroecologia na educação básica das escolas do campo

Em entrevista à Página do MST, Tardin explicou os motivos desse projeto e afirmou que em cinco anos ele poderá se tornar uma experiência nacional e de referência nas escolas do campo.

 

 

Por Catiana de Medeiros
Da Página do MST

 

Tornar a agroecologia uma realidade nacional na educação básica das escolas do campo. Foi pela concretização deste objetivo em comum que cerca de 120 educadores e educadores da região Sul do Brasil se reuniram entre os dias 16 a 18 de junho no município de Veranópolis, na Serra Gaúcha, e participaram do seminário Educação em Agroecologia nas Escolas do Campo, promovido pelo setor de Educação do MST.

De acordo com o educador José Maria Tardin, desde o ano 2000, quando o Movimento realizou seu 4º congresso nacional em Brasília, a produção de alimentos saudáveis no modelo agroecológico passou a ser uma das prioridades para os Sem Terra. Desde então, vários debates foram realizados e em alguns estados, como a Bahia, a agroecologia já se tornou uma realidade na educação básica.

Em entrevista à Página do MST, Tardin explicou os motivos desse projeto e afirmou que em cinco anos ele poderá se tornar uma experiência nacional e de referência nas escolas do campo. Confira a íntegra da entrevista:

Página do MST – Qual o intuito de inserir o tema da agroecologia na educação básica das escolas do campo do MST e de que forma isso contribuirá para a sociedade?

José Maria Tardin – A agroecologia pode contribuir na necessidade urgente que temos de superar a sociedade burguesa e o capitalismo. A forma de organização social burguesa depreda o ser humano e suas relações sociais por meio da exploração, alienação, fetichização, divisão social do trabalho e opressão, além de orientar para uma relação depredatória com a natureza. Não há solução humana e ecológica na sociedade burguesa. No caso específico do MST, a agroecologia nos permite construir os processos de revolução social que sejam capazes de superar essa ordem burguesa capitalista para uma ordem socialista, onde é possível incluir essa dimensão ecológica da vida. Essa é a relevância da agroecologia ser inserida já na iniciação da educação escolar. Ela já está sendo posta no âmbito das famílias, nas suas relações internas e do seu fazer agricultural no ambiente em que maneja. Nós encontramos na agroecologia essa potencialidade.

Página do MST – Como surgiu a decisão de inserir a agroecologia nas escolas do campo, tornado-a uma política nacional do Movimento?

Tardin – Desde a sua origem o MST vem tomando mais esclarecidamente consciência da sua própria prática agroecológica e da reprodução do modo capitalista de fazer agricultura. É no interior dessa contradição que nós conseguimos entender que a agroecologia vem, em muitos aspectos, da tradição camponesa brasileira, e não só de fora do nosso país. Ela está na vida de muita gente que ergueu nos primeiros acampamentos experiências com vários elementos de uma tradição agroecológica. Esse aprendizado foi estabelecido na caminhada do Movimento, que junta essa experiência histórica com a produção do saber e do conhecimento acadêmico e mais sistemático. Isso contribuiu para a reprodução isolada de experiências em agroecologia nas áreas de assentamentos. A partir do seu 4º Congresso Nacional, o MST assume a agroecologia como forma de reconstruir ecologicamente a agricultura, e o nosso desafio mais imediato, neste sentido, foi formar técnicos em agroecologia. Então erguemos as primeiras escolas de agroecologia, que se expandiram rapidamente pelo Brasil e contribuíram, inclusive, para a Via Campesina Internacional. Em um período muito curto, também chegamos à pós-graduação em agroecologia. Todo esse feito do Movimento é uma vitória na história da humanidade. Agora estamos num novo momento, já temos capacidade de colocar a agroecologia na rede de educação básica do MST. Vamos chegar nas primeiras fases da nossa infância e, com esse esforço coletivo, orientar as novas gerações de Sem Terrinha para essa unidade entre a revolução social, a qual incluiu a dimensão ecológica da vida.

Página do MST – Essa discussão do MST sobre educação e agroecologia ocorre em vários estados do país, e agora, especialmente, em formato de seminário na região Sul. Já foi pensado um método e conteúdo em nível nacional para trabalhar esse modelo de desenvolvimento da agricultura nas escolas?

Tardin – Tudo está em processo de construção, e o seminário foi um espaço de compartilhamentos de experiências realizadas em escolas de educação básica em alguns estados do país, e que irão nos ajudar nessa missão de expandir a agroecologia. Sendo extremamente promissor, o encontro agregou muita energia nesse esforço nacional do setor de Educação do MST de experimentar cada realidade e contexto, para que possamos avaliar a melhor maneira de atingir nossos objetivos. Nos próximos anos já teremos capacidade de orientar melhor um processo nacional, a partir dessa experiência prática que estamos construído e da reflexão sobre ela.

Página do MST – Em quando tempo a agroecologia na educação básica poderá se tornar uma realidade nacional?

Tardin – Acredito que daqui a cinco anos a educação infantil e de nível médio no MST estará permeada de agroecologia. Por mais poderosa que seja a força social que se erga contra nós, a agroecologia não tem mais volta, assim como a perspectiva e a consciência da urgência e da necessidade da revolução social. Penso que o MST tem sua própria catarse, mas que talvez ainda não esteja consciente disso. Nós já temos nos barracos e nas casas das famílias assentadas uma geração de Sem Terrinha agroecólogo. Para mim, essa é a catarse, então, a agroecologia não tem mais volta.

 

 

*Editado por Rafael Soriano