Escola Florestan Fernandes lança campanha para financiar campo de futebol
Por Camila Rodrigues da Silva
Do Brasil de Fato
Um 7 a 1 do bem. É assim que, entre risos de quem jogou e de quem assistiu, definiu-se o jogo amistoso entre o time da Escola Nacional Florestan Fernandes (ENFF) e o Autônomos Futebol Clube, que ocorreu na manhã fria do dia 11 de junho, em Guararema, no interior paulista.
A partida, vencida pelo time visitante, foi a primeira atividade do lançamento da campanha para a construção do campo de futebol Dr. Sócrates Brasileiro, na própria escola.
Durante a atividade, uma mesa de debate discutiu as relações entre futebol e política. Em seguida, foi apresentado projeto do campo.
A arrecadação está sendo feita por meio da plataforma de financiamento coletivo do Catarse, que inicia nesta terça-feira (21), e tem como meta receber R$ 60 mil em doações, que é o custo estimado para construir o campo de futebol e o entorno dele.
“Nós temos um projeto maior de um centro poliesportivo, que não se restringe ao campo, para que os estudantes que passam grandes períodos na ENFF tenham atividades esportivas. A gente acha que é uma questão de saúde, pedagógica e de lazer”, explica Diana Fernandes, da Associação dos Amigos da Escola Nacional Florestan Fernandes (AAENFF).
O projeto do centro poliesportivo foi elaborado pela Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo (FAU-USP) e inclui, além do campo de futebol – que é a primeira etapa –, um memorial, quadra de areia, pista de corrida e área para ginástica. Caso o valor seja ultrapassado, o projeto avançará para a construção do memorial.
O prazo para alcançar este valor é de dois meses a partir desta terça-feira (21) e as doações podem ser feitas aqui.
A previsão é inaugurar o campo e a arquibancada no dia 4 de dezembro deste ano, que é o dia de aniversário de Sócrates.
Clique aqui para contribuir com a campanha
Futebol e luta de classe se misturam?
A mística que antecedeu a mesa de discussão começou com militantes do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) entoando a questão acima. Em seguida, os mesmos homens e mulheres elencaram episódios históricos que estabeleciam essa relação, como quando, em 1983, a seleção da União Soviética se recusou a jogar no estádio nacional do Chile, onde muitas pessoas foram mortas durante a Operação Condor do governo Pinochet; ou em 2005, quando o jogador Drogba, da seleção da Costa do Marfim, discursou com o objetivo de ponderar as tensões que geravam uma guerra civil no país dele.
Umas das últimas referências citadas pelos sem-terra foi o Democracia Corinthiana, movimento do qual o homenageado pelo campo, o jogador Sócrates (1954-2011), foi um dos fundadores e símbolos.
Foi nesse tom que começou o debate que contou com a participação de dois jogadores do Autônomos F.C., Luciane de Castro, jornalista do blog Futebol para Meninas; Carlos Duarte, membro da coordenação da AAENFF; o professor da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo (FAU) da Universidade de São Paulo, Jorge Bassani; e o pesquisador do Laboratório de Habitação da USP (Labhab), Paulo Müller.
O Autônomos F.C., fundado por punks e anarquista da cidade de São Paulo em 2006, é um time de várzea que disputa campeonatos nacionais e internacionais em sua categoria. Eles afirmam que, para além do futebol comercial, esse esporte pode ser apropriado como ferramenta de aglutinação e articulação política, pois é o espaço em que as pessoas interagem fora do trabalho.
Gabriel Brito, jornalista e jogador do time, conta que isso já é uma realidade em outros lugares do mundo. “Existe uma rede anti-facista de movimentos sociais conectada por meio do futebol. Em 2010, por exemplo, nós fomos convidados por uma equipe amadora inglesa, que foi fundada por militantes anarquistas que lutaram contra o governo de Margareth Thatcher nos anos 1980, para uma Copa do Mundo alternativa”, relatou.
Outro ponto da discussão foi o futebol feminino, marginalizado desde a origem. “O futebol feminino é um ato político em si e nunca será comparável com o masculino. São coisas muito distintas”, afirmou Luciane de Castro, que também é curadora do Museu do Futebol, em São Paulo.
Projeto
A iniciativa da construção do campo é da Associação de Amigos da Escola Florestan Fernandes (AAENFF), que articulou contatos junto a FAU-USP para a elaboração conjunta de um complexo esportivo na ENFF.
Além do campo de futebol, está prevista a construção de uma quadra de areia, um espaço de academia ao ar livre, a revitalização de uma trilha já existente e um memorial, que deverá contar com um acervo da vida de Sócrates.
“Foi um projeto que nós desenhamos, mas que foi pensado coletivamente pelo pessoal da Escola, da FAU e da Associação de Amigos. Foram várias conversas para pensar tanto sobre questões relativas a custos quanto sobre a dinâmica da escola”, contou Jorge Bassani, professor da FAU-USP.
Estrutura
A parte a ser construída neste primeiro momento inclui o campo e a arquibancada, que não será sob os moldes tradicionais.
Bassani conta que, no início, foi pensado um espaço para umas 200 pessoas. “Mas a gente percebeu que, mesmo uma arquibancada com essa quantidade de gente, seria um grande obstáculo e, em vez de reunir as pessoas, ela serviria quase que como um bloqueio entre o campo de futebol e o restante do espaço”, explicou.
Por isso, o projeto final tem pequenos módulos com banquinhos, onde as pessoas podem ocupar, mesmo que não esteja ocorrendo nenhum jogo.
“Pegamos uma série de referências e pensamos em algo que funcionasse tanto para integrar as atividades do campo com o restante da escola quanto outras formas de usos, ou seja, que fosse um espaço onde as pessoas pudessem conversar, tocar um violão e ao lado do campo de futebol”, descreveu.
Já o campo de futebol em si está desenhado para reduzir ao mínimo os custos de manutenção. Assim, a estrutura tem uma série de camadas e mecanismos que permitem que, em tempos de chuvas, ele esteja drenado o suficiente para permitir que se jogue.