No RJ, Sem Terra são ameaçados por donos de empresa investigada na Lava Jato
Por Mariana Pitasse
Do Brasil de Fato
As mais de 180 famílias que formam a Ocupação Fidel Castro, em Silva Jardim, interior do Rio de Janeiro, tiveram que realocar suas barracas para fugir de um violento despejo.
O acampamento, que está erguido desde 30/12 do ano passado na Fazenda Santa Maria, foi ameaçado por uma ordem de reintegração de posse concedida aos supostos proprietários, César Farid Fiat e sua esposa Lina Maria Miranda Santos.
Os dois são sócios da empreiteira Oriente, que esteve envolvida nas denúncias investigadas pela Operação Lava Jato no final do ano passado.
Após orientação da defensoria pública, as famílias retiraram o acampamento do local em que estavam há mais de um mês. Agora encontram-se no terreno onde cerca de 30 famílias ocuparam há mais de 50 anos, também na Fazenda Santa Maria.
Mesmo após a mudança, aproximadamente 80 policiais do batalhão de choque da Polícia Militar estiveram no local nesta segunda-feira (6) para realizar o despejo. Eles chegaram em 30 viaturas, dois ônibus, cinco motos, além de estarem acompanhados de caminhões de César Farid.
“Eles estavam preparados para uma ação violenta e acabaram surpreendidos. Nós nos prevenimos à violência, estamos esperando que a justiça reverta a liminar de reintegração de posse para voltarmos a montar os barracos onde estavam”, explica Oto dos Santos, presidente da Federação dos Trabalhadores em Agricultura do Rio de Janeiro (Fetagri-RJ).
As famílias, organizadas com ajuda da Fetagri-RJ, escolheram a fazenda por se tratar de um local improdutivo. Além disso, os membros da ocupação afirmam que César Farid e Lina Miranda não possuem a documentação da propriedade da fazenda prevista na lei, incluindo o registro de imóveis (RGI).
De acordo com levantamento da Fetagri-RJ, as terras não foram adquiridas através da compra. Parte delas, cerca de 50 alqueires, foi cedida pela justiça por meio de alguns processos de usucapião, movidos por César Farid, desde 1996.
No entanto, hoje o empreiteiro se apresenta como dono de toda a Fazenda Santa Maria, que conta com uma área de aproximadamente 300 alqueires. “Essas terras são griladas e improdutivas. Agora eles têm alguns gados para dizer que produzem alguma coisa. É um espaço que precisa ter um uso social”, acrescenta Oto.
A empreiteira Oriente, a qual Cesar e Lina são sócios, foi denunciada na Operação Calicute da Lava Jato. Essa operação foi a responsável pela prisão do ex-governador Sérgio Cabral.
As denúncias envolvendo a empreiteira em esquemas de corrupção culminaram na prisão temporária de Alex Sardinha, um de seus representantes, no final de 2016.
Violência
Além da ordem de reintegração de posse, as famílias estão sofrendo violentas ameaças. De acordo com relatos, diariamente pessoas armadas vão até o local para intimidar os membros da ocupação. Dessa maneira, há preocupação constante com as dezenas de crianças, grávidas e idosos que estão vivendo no local.
“São capatazes da fazenda que fazem isso. Um dia, um deles me pegou pelo braço e disse que custe o que custasse, ele ia pegar as terras de volta, que eu não sabia onde estava me metendo. Eles passam pelo terreno dando tiros para o alto, colocam barulho de sirene da polícia de madrugada para nos assustar”, explica Silvana Calcanho, 41 anos, educadora popular que faz parte da ocupação.
Segundo Silvana muitos desistiram da ocupação após as ameaças. Já as famílias que moram no terreno há mais de 50 anos, e preferem não ser identificadas, contam que as ameaças são frequentes e houve casos de morte no local tempos atrás.
Elas estão apoiando a ocupação também porque acreditam que novos ocupantes trouxeram mais visibilidade e segurança ao local.Na última quinta-feira (2), houve a inauguração da nova sede da Defensoria Pública de Silva Jardim.
Na ocasião, as famílias realizaram um ato de apoio ao órgão público, que está representando sua demanda. O plano é que a defensoria consiga derrubar a decisão liminar de reintegração de posse para que consigam retomar ocupação em parte mais espaçosa do terreno.
“Estamos esperançosos, recebendo apoio do Instituto de Terras e Cartografia do Estado do Rio de Janeiro (Iterj), sindicatos, políticos e da própria defensoria. Vamos continuar resistindo a esses ataques”, finaliza Oto.
*Editado por Rafael Soriano