Justiça nega reintegração de posse em área ocupada pelo MST no Rio de Janeiro
Da Página do MST
A Justiça negou o pedido de reintegração do Açu, 5º distrito de São João da Barra, Norte do Estado do Rio de Janeiro. A área está ocupada desde o último dia 19 de abril.
As terras foram reocupadas após oito anos por força do decreto do governo estadual Nº 41.195, de 19 de junho de 2009. A área pela empresa LLX do empresário Eike Batista e visava a implantação de um distrito industrial na área do entorno do Porto do Açu. Através de um termo precário, a Codin (Companhia de Desenvolvimento Industrial do Estado do Rio de Janeiro) autorizou a empresa do Eike a entrar e tomar posse destas terras.
Cerca de 500 pequenos proprietários foram desapropriados. Uma pequena parte recebeu indenização em valores irrisórios. A maioria questiona na Justiça os termos desta desapropriação.
A decisão de voltar para as terras foi tomada pelos agricultores e organizada pela Asprim (Associação dos Proprietários Rurais e de Imóveis do Município de São João da Barra), que luta desde 2009 contra as desapropriações.
Abaixo segue a decisão integral do juiz:
Processo nº:
0000721-89.2017.8.19.0053
Tipo do Movimento:
Decisão
Descrição:
COMPANHIA DE DESENVOLVIMENTO INDUSTRIAL DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO; GSA – GRUSSAÍ SIDERÚRGICA DO AÇU Ltda. e PORTO DO AÇU OPERAÇÕES S.A. ajuizaram ação de reintegração de posse em face de ASSOCIAÇÃO DOS PROPRIETÁRIOS DE IMÓVEIS E MORADORES DO AÇÚ, CAMPO DA PRAIA, PIPEIRAS, BARCELOS E CAJUEIRO, INTEGRANTES DO MOVIMENTO DOS TRABALHADORES RURAIS SEM TERRA e TERCEIROS NÃO IDENTIFICADOS. Como causa de pedir afirmaram que o Estado do Rio de Janeiro criou o Distrito Industrial de São João da Barra destinado a receber instalação de estabelecimentos industriais. Para implementação do distrito foram editados diversos decretos que declararam a utilidade pública da área, em favor da CODIN. Sustentou que o Juízo da 1ª Vara da Comarca de São João da Barra deferiu medida liminar de imissão provisória na posse em favor da CODIN, que celebrou termos de cessão de posse de imóvel em favor dos demais autores desde 27/07/2012. Narrou, por fim, que em 19.04.2017 os réus invadiram irregularmente os imóveis objeto da ação, se recusando a dali sair. A Defensoria Pública ingressou no feito às fls. 447/452 pleiteando o indeferimento da liminar e a designação de audiência especial para solução amistosa do conflito. O Ministério Público manifestou-se às fls. 498/500 pelo indeferimento da liminar e pela designação de audiência. É o relatório. Decido. É fato público e notório que grande parte da área rural situada no distrito do Açú foi desapropriada pelo Estado do Rio de Janeiro para construção do Porto do Açú. Alguns proprietários aceitaram a desapropriação de forma amigável e foram indenizados. Outros proprietários não concordaram com o valor proposto e foram ajuizadas ações de desapropriação. Existe ainda, um terceiro grupo, mais vulnerável, que se trata daqueles ocupantes que não possuíam documentos de propriedade das terras, tratando-se, na verdade, de possuidores – muitas vezes não identificados – que foram desalijados de suas terras sem que tenham recebido qualquer indenização até a presente data. Esse é o relato do quadro dramático que se instalou no Município, que só piora com a crise econômica instalada no País, na medida em que menos de 10% da área efetivamente desapropriada se tornou produtiva com o Porto, que inicialmente teria uma dimensão muito maior do que a que se revela hoje. A título ilustrativo, só nesta 1ª Vara da Comarca de São João da Barra, tramitam, atualmente 223 processos de desapropriação movidos pela CODIN. Este acervo não considera as ações já julgadas e baixadas e tampouco o acervo da 2ª Vara desta Comarca. Também não considera as ações propostas por possuidores e proprietários em face dos autores. A posse e também a propriedade que justificam a proteção possessória só podem ser aquelas que exercem a sua função social. É o que se extrai dos artigos 5º, XXIII, 170, III, da CRFB/88. Desapropriar área rural, dela retirando seus legítimos possuidores que viviam de pequenas culturas e exploração de gado, geralmente em regime familiar e em muitos casos sem nada receber para simplesmente deixar a área parada aguardando valorização imobiliária configura ato ilícito. As fotografias de fls. 461/487 comprovam que na área não existe nada além de mato. Com razão o ilustre Promotor de Justiça, às fls. 499: ´ Isto porque o que foi ponderado pela Defensoria e que merece a devida consideração é que, após imitido na posse das terras do distrito do Açu, nem o Estado, nem os seus cessionários, efetivamente a ocuparam, nelas instalando algum equipamento ou demonstrando a imprescindibilidade das mesmas ante o atual redimensionamento do empreendimento, limitando-se a cercar a terra, o que, por si só, não parece evidência de posse efetiva.´ Ora, se devido à conjuntura econômica o projeto do distrito industrial reduziu de tamanho, é necessário redimensionar o projeto e readequá-lo às atuais necessidades. Como bem apontado pela Defensoria Pública e pelo Ministério Público, os autores não demonstraram a efetiva posse sobre os imóveis. A simples instalação de cercas, sem nenhuma benfeitoria ou utilização do terreno não configuram posse a ser protegida. Ausente, portanto, o requisito previsto no art. 561, I, do CPC. Tal fato, por si só, já é suficiente para indeferir o pleito dos autores. No entanto, firme no propósito de obter a solução consensual do conflito, cotejando de um lado o direito dos autores à ocupação (desde que seja efetiva e justa) da área e, de outro lado, o direito dos possuidores desalijados da terra sem indenização de receberem o valor justo, designo audiência de conciliação para o dia 12/05/2017, às 14h. Deverão os autores apresentarem, na Audiência, comprovação da realização de alguma benfeitoria nas terras em cuja posse pretendem a reintegração, assim como seu uso efetivo e potencial para o empreendimento efetivamente instalado. Deverão também trazer croqui da área objeto desta lide e sua distância até o local onde instalado o porto do Açú. Além disso, deverão apresentar plano objetivo de exploração da área desapropriada. De igual forma, os representantes dos réus deverão trazer uma pauta objetiva para que seja alcançada a conciliação. Intimem-se.