Cultura Sem Terra: uma revolução que transpõe barreiras

Arte para abrandar a luta e dar força às novas gerações a partir do exemplo
por Agatha Azevedo
Jornalistas Livres

 

Além da produção de alimentos de forma saudável, em harmonia com a natureza, em cooperativa e sem exploração do trabalho, o Movimento dos Trabalhadores Rurais sem Terra é também marcado pela beleza de suas tradições, que são passadas como ensinamentos a cada geração que nasce nos acampamentos espalhados pelo Brasil. Natália e Lucinha são exemplos de como este trabalho carinhoso e cotidiano é importante.

 

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“A arte põe o dedo na ferida”, diz Natália Pereira.

 

Natália Pereira é um dos frutos deste trabalho de formação. Filha da militante Lucinha, ela conta que nasceu, cresceu e se formou enquanto artista e agente da cultura no Movimento: “Desde que eu me entendo por gente eu sou sem terra né, eu fui com muitos poucos meses para debaixo da lona”. 

 

Para subverter à lógica imposta de que nem todos terão acesso à arte e cultura, o MST produz, com panos de chita, música, poesia e alegria, a própria forma de retratar sua realidade coletiva através da arte, que tem papel fundamental na formação da identidade coletiva de seu povo enquanto um movimento forte e potente em todas as áreas.

 

Nos espaços do Movimento, a mística é símbolo e referência, e é usada para fazer política e construir memória. Uma lembrança que a jovem de 21 anos que cresceu no Vale do Rio Doce (MG) não esquece é de quando, em uma análise de conjuntura, foi dito que era possível saber que um movimento de conquista de terra seria grande quando até os sem-terrinha, as crianças do MST, sabiam cantar as místicas do Movimento.

 

Sobre como a cultura pode transformar realidades e até ganhar batalhas, Natália cita a luta feminina do MST, que conseguiu, através da cultura e das místicas, falar de temas polêmicos e questionar lugares de fala e dinâmicas da sociedade. Ela se lembra de como a cultura a tocou pela primeira vez:

 

Mãe e filha constroem a luta e a cultura do movimento.
Mãe e filha constroem a luta e a cultura do movimento.

 

“Foi em uma ação que fizemos dentro do Encontro Estadual realizado no Vale do Rio Doce, e nele a cultura foi nossa forma de falar. Aconteceu uma mística que teve um impacto muito grande, tanto que até hoje ela é muito falada. Só nesse dia que eu fui perceber o peso que a arte tem na hora de falar. Foi quando as mulheres se empoderaram, e se nós tivéssemos usado outro tipo de linguagem, que não a arte, não teríamos conquistado nosso espaço. Todo mundo conseguiu se comover com nossa causa e nosso lugar de fala. A arte põe o dedo na ferida. Nesse momento eu me apaixonei pela arte.”

 

Apaixonada pelo Movimento, Natália fala sobre como a cultura está presente desde o primeiro barraco de lona erguido em cada acampamento, criando a magia e a beleza de ser sem terra. Como sua principal referência, ela aponta a Lucinha Pereira, sua mãe, que além de estar na política e envolvida com diversas outras tarefas, como o plantio, é bastante engajada na frente de cultura do MST.

 

Partindo da ideia de que semear arte e cultura transforma realidades, o Movimento trabalha a solidariedade, o respeito ao outro e suas histórias de vitória e resistência através do amor pelo simples que vem de cada coração que pulsa dentro da luta pela terra e se materializa em forma de cultura.

 

*Editado por Geanini Hackbardt