Cuidar da terra, promover a vida e preservar a saúde

Com muitas árvores e sem agrotóxicos, os viveiros de mudas garantem a produção agroecológica nos assentamentos do MST.

 

 

Por Gabriel Teodoro
Do Circuito Mineiro de Arte e Cultura da Reforma Agrária 

 

Foto: Leonardo Milano|Mídia Ninja

 

No forte, e seco, calor belorizontino, no interior Serraria Pinto, onde acontece o Circuito Mineiro de Arte e Cultura da Reforma Agrária, um ar fresco de transformação. O aroma do alecrim e do manjericão orientam meus sentidos para o viveiro agroflorestal. Ao parar para observar o espaço e as pessoas que ali estão, conheço Elizabeth, militante do MST – ES, entretida entre explicações sobre as mudas que ela própria produz. Ao fundo da nossa conversa, um ato político em andamento, sobre soberania alimentar. Ouvimos e concordamos juntos: “alimentar é um ato político”. Peço à Elizabeth que me fale um pouco mais sobre esse ato político a partir da produção de suas plantas medicinais, hortaliças e plantas ornamentais.
 

Tudo começou no Assentamento Nova Conquista, município de Pinheiros. “Quando começamos, tínhamos duas ou três pessoas que nos acompanhavam; hoje, toda a comunidade nos acompanha na produção e distribuição de mudas”, diz a mulher, que também cita Paulo Freire para justificar o engajamento dos outros companheiros do assentamento. “Paulo Freire nos diz que a primeira instância do saber é o querer. Aos poucos o povo foi querendo e hoje o Espírito Santo carrega suas mudas para todos os lugares”. Lá, também se produz para dois programas do Governo Federal, por meio de projetos aprovados pelo PNAE e o PAA, duas importantes conquistas para a estruturação da produção, distribuição e integração do movimento com o restante da sociedade. “Reforma agrária popular é integração e qualidade de vida no campo e na cidade”, diz Beth.
 

“Tudo orgânico e nada de agrotóxico” diz a companheira Sanuza, também responsável pelo viveiro, feito majoritariamente por mulheres. Em meio a várias espécies de mentas, cidreira, saião – esse que cura tosse, Sanuza me explica como o MST encara a produção de plantas. “Aqui, além de fazer mostra do produto, a gente faz saúde do corpo, da mente e da alma”. De todas, suas preferidas são manjericão e alecrim. “Essas duas a gente pode usar para alimentação, para saúde e também para energizar o ambiente e, por que não, enfeitá-lo também? É tão bom chegar num bar e ver alecrim na mesa”. Para Sanuza, a cidade precisa retomar o contato com a natureza e dizer não aos agrotóxicos. Ela cita o exemplo das hortas urbanas como ações importantes para a construção de uma sociedade diferente.
 

De uma roça no Espírito Santo para o centro de Belo Horizonte. Da terra para a cozinha e também para o espaço da saúde. Esse é o bonito caminho que as plantas fazem nesta festa de luta!  Cooperação, trabalho e qualidade de vida para transformação social. É nisso que aposta o MST com a produção agroflorestal. Quem planta saúde, planta a Revolução.
 

Já quase no fim de nossa conversa, avisto Luciana, costureira e mãe de Enzo – feliz com sua nova peteca artesanal, adquirida em uma das tendas. É a primeira vez que a família visita uma mostra organizada pelo MST.
 

Luciana veio do campo para a cidade e sabe o valor que a terra tem. “Em belo horizonte há muitos quadrados e poucas pessoas têm a chance de pensar fora deles!”, afirma. A costureira, que diz que costura sonhos e não somente panos, enxerga o MST como um movimento que luta pelo direito de construir o mundo. “Vivemos em um mundo que não construímos, que constroem para nós e eles têm construído a morte, quando na verdade precisamos construir a vida”, declara.
 

E seguimos: eu para a escrita, Elizabeth e Sanuza para mais trocas com o público, e a família de Luciana com mudas de menta, hibisco e a peteca de Enzo. Essa é a beleza da união entre campo e da cidade, entre saber de experiência e saber técnico. Este festival é ação cultural e produto cultural. É impossível só um dedo de prosa. É preciso mais dedos, mãos, braços, homens e mulheres para seguirmos em luta conjunta. Já podemos sentir, agora, que alimentar é ato político.

  

Editado por Geanini Hackbardt