Dividir o trabalho e formar as crianças: a ciranda no FAMA

A organização coletiva da ciranda mostra um avanço tanto no tema da divisão sexual do trabalho quanto no tema da educação.

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Por Maria Júlia Monteiro
Do FAMA

 

O cuidado com as crianças sempre foi um desafio para aqueles e aquelas que participam da política. É preciso ir para a reunião. A criança pode participar? Se não, quem fica com a criança?

Historicamente, esse foi um papel reservado para as mulheres, mas os movimentos têm avançado na direção da socialização do trabalho de cuidado, para além da educação das crianças, também nos espaços políticos. É por isso que, no FAMA, a ciranda é tida como um dos espaços mais importantes do evento. Organizado por diversos dos movimentos participantes, o espaço tem como objetivo cuidar das crianças e também contribuir para sua formação.

Para Isabel Coelho, do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) de Brasília e uma das coordenadoras da ciranda, o espaço é importante para que as mulheres possam se inserir nos debates e espaços de tomada de decisão dos movimentos. “Por conta da sociedade machista, em que as mulheres são mais responsáveis pela criação dos filhos, elas eram impedidas de participar das reuniões. É uma demanda delas participar da luta e, por isso, surge a necessidade de organizar a ciranda”.

A participação equitativa de homens e mulheres na ciranda também é uma preocupação dos movimentos que coordenam o espaço. Para Diego Ortiz, do Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB) e também coordenador da ciranda, a intenção é romper com a ideia de que só mulheres têm que cuidar das crianças: “Nossa ciranda tem um grande contingente de educadores homens. A ideia aqui é socializar o cuidado, tornar o cuidado uma tarefa dos movimentos, e não das mães”.

Formando as próximas gerações de militantes

A ciranda é, também, um espaço de direito das crianças. É um lugar para o cuidado, para a brincadeira, e para a discussão de temas importantes para o movimento. De acordo com Isabel, a ciranda tem o papel de formar a consciência das crianças, e cita um exemplo do próprio MST: “é uma vida diferente, uma vida de luta, debaixo da lona, em marcha, na manifestação. A criança não está alheia a esse processo, então é importante que a gente converse, fale de forma lúdica, para as crianças entenderem o processo que estamos vivendo. As crianças precisam participar como sujeitas da história geral e da história do seu movimento, também porque são elas que continuarão a luta”.

Para Diego, as crianças são também sujeitas na construção dos espaços, e devem se inserir nas discussões do FAMA, fazendo suas reivindicações e expressando o que entendem pelo tema da água. “Desde o primeiro dia, elas falam sobre a importância da água, e até da contradição de ela ser tratada como mercadoria, quando na verdade é um direito”.

Com a privatização da água e sua transformação em mercadoria, as populações mais vulneráveis são as mais atingidas e, entre elas, as crianças. “Por isso é importante trazer o debate e dar visibilidade às crianças como sujeitos do processo de reivindicação da água”, finalizou Diego.

 

 

*Editado por Júlia Garcia na Página do FAMA