Mobilização e ações de solidariedade marcam a Jornada de Lutas no Paraná
Da Página do MST*
Cerca de 700 trabalhadores e trabalhadoras Sem Terra do Paraná estiveram em Curitiba durante quatro dias de mobilizações, entre 7 e 10 de abril. As ações integraram a Jornada Nacional de Lutas pela liberdade do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, em defesa da aposentadoria pública digna e por reforma agrária.
Roberto Baggio, da direção nacional do MST, faz um balanço positivo da intensa agenda em Curitiba. “Não temos dúvida de que essa foi uma das jornadas de maior qualidade política que o nosso movimento esteve envolvido nos últimos anos. Foi uma grande programação de lutas, de formação e de solidariedade, que lapidou e preparou militantes para as tarefas desse novo ciclo que se abre”.
Ao longo do dia 7, marco de um ano da prisão injusta do ex-presidente Lula, o MST se somou às 10 mil pessoas que se mobilizaram nas proximidades da Superintendência da Polícia Federal, no bairro Santa Cândida, onde Lula está preso. Nos dias seguintes, a programação mesclou negociações com o Governo do Estado e o Incra, ações de solidariedade e atividades formativas. Além das pautas principais da Jornada, as ações buscaram fortalecer a construção do Congresso do Povo e dos Comitês Lula Livre em todo o estado.
Geni Teixeira de Souza está entre as agricultoras que doou parte da sua produção às comunidades de Curitiba. Ela é moradora do assentamento Valmir Motta, em Cascavel, e faz parte da direção do MST na região. “A gente reuniu alimentos para quem veio da jornada de lutas poder se alimentar aqui, mas também para prestar a solidariedade com os urbanos que precisam”, explicou.
“Isso é muito gratificante para nós. Eu mesma fico imaginando que tem coisa que não preciso mais comprar, que eu produzo. Olho para mesa da gente e vejo que ali tem as mãos de quem trabalha. Lá no assentamento um produz uma coisa, outro produz outra. Então a gente troca e se alimenta do que as outras famílias também produzem”, contou a Sem Terra, que integra também a Cooperativa de Produção e Comercialização da Reforma Agrária e Agricultura Familiar (COPCRAF).
Um dos mutirões de doação ocorreu em quatro ocupações do bairro Cidade Industrial de Curitiba (CIC) – Tiradentes, Nova Primavera, 29 de Março e Dona Cida -, que receberam uma tonelada de alimentos, vindos de diversas comunidades do MST, incluindo a produção orgânica das famílias ligadas à Cooperativa Terra Viva e pelo assentamento Contestado, da Lapa.
A outra ação de solidariedade aconteceu no Centro Educacional Infantil (CEI) Maria Cazetta, localizado no bairro de Uberaba, com a doação de 300 litros de iogurte e 100 peças de queijos vindos da Cooperativa da Reforma Agrária Campo Vivo de Arapongas-PR. Os Sem Terra também fizeram um mutirão para a revitalização do espaço.
Cerca de 60 militantes do MST também doaram sangue no Hospital Santa Casa e no Centro de Hematologia e Hemoterapia do Paraná (Hemepar), ambos na capital paranaense.
Entre as atividades formativas aconteceu um encontro com análise de conjuntura realizada pelo João Pedro Stedile, da direção nacional do MST, a Conferência “Para onde vamos? Desafios da Democracia hoje”, realizada no Teatro da Reitoria da UFPR, e uma Plenária Estadual de organização dos comitês Lula Livre em todo o Paraná.
O encerramento da Jornada foi marcado por um ato em memória ao companheiro Antônio Tavares Pereira, assassinado há 19 anos. A ação foi realizada às margens da BR 277, em Campo Largo (PR), onde ocorreu o crime. No local está erguido um monumento arquitetado por Oscar Niemeyer, em homenagem ao agricultor e a todas as vítimas do latifúndio.
Negociação com Incra e governo estadual
A garantia de educação no campo para crianças acampadas e assentadas esteve no centro da pauta da reunião entre educadores e educadoras das escolas de áreas da Reforma Agrária, além dos representantes das comunidades onde estão essas escolas, integrantes do Setor de Educação do MST-PR e representantes da Secretaria Estadual da Educação (SEED), no dia 8.
Participaram da negociação o superintendente da pasta, Raph Gomes Alves, integrantes da equipe e a chefe do departamento de diversidade e direitos humanos da Secretaria, Angela Mercer de Mello, e integrante da equipe do Instituto Paranaense de Desenvolvimento Educacional (Fundepar).
“Foram estabelecidas algumas prioridades para esse primeiro momento na dimensão da formação de educadores e no projeto político-pedagógico das escolas do campo. Para efetivação dessas prioridades foi constituído um cronograma de trabalho com reuniões com diferentes departamentos da SEED que envolvem as demandas”, relatou Valter de Jesus Leite, integrante da direção estadual do MST pelo Setor de Educação.
A pauta para a educação na reforma agrária traz como demanda a manutenção das escolas itinerantes dos acampamentos, melhorias nas escolas de assentamentos, ampliação e consolidação de políticas para a Educação de Jovens e Adultos (EJA) nas comunidades e a promoção de políticas para o acesso à educação infantil.
Para reivindicar o desenvolvimento integral dos assentamentos e acampamentos do estado, cerca de 100 militantes do MST se reuniram com o secretário estadual de desenvolvimento urbano, João Carlos Ortega, no dia 9 de abril. O secretário se comprometeu em avançar na criação de um grupo de trabalho, com a finalidade de construir um plano de desenvolvimento para as áreas.
“Mais do que terra para conseguir plantar, precisamos de um lugar para criar nossos filhos, com acesso à cultura, ao lazer e com desenvolvimento integral e pleno das comunidades rurais”, disse durante a reunião a militante Ceres Hadich, da direção nacional do MST e assentada no Norte do Paraná.
A reunião de negociação com o Instituto Nacional de Colonização da Reforma Agrária (Incra) ocorreu no dia 8, com as demandas de aproximadamente 80 acampamentos e 320 assentamentos estado. Estiveram presentes representantes do Incra, da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) e da Superintendência de Diálogo e Interação Social do Governo do Estado.
O sentimento das famílias é de indignação pela atual situação de paralisação da reforma agrária. Elas relataram ameaças de despejo sofridas em acampamentos do estado, como lembra Ceres. “Reconhecemos que o Incra vive um cenário de sucateamento no âmbito federal, mas isso não impede que haja uma postura ética por parte da equipe do Instituto em prol da reforma agrária e contra a violência no campo”.
Atualmente são mais de 10 mil famílias acampadas que produzem alimentos e têm seus filhos frequentando escolas nas comunidades. Alguns desses acampamentos já existem há 30 anos e ainda esperam o Incra viabilizar a criação de assentamentos.
*Matéria produzida a partir dos conteúdos produzidos por Fernanda de Almeida, Jaine Amorin, Juliana Barbosa, Julyara Costa, Kelen Alves e Ednubia Ghisi
**Editado por Wesley Lima