“O amor é lindo demais para ser odiado”

Jovem integrante do Coletivo LGBT Sem Terra no Rio Grande do Sul fala sobre a luta em busca de respeito e liberdade
Priscila (3ª da direita para a esquerda na foto) ajuda a coordenar o Coletivo LGBT Sem Terra do RS. Foto - divulgação..jpg
Priscila (3ª da direita para a esquerda na foto) ajuda a coordenar o Coletivo LGBT Sem Terra do RS. Foto: Divulgação

Por Catiana de Medeiros
Da Página do MST

Desde criança, Priscila Lazzaretti Piccolotto aprendeu que o amor, o respeito e o cuidado ao próximo são atitudes que transformam vidas. Filha de assentados da Reforma Agrária, a gaúcha nascida em São Jerônimo, na região Carbonífera, conta que nunca lhe faltaram incentivos para passar adiante esse espírito humano e solidário. “Eu sonhava em crescer e poder ajudar as pessoas. Ainda pequena não sabia como fazer isso direito, hoje estou na busca de formação”, acrescenta.
 

Aos 24 anos de idade, Priscila mora com a sua mãe, Fátima, o pai, Augustinho, e uma das irmãs, a Sabrina. A família vive no Assentamento 30 de Maio, criado em 1990 em Charqueadas, a menos de 12 quilômetros da terra natal de Priscila. 
 

No assentamento foi fundada a Cooperativa de Produção Agropecuária dos Assentados de Charqueadas (Copac), onde 22 famílias lidam com leite, hortaliças e arroz orgânicos. Além do autossustento, essa produção abastece escolas e o Mercado Copac, lugar em que Priscila trabalha, na região central do município. No assentamento também tem padaria para consumo interno e uma agroindústria de embutidos.
 

A jovem lembra que começou a ajudar nas tarefas da horta e do leite aos 12 anos e que, apesar de ter tido contato com o trabalho desde muito cedo, sua infância no assentamento foi boa e tranquila. “Lugar de brincar, correr e ser feliz sempre teve por aqui”, argumentou. 
 

Depois de contribuir em vários setores da Copac, ela passou a colaborar na administração do mercado. “Ajudei em todas as áreas, pois sempre tivemos a oportunidade de atuar em qualquer parte da cooperativa. Escolhi o mercado por estar envolvida com pessoas diariamente, e por querer aprender um pouco de cada área”, comenta.

 

Priscila explica que o principal desafio é fazer com que a sociedade as enxerguem as LGBTs como sujeitos. Foto - divulgação.jpg
Priscila explica que o principal desafio é
fazer com que a sociedade as enxerguem as
LGBTs como sujeitos. Foto: Divulgação

Priscila relata que até chegar à universidade, sempre estudou em escolas públicas e que, graças à organização coletiva dos trabalhadores, hoje está no 4º semestre do curso de Serviço Social do Centro Universitário Leonardo da Vinci (UNIASSELVI) – polo de Charqueadas. Os aprendizados da faculdade, o contato diário com o público e os valores que aprendeu a cultivar desde criança no assentamento a fazem acreditar que é possível construir um novo mundo, menos desigual e mais solidário, com respeito às escolhas e às diferenças de cada indivíduo.

É por isso que Priscila concilia a sua rotina com a militância na construção do Coletivo LGBT Sem Terra do Rio Grande do Sul. Como bissexual, ela compõe a coordenação do grupo e ajuda a pautar a diversidade sexual nas instâncias do Movimento. “Estou na busca, junto a outras LGBTs, de consolidar esse coletivo, pois precisamos nos organizar e buscar espaço, respeito e voz”, salienta.
 

Priscila explica que o principal desafio é fazer com que a sociedade as enxerguem como sujeitos. A auto-organização, segundo ela, é de extrema importância nesse processo, principalmente neste momento histórico do país, em que aumentaram os ataques machistas, misóginos e homofóbicos incentivados por Bolsonaro. 
 

Ser LGBT na sociedade em que vivemos é muito difícil. Mas vejo o Movimento Sem Terra como um lar, onde posso ser eu e consigo me fortalecer. Sinto que nós, LGBTs Sem Terra, temos um papel ainda maior na busca da liberdade, pois também precisamos lutar pela Reforma Agrária, cuidar da natureza, que é vida, por voz e pelas mulheres do campo e da cidade”, destaca.

Nestes anos todos, se somou aos sonhos de Priscila o direito das LGBT&”39;s terem a liberdade de amarem e serem amadas, de poderem demonstrar isso ao mundo sem serem vítimas de ódio, discriminação e preconceito. 

“Sonho em poder ser eu mesma, sem medo de sair de mão dada na rua com minha namorada, de ser julgada por não estar nos padrões da família tradicional brasileira. Sonho com um mundo mais justo e uma sociedade mais humana. Vejo o mundo com tantos problemas, com muitos ganhando pouco e poucos ganhando muito, e pessoas matando outras por elas amarem, simplesmente amarem. O amor é lindo demais para ser odiado”, finaliza.
 

* Editado por Fernanda Alcântara