No Equador, milhares saem às ruas contra a política neoliberal do Governo

Pacote de presidente Lenin Moreno desencadeou greves e manifestações por todo o país

 

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 Decreto Executivo 888 determina um toque de recolher em zonas ao redor de prédio governamentais. Foto: Reuters

Por Janelson Ferreira
Da Página do MST

 

Nos últimos dias, as ruas de várias cidades do Equador foram tomadas por uma onda de protestos contra as medidas econômicas adotadas pelo presidente do país, Lenin Moreno. O ponto central destas medidas está ligado ao fim dos subsídios ao combustível que, com a mudança, já registraram alta de 123%. Ao todo, estão registrados mais de 200 pontos de mobilizações em 20 províncias. 

Em resposta, o governante declarou estado de exceção por 60 dias em todo o país. Extraoficialmente já há 5 pessoas mortes , com uma confirmada, a do manifestante Raul Chilpe, em Azuay, uma província ao sul do país. As aulas seguem suspensas em todo país.

Os subsídios para combustível são uma política que existe há 45 anos no Equador e serve como uma forma de compensar a dificuldade do país em produzir petróleo. Até o dia 2 de outubro, o galão de gasolina custava 1,85 dólares no país, preço mais baixo que o valor internacional, justamente porque o Estado assumia um subsídio de 0,37 dólares por galão.

Com os combustíveis duplicando de preço, como um efeito cascata, diversos outros itens essenciais para a população, como alimentos e transporte, também serão afetados. Para Bibiana Rojas, da Equipe de Comunicação da Via Campesina Internacional, as mobilizações não têm a ver somente com o governo de Moreno ou as próximas eleições, mas sim, a um projeto neoliberal em nível mundial promulgado pelo Fundo Monetário Internacional. “É clara uma aliança entre Moreno, as elites econômicas que buscam se beneficiarem com estas medidas e os meios de comunicação”, afirma Rojas. 

 

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Na última semana, Moreno declarou estado
de exceção por 60 dias em todo o país.
Foto: Reuters

Para a comunicadora popular, este também é um momento de esperança, pois diversos setores populares conseguiram se unificar para lutar contra estas medidas neoliberais. “Este paquetazo tem causado protestos que colocam juntos estudantes, professores, operários, setores campesinos e indígenas”, destaca.

Popularmente chamadas de “paquetazo”, a nova política econômica que Moreno tenta implementar são frutos de um acordo com o FMI, firmado em fevereiro, e faz com que o país sul-americano retome uma perspectiva neoliberal, com submissão não só ao FMI, mas também ao Banco Mundial e os Estados Unidos. 

O Decreto Executivo 883, que entrou em vigor na última quinta-feira (3), prevê, além do fim do subsídio aos combustíveis, a redução de 30 para 15 dias no período de férias para funcionários públicos e a entrega mensal do valor referente a um dia de trabalho.

As medidas foram enviadas para a Assembleia Nacional para sua aprovação urgente. Em declaração, a congressista Gabriela Rivadeneira, do partido Alianza País, afirmou que as medidas são antipopulares. “Moreno estende tapete vermelho para a especulação e para a alta indiscriminada de preços”, ressalta. Além destas medidas, estão previstas outras reformas econômicas, tributárias e trabalhistas. 

Para Marina Santos, da direção nacional do MST, esta série de medidas não é um fato que ocorre de modo isolado no Equador. “É possível verificar uma guinada à direita no governo de vários países da América Latina e estas medidas não estão isoladas no Equador, mas estão sendo aplicadas a todos estes países latino-americanos”, destaca Santos. No entanto, para a dirigente, esta política acaba provocando enorme resistência por parte da classe trabalhadora. “Todo este processo de resistência não tem a ver só com o Equador, mas fortalece a nossa política, a nossa resistência, o nosso projeto de sociedade enquanto classe trabalhadora da América Latina”, finaliza.

O presidente do país, em coletiva de imprensa na última sexta-feira (4), afirmou que todos sabiam perfeitamente que medidas duras iriam ocorrer, mas que o país teria que aceitar. “O que não se pode permitir é que se crie um caos no país, isto não vai ocorrer”, afirmou o presidente equatoriano. “Com os delinquentes, com os desonestos, com os que roubaram o erário [tesouro] nacional, que roubaram do povo seus recursos, com estes não vamos dialogar. A medida está firme, não vou mudar de opinião, iremos dialogar para encontrar paliativos”, ressaltou. 

Diversas organizações sociais, sindicatos e o movimentos indígenas mantém, desde a semana passada, uma greve em todo país sem prazo para terminar. O objetivo é fazer com que Lenin Moreno desista das medidas. A Confederação de Nacionalidades Indígenas do Equador – CONAIE – declarou estado de exceção em seus territórios e iniciou uma marcha em direção a capital, Quito, para se somarem às diversas mobilizações que outros setores populares realizarão. Mais de 20 mil indígenas estão previstos chegarem na cidade para cobrar o recuo do governo.
 

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Diante do crescimento das mobilizações,
a violência policial se intensificou
consideravelmente. Foto: Reuters

De acordo com Bibiana Rojas, esta é uma marcha cidadã, que está provocando uma unidade que tinha dificuldade de se realizar. “Estão ocorrendo assembleias e discussões nos bairros, nas famílias, nos núcleos menores, há uma luta de todo povo equatoriano”, destaca.

Jaime Vargas, presidente da Confederação de Nacionalidades Indígenas do Equador, afirmou que todos os diálogos com o governo estão suspensos até que a marcha chegue à capital. “Não estamos para negociar pelas costas do povo. O povo se levantou e isso é o que vamos respeitar”, aponta o presidente da CONAIE. 

Na noite da última segunda-feira (7), Moreno anunciou a mudança da sede do governo da capital para Guayaquil, segunda maior cidade daquele país. No mesmo anúncio, o presidente equatoriano disse que as manifestações têm intenções políticas e buscam desestabilizar o governo e romper com a ordem democrática. 

Repressão policial cresce no país

Diante do crescimento das mobilizações, a violência policial se intensificou consideravelmente: espalham-se em todo país relatos de violência policial, e já se tem notícia de diversos casos de violação de Direitos Humanos. Com o estado de exceção decretado por Lenin Moreno, militares estão invadindo casas de forma arbitrária, revistando crianças e praticando torturas. Nos territórios também são empregados grandes quantidades de militares e polícias. 

Na tarde desta terça-feira (8), Lenin Moreno publicou o Decreto Executivo 888, que determina um toque de recolher em zonas ao redor de prédio governamentais em todo país.
O porta-voz do Secretário Geral da Organização das Nações Unidas (ONU), Stéphane Dujarric, reafirmou nesta segunda-feira a defesa das manifestações e destacou que as forças policias devem respeitar o direito dos cidadãos de se manifestarem de forma pacífica. Em declaração, o governo equatoriano afirmou que aceitar a mediação da ONU para pôr fim à greve nacional. 

Marina Santos destaca o papel das organizações populares diante da situação no Equador. “Os desafios que temos, enquanto organizações da América Latina, junto com Equador, é denunciar este processo de repressão e romper o bloqueio midiático, para que o conjunto da sociedade tome consciência”. E conclui: “Resistir no Equador também é resistir na América Latina, se o Equador logra êxito neste processo, impulsiona toda a luta na América Latina”.

*Editado por Fernanda Alcântara