Observatório de Direitos Humanos e Covid-19: via para superação da crise

Debate online marcou início do trabalho de espaço gerido por grupos de organizações de atuação nos direitos humanos
Observatório irá monitorar, formular e sistematizar informações sobre a garantia ou violação de direitos humanos durante o enfrentamento à crise. Foto: Alex Pazuello/Semcom

Por Comunicação Observatório
Da Terra de Direitos

A garantia e defesa dos direitos humanos diante da emergência de saúde pública que se estabeleceu no Brasil e no mundo com a Covid-19 foi tema de um debate online, que reuniu diferentes organizações sociais e movimentos populares, nesta terça-feira (28). A atividade marcou o lançamento do “Observatório de Direitos Humanos – Crise e Covid-19”, iniciativa que reúne um conjunto amplo de organizações que atuam em diversas pautas dos direitos humanos e que juntas irão monitorar, formular e sistematizar informações sobre a garantia ou violação de direitos humanos durante o enfrentamento à crise.

Guacira de Oliveira, representante do Centro Feminista de Estudos e Assessoria (Cfemea), iniciou o debate ressaltando a importância da existência de múltiplas vozes, olhares e acúmulos de entidades que integram o Observatório, destacando que os esforços da sociedade civil são centrais e indispensáveis para combater as desigualdades econômicas, políticas e sociais, sobretudo na perspectiva de gênero e raça, que assolam uma parcela grande da sociedade. “Esse contexto de pandemia e calamidade tem servido de escusa para eliminar direitos. Essa plataforma lançada hoje tem a ver com a certeza de que não há outra forma de sair dessa crise sem ser pelos Direitos Humanos”, afirmou.  

Ao se pronunciar sobre os desafios para a implementação dos direitos humanos, Darci Frigo, representante da Terra de Direitos, apontou que o Observatório amplificará narrativas de resistência ao autoritarismo e à violência de Estado, contribuindo com a produção de informações de modo autônomo e cobrando de representantes públicos o direito à informação e transparência.

“O Observatório vem justamente para disputar uma narrativa de não violação de direitos, para produzir dados e ampliar o conhecimento sobre essa realidade de crise, de negação e não implementação dos direitos humanos. Essa já é uma tarefa que a sociedade civil desempenha no dia a dia através das sua organizações singulares, mas é agora que esse trabalho precisa ser intensificado”, revelou, destacando a importância da ação conjunta neste contexto de crise epidemiológica.  

A intensa subnotificação de casos de coronavírus registrados no país e o descompasso entre os governos locais e federal, nesse momento em que diversos levantamentos já demonstram que a letalidade do vírus é ainda mais intensa em populações negras, periféricas e desassistidas pelo Estado, foi uma das questões destacadas no debate.

Para Lúcia Xavier, representante da ONG Criola, a crise chama a atenção por revelar uma profunda desigualdade no acesso à saúde pública e o desenvolvimento de um projeto necropolítico que torna o paradigma dos direitos humanos ainda mais fundamental. “Sem os direitos humanos nenhuma atitude ou ação poderá ser vitoriosa. O governo não pode decidir pelas nossas mortes ou pelas nossas vidas”, complementou. 

Garantir direitos em diferentes realidades

O debate de lançamento contou ainda com a participação da integrante do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra, Ayala Ferreira, do integrante da Articulação dos Povos Indígenas (Apib), Dnamam Tuxá (APIB) e da integrante da Coordenação Nacional de Articulação das Comunidades Negras Rurais Quilombolas (Conaq), Givânia Silva.

Eles ressaltaram a importância de considerar as realidades específicas dos trabalhadores rurais e povos e comunidades tradicionais, monitorar e incidir para que as  violações que atingem as populações indígenas, quilombolas, mulheres e movimentos sociais  – intensificadas neste período – sejam combatidas. “O sistema de saúde está omitindo o quesito raça/cor das estatísticas, o que invisibiliza o impacto da pandemia para indígenas e quilombolas”, destacou Givânia. 

No debate, os participantes destacaram que o coronavírus, nesse sentido, impacta e intensifica discriminações e ausências estruturais que não começam, nem terminam com a emergência de saúde.”O mundo clama para que as pessoas fiquem em casa, mas o Governo brasileiro quer despejar cerca de 800 famílias – neste momento – das comunidades de Alcântara, no Maranhão”, denunciou a representante da Conaq. 

Para Tuxá, é grande a preocupação com a exploração de territórios indígenas neste cenário de crise no qual a fiscalização é fragilizada, assim como a proteção de comunidades tradicionais. “Garimpeiros e madeireiros não estão fazendo home office”, disse. 

A representante do MST, Ayala Ferreira, destacou a importância de reverter as medidas neoliberais que foram adotadas, como os cortes nos investimentos em saúde e pesquisa. “Há um mundo a ser reerguido e há um mundo a ser construído, pautado na vida, nosso bem maior”, frisou ela. 

“Não vamos admitir que o estado brasileiro lance mão da violência para dizer que está garantindo a ordem. Direitos sexuais e direitos reprodutivos também tem sido violados em nome de uma proteção à pandemia”, reforçou Lúcia Xavier em relação a intensificação de violações no debate.  

O debate online de lançamento contou com a participação e interação de aproximadamente 300 pessoas e diversas organizações e pode ser assistido na íntegra.

Sobre o Observatório

Em atenção às ameaças aos direitos humanos, como a entrada em vigor de legislações punitivistas, como a apropriação de dados pessoais de forma abusiva e a fragilização trabalhista e de políticas sociais, por exemplo, o Observatório se propõe a produzir e sistematizar informações referentes aos direitos humanos no Brasil em diferentes campos.

O monitoramento e sistematização de informações embasará ações de denúncia e a incidência do Observatório e do conjunto de organizações que se somam nessa iniciativa. A ideia é não permitir a redução da participação social, quando justamente é mais necessário somar esforços e experiências diante da crise política, econômica, social e de saúde pública. 

Até o momento, o Observatório é integrado pelas organizações Associação Brasileira de Gays, Lésbicas, Bissexuais, Travestis, Transexuais e Intersexos (ABGLT), Associação Juízes para a Democracia (AJD), Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (APIB), Anistia Internacional, ARTIGO 19, Centro Feminista de Estudos e Assessoria (Cfemea), Coalizão Negra por Direitos, Coordenação Nacional de Articulação das Comunidades Negras Rurais Quilombolas (Conaq), Criola, Geledés Instituto da Mulher Negra, Instituto de Estudos Socioeconômicos (Inesc), Justiça Global, Movimento de Mulheres Camponesas (MMC), Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), Plataforma DHESCA e Terra de Direitos.

Outras organizações podem se somar à iniciativa. Para saber mais, acompanhe as páginas do facebook, twitter e youtube do Observatório ou procure as organizações participantes.

*Editado por Luciana Console