Nota sobre a libertação dos acusados da chacina do Guamá
Da Página do MST
A Sociedade Paraense de Defesa dos Direitos Humanos, MST e demais movimentos e instituições da sociedade civil vêm se manifestar publicamente sobre a decisão proferida em 01 de junho de 2010, pelo juiz da 1ª Vara do tribunal do Júri de Belém, Sr. EDMAR SILVA PEREIRA, que colocou em liberdade os acusados da chacina do Guamá.
Ano passado, em pleno domingo do dia 19 de maio, onze (11) pessoas foram executadas de forma covarde no bairro do Guamá. As investigações indicaram os responsáveis pela matança. O Ministério Público denunciou os acusados. Uma ação miliciana e gerou enorme comoção social e teve repercussão internacional confira a nota:
NOTA SOBRE A LIBERTAÇÃO DOS ACUSADOS DA CHACINA DO GUAMÁ
As cidadãs e cidadãos, entidades e movimentos sociais e de demais instituições da sociedade civil vêm se manifestar publicamente sobre a decisão proferida em 01 de junho de 2020, pelo juiz da 1ª Vara do tribunal do Júri de Belém, Sr. EDMAR SILVA PEREIRA, que colocou em liberdade os acusados da chacina do Guamá.
Ano passado, em pleno domingo do dia 19 de maio, onze (11) pessoas foram executadas de forma covarde no Bairro do Guamá. As investigações indicaram os responsáveis pela matança. O Ministério Público denunciou os acusados. A materialidade do Crime e os indícios de autoria estão documentados no processo nº 0011423-87.2019.8.14.0401. Não se trata, portanto, de um crime onde se desconhece a autoria das mortes. Cumpre ressaltar que a chacina ocorrida, foi caracterizada como uma ação miliciana e gerou enorme comoção social.
Agora, a 1ª Vara do Tribunal do Júri analisou o pedido de dois PMs presos, e entendeu que os elementos ensejadores da prisão preventiva não mais subsistem, estendendo a decisão aos outros acusados, libertando a todos. Ou seja, alguma coisa, na realidade ou no processo, extinguiu os motivos da prisão dos acusados daquele ato genocida. O Juíz indica também no seu despacho de revogação das prisões a situação da contaminação pelo COVID-19, o fato de dois acusados estarem doentes, e a preocupação com a realidade nas cadeias e penitenciárias onde os acusados estão. Mas esta questão de saúde pública não foi a razão para a libertação dos denunciados.
Sobre a questão da pandemia, várias entidades e o próprio CNJ tem defendido o relaxamento de medidas segregadoras para garantir o direito à vida e à saúde. Contudo, o poder Judiciário no estado do Pará, tem sido praticamente indiferente a estes apelos. Pelo contrário, temos visto uma tendência perigosa que coloca em risco o estado democrático de direito, em que preceitos constitucionais não estão sendo devidamente observados, como é o caso da presunção de inocência, e mesmo à uma crise de proporções de pandemia, existem decisões que negam a liberdade de presos, que não tiveram direito nem à audiência de Custódia. Ou seja, a negação de vários direitos de presos e presas em nosso Estado que já possui mais de 20.000 pessoas encarceradas.
São inúmeras as tentativas de libertação de presos e presas envolvidos em crimes não violentos, que tem sido negadas pelo judiciário. É como se a pandemia não existisse, muito embora os prazos de funcionamento das varas tenham sido suspensos para evitar a infecção dos juízes e funcionários do judiciário, advogados, defensorias e MP. Concordamos com isso. Está correto do ponto de vista de garantir o isolamento social e com isso a evitar a propagação do vírus.
A pergunta que se faz é: Por quê a preocupação e a posição manifestada neste caso não é aplicada em milhares de outros processos? A primeira vista a decisão passa a falsa impressão de que a pandemia teria sido o motivo da libertação aqui analisada, mas não é essa realidade.
Não foi o direito à saúde o motivo determinante para as revogações. Da leitura atenta do despacho percebe-se que mesmo que não existisse a pandemia, pelos argumentos usados, os acusados seriam soltos como de fato o foram. Admitimos que o direito à saúde e à vida possam e devam ser invocadas, mas repita-se não foi esse o caso da decisão.
Esta decisão muito nos preocupa, porque a mensagem passada para a sociedade é que integrantes de grupos de extermínio, que executaram 11 pessoas há um ano no bairro do Guamá, não representam uma ameaça à ordem pública ou mesmo um risco a testemunhas que terão que ainda testemunhar em um júri. A preservação da vida e da integridade destas pessoas é algo importante à conclusão do processo.
Então devemos nos perguntar: A ação destes grupos de extermínio nas periferias de Belém deixaram de existir? NÃO. As testemunhas que depuseram nesse processo estão em segurança? NÃO. O estado adotou medidas para coibir a violência contra as populações nas periferias como é o caso do Guamá? NÃO. Existe alguma medida concreta e efetiva para evitar que estes policiais e milicianos atentem contra familiares de vítimas que buscam por justiça no processo? NÃO. Existe determinação judicial para o afastamento destes policiais da PM? NÃO. Então não podemos concordar com tal decisão.
De fato, são crimes repetitivos que tiram vidas de pessoas pobres, jovens negras e periféricas. Crimes que aterrorizam e que verdadeiramente trazem insegurança pública aos bairros pobres sempre afetados por tais milícias civis ou militares. Mesmo policiais civis e militares estão sujeitos à violência destes grupos.
Duvidamos que, se essa chacina tivesse ocorrido no Bairro de Nazaré, centro de Belém, e tivesse como vítimas jovens brancos e ricos, esta decisão teria sido dada pelos motivos que foram alegados. Não tem sido outra a história da violência em nosso estado infelizmente.
Sequer uma decisão determinando o afastamento da corporação dos PMs envolvidos, de eventual prisão domiciliar, de proibição de porte de armas, de comunicação entre os presos ou com outros possíveis criminosos foram invocadas pela justiça nesse caso. A chacina no bairro do Guamá foi mais um episódio de violência que teve repercussão internacional.
Fica aqui nossa solidariedade às famílias das vítimas que devem ser protegidas pelo estado e não jogadas ao desamparo como é o caso das famílias das vítimas neste processo. Apelamos de forma pública para que este e outros processos envolvendo as chacinas sejam solucionadas e julgadas na forma da lei, com a celeridade e direitos que todos acusados tem como a ampla defesa e o contraditório.
Que o estado e aparato de segurança pública seja direcionado para respeitar o direito de toda a população e não apenas de bairros abastados. Que cesse a violência contra a mulher e o extermínio da juventude negra nas periferias.
Não perderemos a esperança na justiça e suas instituições. Sempre as buscaremos, as pressionaremos e as apoiaremos quando necessário. O fim da violência e o direito à segurança de todo o povo é tarefa e exigência coletiva. Sempre.
Belém-Pará-Brasil, 2 de junho de 2020.
MOVIMENTO NACIONAL DE DIREITOS HUMANOS
SOCIEDADE PARAENSE DE DEFESA DOS DIREITOS HUMANOS – SDDH
CENTRO DE ESTUDOS E DEFESA DO NEGRO DO PARÁ – CEDENPA
MOVIMENTO DE MULHERES DO CAMPO E DA CIDADE – MMCC/PA
MOVIMENTO DE MULHERES DO TAPANÃ – MMT
MOVIMENTO AFRODESCEDENTE DO PARÁ – MOCAMBO
ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE JURISTAS PELA DEMOCRACIA- ABJD.
COLETIVO TELA FIRME
UNIPOP – INSTITUTO UNIVERSIDADE POPULAR
MOVIMENTO SEM TERRA – MST
FÓRUM DE MULHERES DA AMAZÔNIA PARAENSE- FMAP
CONSELHO REGIONAL DE PSICOLOGIA DO PARÁ E AMAPÁ – CRP10
PROJETO SAÚDE, CIDADANIA E DIREITOS HUMANOS – UFPA
PASTORAL DA JUVENTUDE – REGIONAL NORTE 2 – PARÁ E AMAPÁ
COMISSÃO PASTORAL TERRA – PA
GRUPO DE MULHERES BRASILEIRAS – GMB
FRENTE FEMINISTA PA
REDE DE COMUNICADORES POPULARES POR DIREITOS HUMANOS NO PARÁ
OUVIDORIA GERAL EXTERNA DA DEFENSORIA PÚBLICA DO ESTADO DO PARÁ
COLETIVO SAPATO PRETO – NEGRAS AMAZÔNIDAS
IRMÃS DE NOTRE DAME DE NAMUR
SINDICATO DOS SERVIDORES PÚBLICOS FEDERAIS NO ESTADO DO PARÁ – SINTSEP
MOVIMENTO REPÚBLICA DE EMAÚS
CENTRO DE DEFESA DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE – CEDECA