Histórico e ações de saúde do MST em meio a pandemia são temas de pesquisa
Por Luciana G. Console
Da Página do MST
O Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra é um movimento de luta pelo acesso à terra, na concepção da Reforma Agrária Popular. Porém, para que esta luta seja completa, é preciso também englobar o acesso aos direitos básicos e fundamentais para a população. É neste contexto que o artigo “O MST e a luta pelo direito à saúde em tempos de pandemia de Covid-19”, de autoria das pesquisadoras do Instituto de Saúde Coletiva da Universidade Federal da Bahia (ISC/UFBA), Carmen Teixeira e Larissa Barros, busca trazer uma análise sobre as atuações na saúde desenvolvidas pelo MST no período de 1980 à 2016 e sobre as medidas tomadas pelo Movimento no atual momento de pandemia da COVID-19.
Para Barros, a pesquisa demonstrou que a saúde é uma questão pautada pelo MST desde o início como Movimento, com forte defesa do acesso e fortalecimento do Sistema Único de Saúde (SUS). “A concepção de Saúde que vem sendo construída e vivenciada pelo MST se aproxima muito dos debates realizadas pelo movimento sanitário em suas origens, vinculando a Saúde às condições de vida e trabalho, partindo da crítica ao reducionismo que predomina na formação e na prática da maioria dos profissionais do setor, que entendem saúde apenas como ausência de doença e a trata com assistência individual e curativa, em clínicas, ambulatórios e hospitais”, pontua.
De acordo com a pesquisadora, diversos estudos apontam que as condições de vida das populações do campo, das águas e da floresta, tendem a ser mais precárias se comparadas com as da população urbana. São diversas limitações de acesso à serviços básicos como moradia digna, saneamento, acesso aos serviços públicos de saúde, ausência de transporte coletivo e coleta de lixo.
A situação se agrava ainda mais na atual crise sanitária brasileira por conta da pandemia da COVID-19, onde a higiene e o distanciamento social são fundamentais para a contenção do vírus. “Esse contexto impõe muitas dificuldades para essas populações cumprirem as recomendações das autoridades sanitárias: água e sabão para lavagem frequente das mãos, acesso ao álcool 70%, uso de máscaras, testagem, acesso aos serviços de saúde ambulatoriais e hospitalares em caso de infecção”, explica Larissa.
No entanto, ela ressalta as atuações que o MST e o Setor de Saúde do Movimento vêm desenvolvendo ao longo de sua existência, principalmente no atual contexto de pandemia. De acordo com o artigo, o Movimento realiza um esforço autônomo de enfrentamento do novo coronavírus, com mapeamento, monitoramento e acompanhamento dos casos de COVID-19, com a identificação de médicos e representantes do setor de saúde para atuarem nos territórios do MST e também com a produção e doação de álcool, máscaras e fitoterápicos.
Além disso, o MST também conta com canais de comunicação para transmissão de informações, além de cuidados e ações como a guarita sanitária para controle de entrada e saída das pessoas nos territórios dos assentamentos.
A pesquisadora ainda destaca este olhar para a saúde de forma mais holística e diferente da visão da civilização ocidental moderna que leva, inclusive, à exploração dos recursos naturais à depredação do meio ambiente.“O que me chamou a atenção, quando comecei a me aprofundar na análise das concepções e práticas de saúde do MST, foi perceber que o ele vem produzindo um conhecimento, um saber prático que se expressa na vinculação estreita da luta pela Saúde com a luta pela Terra”, ressalta.
Desde o início da pandemia, o Movimento também tem realizado ações de reflorestamento, como o plano nacional “Plantar Árvores, Produzir Alimentos Saudáveis”, e diversas atividades de solidariedade, com doações de alimentos oriundos da agricultura camponesa, marmitas e cestas agroecológicas nos municípios onde o Movimento atua, como forma de dar subsistência neste momento onde a renda de muitos trabalhadores está comprometida. É importante ressaltar também que a Reforma Agrária Popular, projeto de democratização da terra do MST, é pautado pela produção agroecológica e livre de agrotóxicos, ou seja, uma produção em equilíbrio com o meio ambiente e sem veneno.
Histórico do MST: material vasto
Para Barros, processar o enorme volume de informações foi um dos maiores desafios na elaboração do artigo. A pesquisa foi feita com base em análise dos documentos oficiais, como jornais, boletins, programas online e cartilhas produzidos pelo MST, entrevistas com integrantes do Setor de Saúde do Movimento e observação da participação do MST em eventos, feiras agroecológicas, cursos de formação. Ainda no contexto da pandemia da COVID-19, Larissa destaca o programa “Quarentena Sem Terra”, analisado por ela no período de 18 de março a 31 de maio de 2020.
Ela ainda compartilha que outros dois artigos estão em fase de produção. Um sobre as condições de saúde das populações vinculadas ao MST que vivem nos acampamentos e assentamentos, outro que aborda as estratégias de luta do MST em torno da questão da saúde ao longo das distintas conjunturas políticas do Brasil desde a redemocratização. Por último, a pesquisadora tem intenções de realizar um trabalho com foco no retrocesso e desmonte do SUS na era Temer e Bolsonaro.
Neste sentido, Larissa reafirma a importância da defesa do SUS pela radicalização de uma Reforma Sanitária Brasileira, com a luta por um SUS público, universal e de qualidade. “É de fundamental importância identificar os movimentos sociais que compartilham de sua proposta e da sua prática de ação transformadora, caso do MST”, conclui a pesquisadora.
*Editado por Fernanda Alcântara