Assentamento Ulisses Oliveira: luta e amor à vida
Por Maria da Glória e Lúcias Martins*
Da Página do MST
No dia 17 de abril de 2002, cumprindo a jornada de luta do Abril Vermelho na região do Vale do Rio Doce, 670 famílias ousaram quebrar mais uma cerca de um grande latifúndio no município de Frei Inocêncio. De repente, a paisagem mudou e surgiu um grande acampamento de lona preta às margens da BR 116. Ali, as famílias buscavam um mesmo objetivo: a liberdade de um povo oprimido sonhando em conquistar seu pedaço de terra.
Logo foram surgindo os primeiros fogões a lenha e já se sentia o cheiro do primeiro café que traziam sabor de esperança. Assim nascia o acampamento Padre Gino, berço de vários assentamentos na região. Já com muitas lutas, construímos espaços de formação como escolas, igrejas, hortas coletivas, campos de futebol, entre outros. As hortas e roças coletivas formavam um lindo cartão postal que encantavam os visitantes e pessoas que trafegavam pela rodovia Rio-Bahia. Onde era só pasto, agora se transformava em um grande produção de alimento livre de venenos e da exploração capitalista.
O maior acampamento da região incomodou muita gente. Sofremos vários despejos, mas a vontade de conquistar um pedaço de chão era mais forte e as famílias continuavam na luta, reocupando sempre depois de cada despejo e refazendo roças, hortas e barracos arrancados pelo trator do fazendeiro.
Entre as famílias acampadas estava o senhor chamado Ulisses Oliveira, que lutava não só por terra mas também buscava recuperar sua saúde já bastante debilitada. Este senhor já havia morado por alguns anos aqui na região, mas que há algum tempo vivia em São Paulo e estava aqui a passeio visitando a mãe. Ao tomar conhecimento do acampamento, Ulisses resolveu então não voltar mais para São Paulo e já ficou acampado.
Com a pressão das famílias que fizeram marchas, ocupação de BR e órgãos públicos, o INCRA, como forma de diminuir a tensão na região, propôs desapropriar várias fazendas. Para uma destas fazendas foram selecionadas 30 famílias e entre elas estava Ulisses. Porém, antes de ir para a terra conquistada, seu problema de coração se agravou e ele veio a falecer, sem pisar nas terras dos seus sonhos. Em memória ao companheiro, as famílias selecionadas batizaram o assentamento com o nome de Ulisses Oliveira, para que ele continuasse vivo e presente na história e nas lutas do dia a dia.
Mesmo em meio a tantas lutas, ele tinha palavras de conforto e esperança para todas as pessoas que dele se aproximava. Seu legado foi o amor a vida, o respeito às crianças, o bom humor e a alegria.
Ulisses Oliveira presente, presente, presente!!!!
* Educandas do Curso de Formação de Formadores do Vale do Rio Doce-MG, que integra o projeto de recuperação da Bacia, devastada pelo rompimento da barragem da Vale/Samarco/BHP Billiton, no Córrego do Feijão, em Mariana
** Editado por Luciana G. Console